Comunicação Social, como área que envolve cursos como Jornalismo, Publicidade e Relações Públicas, é uma área que também recebe autistas. Neste episódio, o host e jornalista Tiago Abreu recebe a jornalista e relações públicas Selma Sueli Silva, o publicitário Ricardo Oliveira e o estudante de Jornalismo Vitor Rodrigues para discutir formação, mercado e o hiperfoco do autismo na atividade profissional.
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Notícias, artigos e materiais citados e relacionados a este episódio:
- Mundo Asperger – no YouTube
- Autista Pensante – no YouTube
- Ricardo Oliveira – no Facebook
- Vitor Rodrigues – no Twitter
- Autismo – Comunicação: Desafios e Aprendizado
- Autista pode fazer Publicidade e Propaganda?
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Transcrição do episódio
Tiago: Um olá para você que escuta o podcast Introvertendo, que é o primeiro podcast do Brasil a trazer autistas na sua equipe de conteúdo. Meu nome é Tiago Abreu, sou jornalista e hoje estou com colegas de mesma área de profissão para poder falar um pouco sobre a área de comunicação.
Vítor: Olá pessoal, tudo bem? Meu nome é Vítor Rodrigues, tenho 22 anos, natural de Goiânia e atualmente estou cursando o 8º período do curso de Jornalismo na UniAlfa.
Selma: Eu sou Selma Sueli Silva, jornalista, relações públicas, tenho pós em comunicação e gestão empresarial, tô muito feliz com o convite de estar participando até porque comunicação social foi, é e sempre será a minha paixão. Então é muito gostoso estar aqui conversando sobre isso com vocês.
Ricardo: Vou me apresentar agora, o meu nome é Ricardo Oliveira, tenho 27 anos e sou de São Vicente, litoral de São Paulo. Sou formado em Publicidade e Propaganda e atualmente terminando uma especialização em Mídias e Redes Sociais. Também sou dono do canal Autista Pensante no YouTube.
Tiago: E este episódio não é para falar sobre as questões de comunicação dentro do autismo e sim sobre a área de comunicação que envolve várias profissões como jornalismo, publicidade e relações públicas. Vale lembrar que o Introvertendo é uma produção independente, formada por 8 autistas em diferentes lugares do Brasil que discutem temas relacionados ao autismo e sociedade.
Bloco geral de discussão
Tiago: Este episódio sobre comunicação é muito interessante para mim porque os três convidados que temos aqui hoje possuem uma participação assim direta ou indireta comigo em algum momento na trajetória da comunidade do autismo. A Selma tem um canal que é o Mundo Asperger, e ela e o Victor gravar uma vez um vídeo respondendo uma pergunta minha lá em 2017, um ano antes do Introvertendo surgir, sobre o fato deles terem escolhido Jornalismo. O Ricardo foi a primeira pessoa a comentar um episódio do podcast, quando a gente tava lá no início ainda e o Vitor acompanha a gente há muito tempo, então muito obrigado primeiramente a vocês aparecerem aqui no podcast. E primeiro queria perguntar então individualmente para cada um por que vocês escolheram cursar uma graduação na área da comunicação.
Vítor: Eu Escolhi especialmente o curso de Jornalismo primeiramente porque desde pequeno sempre fui estimulado a ler livros e gibis por influência da minha mãe e eu acabei tomando gosto e juntamente a isso eu decidi escolher Jornalismo muito em função de um ser uma pessoa que gosta muito de esportes, desde sempre eu gostava muito de ouvir as partidas de futebol pelo rádio.
Selma: Pois bem, Tiago, nossa você foi lá em 2017! Eu me lembro da sua pergunta e me lembro da gente respondendo sim, porque a comunicação sempre foi um encantamento na minha vida. Mas, para te ser sincera, a primeira profissão que eu pensei em ser foi psicóloga. Depois eu achava que ia ser professora, porque como eu não tive diagnóstico na infância eu observava muito as pessoas para poder entender essa relação social para me enquadrar num contexto que eu me sentia tão inadequada. A minha mãe é da área do direito, que também tem muita leitura, e ela sempre escreveu muito bem. Só que, quando chegou no ensino médio, eu fui pela minha irmã mais velha que fez Engenharia e Edificações no CEFET e me encantei porque as aulas práticas são muito gostosas. Pensa bem, eu construindo parede, fazendo piso, entrando dentro de tubulão com meu lacinho branco na cabeça para olhar tudo direitinho as medidas como o professor passava no quadro… mas quando veio o vestibular e eu li um pouco de todas as profissões, na hora me falou mais alto a questão do Jornalismo que eu sempre observava muito. Quando eu cheguei no quinto período, fui para Relações Públicas, e me formei também em Jornalismo. O pulo do gato mesmo veio quando eu percebi que a comunicação ia me ajudar a entender exatamente o que eu tinha de mais “complicado” comigo, porque eu comunicável, falava e tinha hora que parecia que as pessoas não entendiam. Eu nem imaginava essa questão de comunicação não funcional. E aí eu descobri que tudo no mundo tem que ter até já mesmo porque quando eu entrei na comunicação social você aprende as estratégias da comunicação e isso me ajudou muito na minha fragilidade de uma comunicação mais funcional.
Ricardo: A primeira vez que eu tive contato com marketing e publicidade geral, por incrível que pareça, foi por meio do canal Shoptime. Tinha muito os programas do Ciro Bottini e eu ficava assistindo o dia todo, mas o que me fez interessar mesmo pela área da comunicação mais focada na Publicidade foi a questão da internet. A internet sempre proporcionou, pelo menos de 2010 para cá, essa questão de influenciadores, youtubers, donos de blogs e sites em geral e também o surgimento do marketing digital. Então meio que aliou o que o mercado tá precisando também e a minha questão de querer trabalhar com comunicação. A comunicação é uma área muito abrangente e te faz pensar de diversas formas. Claro que na publicidade é focado mais na questão de crescimento de empresa, mas no curso de comunicação você aprende vários tópicos correlatos, como psicologia, sociologia, filosofia, então é uma área que te ensina muitas coisas, a questão da multidisciplinaridade… Eu não me arrependo. Se fosse em 2012, eu faria de novo.
Tiago: Interessante que a gente tem diferentes histórias. E, no meu caso, eu posso resumir minha escolha pela área da comunicação por duas coisas de infância. A primeira, uma paixão por escrever por texto e, a segunda, o interesse por questões multimídia. Sempre tive hiperfoco muito grande em áudio e música e também a questão do vídeo sempre me interessava. Então a área que permite aproveitar um pouco desses dois mundos era exatamente a comunicação, já que antes eu tive uma experiência ruim na área de TI. Uma coisa que eu comentei com Alice Casimiro no episódio 75 é o fato de termos ainda um estereótipo de que autista geralmente prefere as áreas de ciências exatas. E, para vocês, qual foi o principal estereótipo que vocês já ouviram sobre profissionais da comunicação e de que forma isso impactou?
Selma: Apesar destes inconvenientes que eu tive que lidar pelo caminho, eu sou hoje completamente realizada e feliz com a minha escolha e tive várias vários momentos e em que fui questionada que seria uma Joana ninguém. O pessoal achava que a comunicação não dava dinheiro e que eu era louca de fazer, mas eu continuei sempre firme nisso. Agora devo falar com vocês dos preconceitos e eu espero que as pessoas me entendam. Eu não estou generalizando, vou fazer um recorte de um contexto que eu vivi quando comecei a fazer comunicação. Eu era técnica orçamentista numa empresa de engenharia e aí nessa época a inteligência que era mais valorizada era a inteligência matemática, e o pessoal de áreas humanas seriam aquelas “donas de casa” que resolver estudar e vão fazendo alguma coisa. Até os homens que iam para essas áreas também sofriam esse preconceito. Mas eu observava sempre pessoas e pensava: “Mas que estranho, eu não quero na minha vida é trabalhar durante a semana e no fim de semana vibrar. Isso é muito pouco para mim”. Eu não entendia como é que as pessoas eram infelizes durante a semana toda e se contentavam de “ser felizes” só no sábado e o domingo, sem contar que na segunda-feira tava naquela ressaca grande. Eu comecei a achar que as pessoas estavam brincando com a questão da felicidade e paguei para ver, fui mergulhar de cabeça na área da comunicação. E por muito tempo – somos três irmãs e eu – em termos de dinheiro, eu sou a mais pobre, mas vivo com dignidade. E se tu olhar o meu início de vida lá atrás, nesse caminho eu tentei algumas vezes fazer concurso, mas a forma como o concurso é feito também não é para o meu cérebro neurodivergente. Eu parti para a assessoria de comunicação, para o rádio e aí eu descobri um mundo maravilhoso. E uma das coisas mais lindas que aconteceu na minha vida foi o seguinte: Quando eu saí do rádio em 2015, eu descobri no mesmo instante que eu tinha um público imenso que migrou comigo para as redes sociais. Então eu percebi que as redes sociais são um achado, é a coisa mais linda que tem na área de comunicação, porque muitos ouvintes hoje me acompanham no Mundo Asperger, torcem por mim e pelo meu filho. Me perguntaram, quando Meu filho Victor Mendonça foi fazer Jornalismo: “Mas sofrendo tanto do jeito que você sofre e ganhando pouco, você vai deixar o Victor fazer Jornalismo?”. Eu falei: “Sim. Mas quem te disse que eu sofro?”. Porque, em termos de dinheiro eu posso ser a mais pobre, mas eu me considero a mais feliz de todas. A descoberta da vida aos olhos da comunicação, aos olhos da riqueza do ser humano, é muito bacana. Eu tenho um filho que hoje está com 22 anos como parceiro de profissão, a gente conversa entre duas gerações. A minha geração não é a geração tecnológica, a dele já é. No entanto, ele pega uma bagagem que eu tenho de comunicação lá de trás e isso para ele é muito bacana. Nenhuma dessas gerações vai conseguir um resultado de trabalho tão maravilhoso se não for dando as mãos. Por isso que eu tô encantada de estar aqui no Introvertendo porque olha… eu tô me sentindo “A Selma” aqui, porque é muito lindo falar para todo mundo, é muito lindo falar que eu entendo o brilho do olho de vocês, que eu acredito nessas coisas que vocês acreditam, que o autismo, a comunicação e o que mais vier a gente traça e a gente vai tentar ficar confortável dentro disso e vai descobrir caminhos.
Ricardo: Sobre a questão dos estereótipos, no meu caso Publicidade e Propaganda é um pouco do que já foi falado. “Nossa, não dá dinheiro”. Depende muito do caso, normalmente não dá mesmo como alguns ramos das exatas. Mas tem um porém que acaba contrapondo, que a questão do saber . A diferença é que as humanas dá um saber muito profundo sobre a realidade das pessoas, as questões sociais, a questão de mercado, como funciona o mundo que não necessariamente uma pessoa que fez algo na área da Tecnologia da Informação, por exemplo, tem noção. O objetivo principal dela é trazer um conhecimento de acordo com o ramo que é estudado. O que você faz com o conhecimento é o que te possibilita a você a entrar num emprego remunerado. Muita gente entra com uma visão ainda distorcida do que serve a universidade. Isso acontece inclusive para a pós-graduação. As pessoas entram com o objetivo de alcançar cargos maiores dentro de suas respectivas empresas e acabam se frustrando porque às vezes isso não ocorre. Então essa é a grande discrepância entre a expectativa do aluno e o que realmente acontece dentro do mercado de trabalho.
Tiago: Essa é uma pergunta prática, mas ao mesmo tempo poética, então encarem ela como quiserem.
Ricardo: Nossa! (risos)
Tiago: Para vocês, o que é ser um profissional da comunicação?
Ricardo: Vish, quem começa? (risos)
Tiago: (risos)
Selma: Pode ir, Vítor. Vai, Vítor.
Vítor: Tudo bem, então, Selma. Eu acho ser um profissional da comunicação é você estar permanentemente inquieto, à procura de respostas que façam sentido nesta vida. Até mesmo tem uma frase dita por muitos profissionais que se a gente não questionar as coisas permanentemente no nosso dia a dia, pede um pouco esse sentido. E até muito em função da nossa característica, de sermos dentro do espectro do autismo, ter essa capacidade de observar e que faz manter essa chama como uma forma de nos reconhecermos. Somente assim é possível ter conhecimento, mais inclusão e principalmente que as pessoas tenham mais simpatia por nós.
Ricardo: Trabalhar com comunicação, além de ser um desafio constante, é algo que pelo menos te dá muito conhecimento abrangente sobre o mundo. Como eu falei inicialmente no podcast, ele te abre um leque de opções muito grande, tanto que no curso de Comunicação na Publicidade você acaba estudando um pouco sobre diferentes áreas dentro da humanidades. Creio que para quem tá entrando na comunicação e queira trabalhar com marketing digital, é um bom campo para você já começar a estudar.
Selma: A comunicação me salvou. Pela comunicação eu encontrei amparo para as minhas inquietações. E foi pela comunicação que eu descobri que as perguntas são muito mais importantes que as respostas. Foi a maneira que eu descobri de entender a riqueza e a diversidade dos ser humano, em que eu percebi, que eu me encontrei. Tudo bem ser diferente e hoje eu, como budista, vejo que a comunicação é o meio que eu tenho para ser feliz e fazer o outro feliz, e tentar construir uma realidade que eu acredito. O nosso tempo de hoje é muito carente de sonhos e de esperança. A juventude de hoje não sonha como antes, então isso é um convite maravilhoso para que a gente mude esse painel por meio da comunicação, para usar essa esperança de que a gente pode sim a cada dia construir uma sociedade mais humana e inclusiva. A comunicação é uma forma de a gente ser criativo.