Com roteiro ou sem roteiro, viajar é uma experiência desafiadora para autistas porque envolve mudança de rotinas. Com base nessa premissa, contamos um pouco das nossas histórias, incluindo as diferenças dos meios de transporte, viagem em família, sensibilidade sensorial e também um pouco acerca dos bastidores do Introvertendo em Belém.
Participam desse episódio Michael Ulian, Thaís Mösken e Tiago Abreu.
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Transcrição do episódio
Tiago: Vamos lá. Um olá para você que…
(Risos)
Thaís: Desculpa!
(Vinheta de abertura)
Tiago: Um olá pra você que escuta o podcast introvertendo, que é o primeiro podcast do Brasil sobre autismo. Feito por autistas. Meu nome é Tiago Abreu. Sou host desse podcast e hoje estou com mais dois podcasters aqui, do Introvertendo, para discutir um tema que vocês já pediram pra gente há um tempão. Mas que a gente não esqueceu e a gente vai falar aqui hoje.
Thaís: Olá pessoal, meu nome é Thaís, aqui de Florianópolis, já faz tempo que eu não gravo, mas não desisti do podcast. E hoje vai falar aí sobre algo que pode ser muito bom, muito ruim e aí às vezes as duas coisas… Não exatamente ao mesmo tempo, mas claro.
Michael: Meu nome é Michael e caso você não saiba, a ave símbolo do estado do Paraná é a Gralha Azul.
Tiago: Hoje nós vamos preparar as nossas malas, nossas mochilas e relembrar das histórias de viagem pelo Brasil e em diferentes lugares do mundo. Você vai saber um pouco sobre aquilo que dificulta, aquilo que facilita, aquilo que é legal, aquilo que é ruim. Enfim, tudo relacionado a essa prática muito comum entre todas as pessoas, que é viajar. E se você quiser ouvir o podcast enquanto faz check-in ou enquanto ouve crianças gritando ai dá rodoviária.
Bloco geral de discussão
Tiago: Falar de viagem geralmente envolve uma questão que é sempre comentada independentemente trata sobre pessoas dentro do espectro que sejam crianças, adultos ou mais velhas que é a questão da sensibilidade sensorial. Falar de viagem é envolver um monte de dificuldades relacionadas ao transtorno do espectro do autismo e aí eu queria conversar com vocês. O que que vocês mais odeiam no processo de viagem?
Thaís: Depende claro, do meio de transporte que a gente vai usar. Mas se é qualquer coisa que não seja um carro, por exemplo, qualquer coisa que você tenha que esperar, para mim a pior parte é ficar esperando ali no saguão. Seja por um ônibus, seja pelo carro de outra pessoa, alguém que vai te dar carona, ou por um avião. Qualquer um desses é uma parte que me incomoda bastante, as filas e tudo mais. Apesar de eu nunca ter surtado de verdade. Em uma fila, já caiu a minha pressão, já tive que sentar no chão, coisas do tipo. Então é a parte que eu mais detesto.
Tiago: Mas de alguma forma esse processo de espera, ele envolve quais aspectos do seu corpo, da sua sensibilidade sensorial? É uma questão de excesso? Só para as pessoas entenderem mais ou menos isso.
Thaís: Eu acho que é um pouco de cada uma dessas coisas. Tem a questão da sensibilidade sensorial, porque tem gente gritando, falando. É um caos. você olha em volta e é aquele caos muita coisa a se mexendo você não tem controle sobre o que está ali então essa falta de controle sobre o ruído, temperatura, a questão de espera. De não conseguir manter muitas vezes uma coisa no meu planejamento, então às vezes o ônibus atrasa, por exemplo. E aquilo eu tenho que levar em conta, “ah, ele pode atrasar, tudo bem”, mas eu não sei em que momento ele vai sair, eu não sei em que momento eu tenho que levantar, eu não consigo calcular tão bem tudo isso. Então é como se você tivesse que ficar atento o tempo todo, sabe? Preparado o tempo todo para o que tem que ser feito no embarque. E aí a gente chega na hora de embarcar você não tem certeza se vão te perguntar alguma coisa a mais. Se vai sair vamos dizer assim daquele do script esperado. Então são muitas coisas que envolvem essa preparação para a viagem. Que para mim são de maior impacto. Essa questão do inesperado assim de você não conseguir encaixar na sua rotina direitinho aquilo é realmente o mais difícil de encontrar um jeito de lidar.
Tiago: Sim, eu penso que quando se trata de viagem. As dificuldades enfrentadas geralmente estão naquela segunda parte da descrição que está lá no DSM, sobre autismo. Que é comportamentos repetitivos. E quando a gente fala de comportamentos repetitivos as pessoas pensam muito naquilo que elas chamam de muitas vezes estereotipias ou instintos. Mas na verdade o comportamento repetitivo é algo que vai muito além disso. Comportamento repetitivo também é hiperfoco. E também envolve insistência na mesmice. Quando a gente fala em insistência na mesmice, a gente fala de mudança de rotina. Mudar a rotina é algo muito crítico, né? Pras pessoas assim. E a viagem é uma mudança em trezentos e sessenta graus nesse processo. Porque além de você ir pra um lugar totalmente diferente, em que você vai ter horários, tudo novo, Você tem um processo transitório que muitas vezes parece ser mais desconfortável do que o próprio processo de chegada. Para vocês o que é pior é o processo da viagem ou a viagem após chegar no destino?
Thaís: O processo da viagem você quer dizer tudo que você faz até chegar lá, é isso?
Tiago: Exatamente. Incluindo o percurso.
Thaís: Para mim é o processo da viagem. Com certeza.
Michael: Também a mim a viagem é muito pior. Até porque eu praticamente não tenho uma exceção onde eu tive que viajar. E que o que eu fosse fazer após eu chegar no local não estivesse muito bem estabelecido. Então assim, geralmente eu nunca tive problema depois da viagem, o problema foi ter que chegar lá. É uma situação bem caótica.
Thaís: Caótica eu acho que é uma ótima palavra pra definir isso, porque é tudo fora do seu controle né? Pode acontecer muita coisa, tem muito imprevisto que bom, imprevisto é imprevisível, obviamente. Então, você não consegue fazer muito quanto a isso. E pra você, Tiago?
Tiago: É muito curioso, porque pra poder fazer toda essa análise, eu preciso fazer um background de como eu avaliava viagens no passado e como eu avalio viagens porque eu fiquei muitos anos sem viajar e aí quando eu voltei a viajar eu viajei por uma necessidade que se definia pelo pelos compromissos acadêmicos. Os quais eu estava participando, então envolvia geralmente viagens técnicas. Ou geralmente envolviam coisas que depois iam se tornar meu TCC. Quem ouvir o episódio 67, o sobre pesquisa, lembra lá que eu contei sobre o meu TCC, sobre o livro que eu fiz e pra eu fazer meu livro eu tive que viajar várias vezes. E aí com isso eu acabei passando a ter uma outra visão sobre viagens. Porque antes quando eu era mais novo eu tinha o menor controle sobre a própria viagem. Então quando você se torna uma pessoa maior de idade você começa a ter um maior controle sobre que dia você vai sair, que dia você vai chegar, se você está a cargo de todos os gastos que você vai ter nesse percurso de viagens, como é que você vai voltar, por que meio, por que horário, o horário que você sai, o horário que você chega. Então tem uma série de mini questões de viagens que se tornaram mais agradáveis, digamos assim pra mim.
E aí com o tempo justamente por eu ter uma característica, que eu acho que é comum dentre as pessoas do espectro, que é a questão de se preparar com muita antecedência para os eventos. O processo de viagem acabou se tornando algo entre aspas, natural para mim. Mas isso foi algo que demorou muitos e muitos anos para ocorrer. Então hoje em dia quando eu tenho uma viagem para fazer, geralmente eu sei que eu vou viajar com mais de um mês de antecedência. Isso pra mim é ótimo. Entendeu? Tentei isso preparado muito bem. É claro que às vezes envolve aí um certo fator de ansiedade. Quando a rotina não está muito completa.
Mas de uma forma geral, a experiência de viajar hoje pra mim é mil vezes melhor do que era antes. E isso considerando que eu geralmente viajo de ônibus ou de avião, mas relacionado de uma forma geral assim, com o aspecto da viagem isso me faz lembrar uma discussão muito pequena, que ficou como um ponto adjacente, no episódio cinquenta e seis, que foi o episódio sobre charlatanismo que a gente gravou com a Andrea Werner, que é uma jornalista, né? Mãe de autista, muito conhecida. E ela falou no momento assim, bem, bem pequeno do episódio. Que ela passava um desconforto dentro do avião muito grande com o filho, pelas questões sensoriais. Principalmente por causa da comida. Ela diz que dentro do avião a quantidade de cheiros que se tinha dentro daquele ambiente deixava o filho dela muito desconfortável.
Thaís: É, essa situação de avião que você descreveu é realmente bem complicada. Eu nunca tive tantos problemas nesse tipo de coisa. Eu acho que eu fico focada na questão de que eu estou viajando e tudo mais, então na parte de alimentos e tal. Cheiros, isso não costuma me incomodar. A não ser que tenha alguém cheirando cigarro perto de mim. Eu não tenho problema com seletividade alimentar, né? Apesar de que depois eu vou contar as histórias da Índia aí, vai ser um pouco tenso. Mas em geral isso não me incomoda e eu acho que eu tenho bastante sorte nesse aspecto. Até por ser um autismo leve, né?
Michael: Essa é uma questão que, no meu caso, eu acho que já entra um pouco na questão da ansiedade. Pois eu estou tão tenso com a questão das viagens, eu estou tentando deixar meu cérebro focado em tanta coisa ao mesmo tempo. Que acaba que eu não consigo sentir o impacto de qualquer sensibilidade que eu tenho, principalmente que eu tenho muita sensibilidade sonora e quando eu tenho viagens geralmente passa num vácuo, porque eu estou literalmente tão tenso com a questão da viagem. Que eu literalmente não tenho tempo nem para ficar irritado com algum barulho ou com alguma coisa do tipo.
Tiago: Você vai naturalmente entorpecido.
Michael: Basicamente você achou a palavra que eu estava procurando, entorpecido.
Thaís: Entorpecido, boa. Pra mim eu em geral sinto bastante alívio depois que eu me sento no lugar assim. Então eu já sei que eu não vou perder o ônibus ou o avião, eu não vou perder nada, o meu lugar tá ali. Tem o resto do processo da viagem que é um problema, ok. Mas pra mim o grande problema é antes de eu chegar no meu lugar. Ou se tiver uma parada aí, por um acaso eu resolver descer, muitas vezes eu nem desço. Mas aí também eu fico tensa enquanto eu tô descendo, com receio de perder ali o meu meio de transporte no meio da viagem e ter um imprevisto. Mas enquanto eu estou ali sentada parece que eu penso, “ah pelo menos eu estou razoavelmente segura aqui”.
Michael: Você tocou num ponto bem interessante. Meu maior problema com viagem no geral é que eu quase que tenho fobia de veículo. Realmente não gosto, não me sinto confortável estando numa lata de sardinha com rodas e com motores. E eu nunca fui num avião então eu não posso afirmar isso só uma hipótese mas…
Thaís: O avião de rodas também, né?
Michael: Realmente. Mas tanto é, que onde eu vou morar, eu sempre dou prioridade para que lugar que eu vou morar me dê o maior acesso possível a tudo que eu preciso a pé. Porque eu realmente não gosto de depender de carro ou de ônibus para literalmente nada. É algo bem bem específico meu, mas eu não gosto.
Thaís: Eu acho que faz total sentido, porque eu vim morar aqui perto do trabalho e tudo mais. É claro, tem vários fatores, né? Mas eu não tenho fobia de veículos, tá? Eu nunca tive esse problema. O que acontece é só eu ficar enjoada, especialmente se eu fico olhando pra fora. Tem gente que fala, “ah, se eu ficar de olho fechado, você fica mais enjoado”. Não, para mim se eu estou vendo as coisas se mexendo eu fico mais enjoada. Mas para mim tem muito haver com a questão do controle. Controle do tempo, que horas que eu vou chegar lá? Ah o ônibus pode demorar tanto, eu posso perder o ponto. Isso já já deixa o meu dia ruim, já é um problema. E se eu sei que eu vou a pé, eu sei quanto tempo eu vou demorar até talvez eu demore um pouco mais, sei lá, se eu machucar o pé, né? Dificilmente eu vou perder o controle do que eu preciso fazer para chegar em um lugar, se eu não dependo de nada nem ninguém, né? Então, por isso que para mim é bem estressante a parte da espera.
Michael: De novo tu tocou num ponto bem interessante, do controle. Por que eu não gosto de veículos? E basicamente isso pode se resumir em: porque eu não dirijo ainda. Então isso é uma situação que eu vejo que quando começar a dirigir vai ser bem menor. Um dos meus maiores problemas é quando estou num veículo, eu não estou no controle daquilo. É outra pessoa. E eu tenho baixíssima confiança nas pessoas. Realmente não gosto de estar no lugar sendo que tem outra pessoa que está comandando aquilo e tem impressões com a reputação que o motorista brasileiro tem, né?
Tiago: Nesse momento eu fico imaginando no dia que eu te dei carona e a gente se perdeu no meio do caminho. Você devia estar me xingando em pensamento.
Michael: Eu não estava tão estressado porque vem a questão da confiança. Você é uma pessoa que eu tenho uma confiança um pouco maior. Então bem tu não dirige feito um maníaco, então estava bem mais confortável do que eu normalmente fico dentro de um carro. Porque eu conheço umas pessoas que eu não sei como ainda não deram PT num carro. Talvez é porque todo o resto do trânsito da cidade onde eu morei é completamente caótico a chance de um doido batendo no outro fica menor do que se fosse um doido no meio de todo mundo seguindo as regras. Então não sei, talvez essa hipótese responda isso talvez não. Acho que responde porque isso já aconteceu com o Tiago. Tiago lá respeitou as regras certinhos e o resto do povo brasileiro foda-se.
Tiago: Quem ouviu o episódio quatro. Amor e Ódio vai lembrar muito bem dessas histórias. Do caso que eu contei que eu estava chegando na universidade e aí eu vi um carro escrito assim no no no verso né? Falando assim “você tem fobia de dirigir? Dirija com a psicóloga com a psicóloga alguma coisa assim” nesse sentido sabe? Uma psicóloga especializada em preparar a pessoa emocionalmente para poder dirigir. E aí dava pra ver que quem estava dirigindo era alguém com medo e a psicóloga estava do lado. E os caras atrás buzinando. Muita maldade no coração do ser humano.
Thaís: Eu dirijo também. Hoje em dia eu não tenho mais carro. Eu pego Uber e tudo bem não confiar totalmente nos Uber, depois eu tiro algumas estrelinhas dele se eles fizerem coisas bizarras no meio do caminho. Mas eu não gosto de dirigir, talvez até por eu ter dirigido em São Paulo por muito tempo, eu acho uma coisa bem caótica, pra mim é bem cansativo. Claro, é muito melhor do que pegar ônibus, e etc. Não tenho a menor dúvida disso, se eu precisasse voltar pra São Paulo, eu ia querer ter carro de novo. Por mais que eu odeie dirigir. Mas eu odeio o ônibus mais. E o metrô e o trem e etc. Se eu puder viajar sei lá de avião ou de um ônibus bom ou alguma coisa assim, eu acho melhor. E eu gosto de viajar, por exemplo, com minha mãe, a minha mãe dirige bem e aí ter carro tem várias vantagens, né? Porque você consegue colocar coisas no banco de trás e viajar com um certo conforto assim a mais também.
Tiago: É, eu acho que faz todo sentido essa questão do carro porque quando eu pego. Minhas viagens. eu só tive uma que realmente eu fui dirigindo que foi no final de dois mil e dezessete pra dois mil e dezoito. E quando eu dirigia em Goiânia sempre passava por um estresse muito grande inclusive, o meu primeiro e único acidente foi dando carona para o Marcos. Eu levei ele pra casa dele e aí na hora da saída eu já estava muito cansado e aí uma moto bateu. Foi um episódio bem desagradável, inclusive.
Eu viajei depois de tempos dirigindo eu pensei que a principal vantagem de você poder dirigir para chegar ao seu destino. É a sua capacidade de personalizar o seu trajeto, que tem a ver também com a questão do controle. Você sai na hora que você julgar a mais correta, você pode parar aonde você quiser, você pode levar a quantidade de bagagem que você quiser, se você quiser levar sua casa junto com você, você pode. É claro, você pode ser multado, mas enfim, são outras condicionais.
Thaís: Você assume a responsabilidade.
Tiago: Sim, exatamente. E ao mesmo tempo você tem o desgaste físico. Então, quando eu por exemplo ,viajo de outras formas eu tenho a liberdade de dormir, eu tenho a liberdade de fazer uma série de outras coisas que quando eu estou na direção, não posso.
Thaís: Eu só ia comentar a questão da viagem sem ser uma viagem de turismo. Viagem é simplesmente sair de lugares pro outro, né? Então eu vou considerar a viagem época que eu ia pro estágio, que eu pegava estrada também. Era cidade vizinha ele pra mim era cansativo em alguns aspectos mas tem a questão principalmente disso que o Tiago falou. De ficar prestando e de às vezes acontecer alguma coisa, imprevisto ali. Imprevisto eu quero dizer inclusive com relação a acidentes, né? Mas mesmo assim a quantidade de imprevistos ainda é menor do que se você depender de outra pessoa, depender do transporte coletivo, então pode parecer ficar meio neurótico com essa questão de controle, mas realmente ajuda bastante no nosso dia a dia.
Tiago: Então pessoal, pra vocês o que é melhor, rodoviária ou aeroporto?
Thaís: Entre a rodoviária no sentido de ônibus e aeroporto com certeza prefiro o aeroporto. Porque tem em geral menos gente, mas claro que os dois podem ser um caos dependendo do dia e nunca me aconteceu o de voos atrasarem coisas do tipo né? Aí deve ser um deve ser bem complicado, eu acho que os dois tem esses problemas mas de forma geral. Que o aeroporto é o melhor ambiente e a viagem costuma ser mais rápida, né?
Michael: Eu só tenho experiência na rodoviária, então tudo que eu posso dizer é que eu não recomendo rodoviárias.
Tiago: Por incrível que pareça, eu estou do lado da rodoviária. Sabe por quê? Por um motivo que eu acho muito importante. O aeroporto você sempre precisa chegar com duas horas de antecedência para fazer o check-in. E esse tempo que você gasta fazendo o check-in pra mim é um saco. Na rodoviária eu tenho a opção de chegar quase em cima da hora, deixar minhas coisas e sair, sabe? Eu considero assim.
Vocês consideraram todo o trajeto e etcétera, mas assim eu estou falando só do ambiente de rodoviária e ambiente de aeroporto. Eu sei que o ambiente de rodoviária tem mais gente, é mais caótico, mas eu tenho a opção de chegar em cima da hora e minimizar isso. No aeroporto não tem essa opção. Isso sem falar quando você tem que despachar a mala, que é mais caótico ainda.
Uma coisa muito interessante nesse sentido assim é que aqui em Goiânia, especificamente, tem uma questão local que muito interessante é que a rodoviária de Goiânia tem mais estrutura que o aeroporto. A rodoviária de Goiânia é um shopping então assim você tem entre aspas, um lazer dentro da rodoviária que é diferente de outras capitais né? Eu já conheci algumas rodoviárias de cidades assim é bem distante. Inclusive agora em setembro eu estava na na rodoviária de Belém, me parecia rodoviária de cidade do interior é uma realidade totalmente diferente do que eu estava acostumado. Porque a rodoviária da minha cidade é um shopping.
Michael: É, aquela sessão de lojas que estão lá, é considerado um shopping. Mas eu acho que um ponto interessante que você falou que uma das coisas que eu não gosto de rodoviária é justamente comigo acontece o contrário. Teoricamente eu tenho essa possibilidade de chegar lá em cima da hora porém como a minha situação demandava que eu não corresse risco, todas as vezes que eu precisei usar a rodoviária pra viagem longa, eu geralmente chego lá umas duas três horas antes. E já aconteceu da minha viagem ser seis pra sete horas da noite e como era domingo, como perder essa chance de pegar um ônibus e correr o risco de eu não conseguir pegar o ônibus a tempo de novo. Eu cheguei lá na rodoviária às onze horas da manhã. Considerando que tinha um período de uma hora e meia até onde eu saí da minha casa até eu chegar lá na rodoviária então, é.
Thaís: Olha eu me considero praticamente incapaz de chegar em cima da hora em um lugar e me sentir bem, eu fico muito estressada. Então, o normal é eu chegar muito, muito, muito antes mesmo. A não ser que eu não tenha como, sei lá, vou sair do trabalho e aí vou para algum lugar, tem que esperar esse horário, né? Mas eu eu chego muito antes pra olhar para pensar onde é que eu vou ficar, onde é que eu vou tentar, o que que eu tenho que fazer pra organizar aquilo tudo na minha cabeça. Exceto quando eu ia com a minha mãe, que aí, meio que era cega, né, vai no automático, ela faz o que tem que fazer, eu vou atrás. Mas, hoje em dia, que eu sou sozinha, então, não não tem mais isso, então eu preciso me organizar. E minha organização às vezes demora um pouco nesse aspecto e mesmo assim teve uma vez, a primeira vez que eu peguei avião aqui em Florianópolis, para ir pra São Paulo, visitar minha família. Eu quase perdi o avião porque eu fiz check-in e tudo mais, só que na hora que eu tirei o papelzinho da máquina. Ficou o código de barras na máquina. E eu não reparei, eu reparei só na hora de entrar lá, né? E aí eu não sabia o que fazer, tive que sair correndo, quase perdi o avião.
Então, mesmo chegando em cima da hora, ainda pode acontecer esse tipo de coisa, mas reduz bastante a chance de alguma coisa dar e para mim eu não eu não uso essa vantagem aí que o Tiago falou de poder demorar menos tempo né? Ficar menos tempo ali e eu acabo gostando de chegar e encontrar um lugar pra sentar de preferência um lugar que não tenha gente dos dois lados talvez um uma pontinha ali de cadeira ficar lendo, ficar ouvindo música, mexendo em alguma coisa pra tentar me distanciar ali da situação em volta que não é do meu interesse. Ou comer alguma coisa se precisar. Agora vocês falarem de infraestrutura me lembrou que eu fui pra Bonita uma vez quando eu era pequena e o aeroporto bonito básico. Era uma cabana com palha, com um banheiro e uma pista. Era só isso.
Tiago: Eu só preciso fazer um disclaimer aqui quando eu falo em cima da hora no meu conceito autístico de chegar em cima da hora é tipo meia hora antes do embarque. Então assim a minha viagem por exemplo, né? Tá marcada pra sete e meia da noite, sete horas eu tô lá.
Thaís: É, então, eu também considero meia hora em cima da hora. Muita gente deve achar que em cima da hora são cinco minutos ali, coisa do tipo, né?
Tiago: Sim, sim. É, eu acho muito interessante a gente, já que a gente tá falando de aeroporto, é que ocorreram várias mudanças na lei brasileira de inclusão. Várias legislações nos últimos dez anos favoreceram a temática do autismo com relação à sociedade de uma forma geral e uma dessas vantagens foi exatamente o autismo está entre as filas preferenciais, né? Junto com as demais pessoas com deficiência, idosos e etc. Isso inclui aeroportos. Aí eu queria perguntar pra vocês o Michael não nunca foi no aeroporto, mas é uma pergunta hipotética também. Vocês fazem ou fariam uso dessas filas prioritárias de alguma forma?
Michael: É, não!
Thaís: Pra mim depende tá? As últimas vezes que eu fui no aeroporto eu não fiz uso da fila prioritária, eu fiquei sentada na minha cadeira enquanto as pessoas entravam e quando a fila tava bem pequena aí eu levantei pra entrar. Tenho minhas dúvidas e essa foi uma boa opção, talvez futuramente eu faça uso da fila prioritária no aeroporto. Entra coisa de “será que eu preciso nesse momento?”. Então se a sala de embarque tiver um caos, poxa, será que eu não deveria fazer uso disso? Então por mais que eu sempre tenha tido esse certo entre aspas, orgulhoso trouxa, né? Meio porque é bem trouxa. Mas de pensar, não, eu não preciso, não vou e tal. A verdade é que a gente se cansa mais, a gente se desgasta mais para estar ali.
Então, por exemplo, hoje eu fui comprar roupa no shopping e tava uma fila muito grande. Eu já fui naquela loja outras vezes, quando tinha umas duas, três pessoas, eu ficava na fila normal. Agora, tinha gente naquela fila, tinha crianças correndo pra todos os lados, a música na loja tava alta, eu tava de fone, né? Pra abafar, mas mesmo assim eu tava ficando incomodada, eu pensei, putz, eu vou pegar essa fila, acho que eu vou largar a roupa e vou embora, não vou fazer nada não. Aí eu pensei, não, quer saber? Eu vou perguntar se eu posso pegar a fila prioritária. Aí eu perguntei o cara e falou que sim, a moça me atendeu bem mais rápido, só precisei esperar uma moça sair, fui atendida e fui embora. Então, em algumas situações eu peço sim, entra naquela questão de que é um direito nosso e pra mim faz sentido nesse aspecto. A gente realmente se cansa mais. Por mais que a gente aguenta ficar na fila e eu peguei fila normais quase a minha vida inteira, né?
Eu fiz muitas viagens com a minha mãe e nem sei quantas viagens eu fiz de avião, mas vamos dizer que eu tenha feito umas três assim de avião, mas eu fiz muitas viagens de ônibus com a minha mãe, eu fiz de carro também e tal .E aguenta ficar. Como eu te falei, nunca surtei em uma fila, apesar de já ter me sentindo mal, mas não sei até que ponto tinha haver com o autismo ou não. Mas de qualquer forma, as outras pessoas não estão sentindo aquilo que a gente está sentindo. Então a gente acredita que aquilo que a gente tá sentindo é entre aspas, normal, todo mundo tá passando por isso. E na verdade não, todo mundo não está passando por isso, todo mundo não vai ficar tão cansado quanto a gente na hora que a gente chegar no destino. Então eu tento ter isso em mente e portanto se eu precisar uma hora olhar e falar, não, hoje eu vou, eu posso, sabe? É realmente um direito meu. Já não enxergo isso da mesma forma que antes.
Tiago: Eu acho que a sua linha de raciocínio faz todo o sentido pra mim, inclusive é a forma como eu penso, então por exemplo, de filas prioritárias no geral, eu quase nunca fiz uso, só em lotérica. Pois eu acho o ambiente de lotérica extremamente desgostoso pra qualquer pessoa, eu odeio lotéricas com toda a minha força, meu sonho é um dia deixar tudo no débito automático para nunca precisar pisar em uma. Mas dadas as situações econômicas do Brasil, né? Essa é uma realidade cada vez mais distante. Mas com relação a aeroportos, nunca eu nunca fiz uso. Inclusive muitas vezes eu fiquei pensando mas existe também um aspecto social né eu acho que por exemplo nós sabendo mesmo sabendo que é um direito simplifica aquele pensamento nosso. Será que isso vai gerar um mal estar? Não sei se vocês não se importam com isso, mas eu sempre fico pensando “será que vai gerar um mal estar?” Será que no final das contas alguém vai implicar e no final das contas você vai acabar demorando mais do que já demora. Então muitas das vezes eu geralmente fico numa posição muito mais na minha mesmo. Eu fico observando, né? Os grupos serem chamados. Geralmente eu fico no último grupo porque eu sempre sento no corredor porque eu acho mais prático. Eu sempre fico esperando. Quando da hora eu só me levanto e entro e aí não é muito desconfortável.
Mas por que eu perguntei isso? Porque no mês de setembro nós tivemos um caso que inclusive chamou bastante atenção na imprensa nacional, que foi uma passageira com síndrome de asperger, que foi barrada de viajar com a LATAM. E foi uma situação bastante complicada. Ela chegou no guichê e solicitou a mudança de acento porque ela estava perto, se não me engano, das turbinas. E ela tem muita sensibilidade auditiva, algo normal, frequentemente as pessoas pedem pra mudar de assento e verificam a possibilidade e aí nesse momento aparentemente por uma por uma crise de sinceridade ela falou do diagnóstico dela e aí os atendentes já começaram a ficar com o pé atrás. Aí pediram um laudo, ela forneceu esse laudo com o tempo e aí falaram que eles tinham quarenta e oito horas para avaliar esse laudo e por isso ela não poderia embarcar.
E aí isso é algo extremamente absurdo porque pessoas com diagnóstico de síndrome de asperger no geral são pessoas independentes. Pode ser que tenha aí alguém tenha na verdade grau dois ou grau três e que seja diagnosticado erroneamente com asperger, isso é muito pouco possível né? De forma geral. Então é algo que não que não fez tanto sentido ela perdeu uma viagem ela tinha que inclusive viajar para fazer uma cirurgia a cirurgia estava paga ela perdeu a cirurgia teve um muito considerável e aí isso chamou a atenção da imprensa.
Qual foi a resposta da LATAM nessa situação? Eles falaram que que não houve discriminação né? Que é acusação foi sobre discriminação e de que pessoas que estão dentro do TEA de uma forma geral precisam de suporte e que essas pessoas não podem viajar sozinhas. Tem que viajar acompanhadas. Isso foi assim, né? Um alvoroço muito grande dentro da comunidade.
E o que aconteceu logo depois? Saiu algumas notícias falando que a LATAM foi multada em quinhentos mil reais por causa dessa proibição. E a LATAM claro, obviamente continua defendendo a sua postura falando que fez tudo conforme a legislação e que de tudo não tinha recebido ainda a notificação. Como nós estamos gravando esse episódio com uma certa antecedência nós não temos aqui na nossa gravação a resolução do caso. Mas esse caso dela me chamou muita atenção porque um dos motivos pelos quais eu sempre quis evitar, né? Mencionar sobre diagnóstico, sobre laudo de qualquer forma e viagens foi evitar dores de cabeças como essa. Mas a gente fica pensando ao mesmo tempo é um direito. Como é que a gente resolve esse impasse?
Thaís: É engraçado isso porque hoje que nem eu falei. Estava lá na fila, né? E eu fiquei na dúvida inicialmente se eu pegava ou não. Enquanto eu estava decidindo isso eu abri a o WhatsApp justamente pra pegar o laudo, porque eu deixo ele salvo em um lugar fácil, que eu nunca sei se eu vou precisar ou não e eu tenho esse desconforto, as pessoas olham pra mim, elas não vão falar que eu tenho qualquer coisa de, entre aspas, diferente, né? Então, tanto que eu trabalho e tudo mais que você falou, nós temos uma certa independência, na verdade em vários e vários aspectos. E aí eu percebi que eu estava muito nervosa. Eu comecei a ficar tremendo assim na hora de pegar aquela fila porque as pessoas podiam ficar falando alguma coisa, me questionando e poxa eu estava ali com o laudo, né? Eu falaria, mostraria e tudo mais. Mas é uma situação bem incômoda, mesmo sendo um direito nosso.
Eu tenho uma colega que é autista e na mesma loja já aconteceu de uma senhora de idade ser grosseira com ela e mas aí na hora que ela virou explicou a senhora falou “ah tá, entendi”. Então eh é realmente uma situação que as outras pessoas não tem muito como saber e muitas vezes estão sem paciência porque vem muita gente furando fila, coisas do tipo. Justamente na hora que eu peguei, abri meu laudo, eu recebi a sua mensagem Tiago com o alguma mensagem que você estava me mandando e aí eu abri o documento e abri o artigo falando sobre a moça que você contou agora. Então foi interessante. Na hora que eu estava ali esperando na fila prioritária, eu estava lendo o artigo.
Tiago: E agora, já descarregamos as coisas negativas sobre as viagens, mas a gente tem que contar histórias. Tem que contar coisas boas, coisas ruins, esse episódio é pra dividir também um pouco sobre as experiências de viagens. Eu quero começar com você, Michael, conte as suas experiências de viagens pra nós.
Michael: Não sei se eu tenho algo muito interessante pra falar sobre as viagens que eu fiz. Fazendo um cronograma rápido pra onde eu viajei. Quando eu era muito criança tipo dois, três anos eu fui pra pro litoral aqui do Paraná. Obviamente não lembro nada. Depois disso eu só fui viajar depois com quatorze para Curitiba. Fazer uma prova lá. A única coisa que eu posso dizer é que eu não dormi um segundo, a viagem foi durante a noite e obviamente fui ótimo na prova. Top, recomendo. Se vocês querem ir bem numa prova, não durmam um dia antes. É Sucesso.
Thaís: Não recomendo.
Michael: E depois já foi quando eu fui pra Goiânia que também foi a primeira vez que eu fiz uma viagem de um dia inteiro. Foi de carro. Foi ao todo doze horas. Eu saí do Paraná de madrugada e eu cheguei seis da tarde ali em Goiânia, em Aparecida de Goiânia no caso. E a viagem, eu não tenho nada interessante pra comentar. A única coisa que aconteceu durante a viagem foi que a gente acabou pegando umas duas ou três horas no engarrafamento, o que aconteceu? Um caminhão de boi bateu com caminhão de álcool se não me engano. Estavam tirando os bois da estrada. E por causa daquele bando de cornos, literalmente. Tive que esperar três horas no carro com calor que estava fazendo, mais de trinta graus fácil. No meio da tarde isso foi uma hora mais ou menos, então assim é já estava na um pouco antes de Minas Gerais lá pelo meio de São Paulo mais ou menos. E a única realmente curiosa foi quando a gente passou zoado e a gente viu o caminhão caminhão de álcool e ele estava derretido, literalmente.
Thaís: Quê?
Michael: Derretido.
Thaís: O calor do Sol, não?
Michael: Não, o álcool incendiou.
Thaís: O caminhão pegou fogo, entendi.
Michael: O caminhão derreteu. Literalmente até o chassi. Só tinha ali fumaça e um resto dos chassi. É isso. Eu aprendi naquele dia que combustível normal consegue derreter barra de aço. Então provavelmente construtivo de aviação também consegue. Foda-se quem acredita que 9/11 é uma consideração.
Tiago: Qual foi a sua primeira impressão com relação à terra do sertanejo?
Michael: Cara, minha primeira impressão foi… puta que pariu, ainda bem que tem um hotel logo chegando à cidade. Porque eu estava cansado, só queria chegar logo em um lugar e dormir. Porque no dia seguinte eu ia ter que ir atrás de uma casa, então eu não tive primeiras impressões diretas da cidade quando eu cheguei lá. Eu só fui ter as minhas primeiras impressões tipo depois de umas duas, três semanas foi quando eu comecei a sair e andar e comecei resolver as coisas da faculdade comecei a ter uma noção melhor da cidade.
A primeira impressão mesmo eu não tive porque eu estava com a cabeça ocupada demais para pensar no que tem de diferente aqui. E o outro motivo também que eu não tive nenhuma primeira impressão marcante de Goiás, de Aparecida de Goiânia quando eu cheguei nela. É porque para mim é uma cidade de interior como como toda cidade do interior, muito apesar de ser uma região metropolitana é muito parecida com a cidade que eu cresci em questão de estrutura.
Realmente não teve nada que me surpreendeu e até quando eu fui pra Goiânia uma coisa que sempre me deixou muito confortável em Goiânia e em Aparecida é isso de que a estrutura delas não elas é uma cidade grande é uma cidade se não me engano tem população de Curitiba ou até mais, mas a estrutura da cidade é espalhada como se fosse uma cidade pequena. Você praticamente não tem prédios, você não tem grandes centros. Você não tem aqui no Brasil você não chega a ter Autobahns, mas enfim, você não tem essas grandes ruas, essas grandes estradas passando bem no centro da cidade, ou seja, é uma cidade bem amigável para quem transita por ela a pé. Não tão amigável por causa dos motoristas, mas vocês entenderam.
Tiago: Realmente Goiânia e a região metropolitana são cidades muito horizontais né? Porque também existe uma questão aí de que Goiânia é uma cidade que tem muito espaço ainda pra crescer se não me falha a memória a área construída de Goiânia equivale a Belo Horizonte inteira. E considerando que ainda tem uma área enorme ainda para ser construída na cidade. Então, simplesmente não existe ainda uma demanda por verticalização. Você tem uma verticalização em alguns bairros, mas realmente eu acho que Goiânia só vai se verticalizar quando toda a área construída for ocupada. É muito você ter falado que você não teve uma primeira impressão porque viajar pode ser uma experiência sensorialmente tão desgastante que isso afeta até a forma como você aproveita o lugar que você está indo né?
Michael: A propósito eu lembrei de uma coisa, posso te falar qual que foi a minha primeira impressão real mesmo qual que foi a minha primeira impressão de Goiânia foi quando eu cheguei em Aparecida na verdade eu cheguei comecei a andar perto da onde eu morava. Fui olhando no chão e olhei para um monte de brita. Parei um pouco e pensei que caralho é isso que não parece brita. Foi a primeira vez que eu notei algo de diferente e foi a impressão que ficou mais marcada de onde eu cresci. Se você considerar que eu fui lá pra fazer geologia.
Thaís: Faz bastante sentido ter prestado atenção.
Michael: Você entende porque isso foi a primeira coisa que eu prestei atenção e foi engraçado que foi a mesma coisa que aconteceu comigo quando eu fui morar no litoral do Paraná e quando eu fui visitar Curitiba agora mais velho.
Tiago: As terras da MC Mayara.
Michael: Ambas as duas também tem britas que não são parecidas com as que têm onde eu nasci. E eu nunca tinha me tocado nisso. Sempre pensei “porra, brita vai ser basicamente feita do mesmo basalto daqui em todo lugar” só que quando eu cheguei em Goiânia eu olhei e vi que a brita lá nem basalto era, eu já esqueci que rocha que era mas era uma rocha bem diferente. Elas tinham umas intrusões de quartzo lá e enfim. Pesquisem isso se vocês tiverem curiosidade do que a brita de Goiânia é feita. Introvertendo também é geologia. Foi literalmente aí que eu toquei. Espera um pouco. É. Eu acho que cada lugar vai precisar usar o material diferente, né? Porque não é como se tivesse Serra Geral literalmente no mundo todo que a brita da onde eu venho vem da dos basaltos de lá. E essa foi minha primeira impressão de Goiânia. Foi puta que pariu eu vim aqui fazer faculdade, né?
Tiago: Para poder falar sobre as minhas experiências de viagem, eu preciso fazer um contexto muito importante. Eu nasci em um ambiente familiar em que eu tenho parentes espalhados nas cinco regiões do Brasil, literalmente. Eu tenho parentes morando nas cinco regiões e isso de certa forma favoreceu bastante o fato de conhecer diferentes lugares, né? De ter sobre diferentes lugares. Eu sou uma pessoa que nasceu em São Paulo, capital. Meus pais são do interior da Bahia, na região do sertão. Minha mãe ficou grávida de mim em Brasília. Eu vivi minha infância em Minas. Foi lá que eu fui alfabetizado. Então culturalmente eu sou mineiro. Moro em Goiás e presto serviço para uma empresa de Porto Alegre no Rio Grande do Sul. Então eu acho que eu sou a definição exata de brasileiro e ao longo da minha vida então eu fiz viagens em diferentes lugares, a maioria delas sempre foram para Paratinga. A cidade que inclusive depois eu escrevi um livro etc.
Mas do ensino médio pra frente eu comecei a fazer algumas viagens para lugares. Eu lembro que a primeira viagem técnica que eu fiz com os meus colegas. Foi pra cidade de Jataí, que fica no sul de Goiás. É uma cidade que tem uma temperatura um pouco mais baixa, é uma cidade cara, mas é uma cidade bem legal de ficar. Depois no ano seguinte eu fui pra Santa Rita do Sapucaí que fica no sul de Minas na região de Serras, uma cidade muito bonita, inclusive universitária, só tem jovem na cidade. Aí em 2013 eu tive uma visita técnica para Brasília. Brasília também é uma cidade que eu visitei muitas vezes porque obviamente, Brasília fica a duzentos quilômetros de Goiânia. Toda pessoa de Goiânia conhece Brasília, não é possível. Assim como eu acho que toda pessoa de Brasília já deve ter pelo menos pisado em Goiânia alguma vez na vida. Na época eu também fiz algumas outras viagens.
Eu viajei duas vezes para Campo Grande no Mato Grosso do Sul. Que é uma cidade que eu acho muito parecida com Goiânia em vários aspectos. É uma cidade onde a temperatura é um pouco mais baixa. As pessoas são um pouco mais esnobes e o centro é mais bem preservado. Mas é uma cidade legal assim, né? É uma cidade legal em termos de estrutura e de pessoas que já não são tão legais assim. Desculpa aí se você mora em Campo Grande e é uma pessoa legal, outras pessoas estão fazendo a cidade ganhar má fama. O resumo da história, até o ano de dois mil e dezenove, ou seja, esse ano que a gente está, eu conheci todas as regiões do Brasil, exceto a região Norte. Eu conheci a região sul no ano passado e a região norte pela primeira vez esse ano.
Parte desse conhecimento assim do Brasil veio por dois motivos. O primeiro a maior flexibilidade com relação a viagens como eu falei né? À medida que fui envelhecendo a gente vai tendo mais independência e o segundo motivo é a questão profissional mesmo. Isso inclui o próprio Introvertendo. Então a partir de 2016 eu marco como período de virada com relação a viagens. Eu comecei a viajar com frequência para Paratinga. Em períodos de férias comecei a ter esse costume de viajar. Fui tomando gosto pela questão da viagem, por uma série de motivos. Para produzir, para sempre fazer alguma coisa, para descansar. Eu comecei a perceber que ir para o interior de uma forma geral me deixava muito menos desestressado dessa rotina dentro da cidade, que é algo caótico. Inclusive gravei um vídeo no canal do Introvertendo sobre isso, sobre a questão de desacelerar.
De 2018 pra frente, quando eu comecei a trabalhar, né? Para prestar serviço para essa empresa de Porto Alegre que eu estou até hoje. Eu fiz minha primeira viagem para Porto Alegre em março do ano passado. E aí foi um ponto também bem bem diferente assim porque eu nunca tinha tido a experiência de viajar de avião. Achei a experiência muito curiosa. Aquela questão do avião saindo, né? E fazer aquela subida sempre foi algo que no início sempre causou uma certa tensão. Inclusive ainda tenho certo medo de avião, mas isso enfim é num nível totalmente controlável. E aí eu conheci Porto Alegre, foi uma cidade que eu gostei de cara assim né? Porto Alegre é uma cidade que eu visito com muita frequência e por causa do Introvertendo eu inclusive fui para Porto Alegre mais de uma vez, mas eu conto isso depois.
Eu quero começar falando sobre a primeira viagem relacionada ao Introvertendo que eu fiz esse ano. Que foi pro Rio de Janeiro. Bom, o Rio de Janeiro é uma cidade que, enfim, né? Cidade de turista, uma cidade que eu nunca, na verdade, fui muito simpático com ela, porque sempre me pareceu uma cidade de muito século vinte. De ruim, o que o Brasil ofereceu no século vinte, principalmente nos anos oitenta e noventa, que é a violência, desigualdade social, poluição, etc. Mas eu fui por causa do Dia do Autistão, que foi aquele evento tema do episódio quarenta e três do podcast.
E a minha, a primeira vez que eu desci no Rio de Janeiro foi muito curioso que pela primeira vez eu acho que depois de Porto Alegre eu estava numa cidade de um porte aí tão considerável quanto Goiania, né? BH também conheci, mas Rio de Janeiro está num nível muito maior do que as outras cidades por ser uma cidade tão grande, ela parece que assusta em certa medida, então eu fiquei só no perímetro de Copacabana e a cidade em si é muito curiosa. Eu gostei muito das praias. As praias de Copacabana são bem legais e tal, mas eu achei um ambiente da cidade muito desagradável. Achei muito o século vinte, sabe? É aquela coisa de muito mendigo na rua, uma cidade que fede. Isso na região nobre da cidade, as coisas muito caras, então nesse aspecto da cidade em si não foi uma experiência tão legal, mas eu gostei de ter conhecido o Rio de Janeiro, foi a primeira vez que eu fui no mar inclusive. O mais perto que eu tinha ido do mar foi Juiz de Fora que digamos está bem distante do mar então. Foi a primeira vez que eu conheci o mar. Isso foi em abril.
Michael: Uma pergunta: quando você foi pro Rio? Você conseguiu sair de lá sem levar nenhuma bala perdida?
Tiago: Bom, eu estou vivo aqui. Eu acho que é um bom sinal.
Michael: Eu estou fazendo uma pergunta ao mesmo tempo irônica e não irônica. Porque basicamente toda pessoa que eu conheci que foi pro Rio de Janeiro, rolou tiroteio perto da onde eles estavam.
Tiago: É, mas como eu falei eu fiquei só em Copacabana, né? A zona sul é é outro mundo do Rio de Janeiro mas uma coisa que eu sempre tive muito cuidado foi não andar com o celular exposto, cuidar ao máximo. Inclusive é lamentável, porque eu queria ter jogado Pokémon GO. Tinha lá uns Pokémons de água que enfim, eu moro numa cidade que é meio seca né. Então tinha muita coisa mas eu não pude pegar muita coisa porque não queria ser assaltado.
Thais: Parece ser bem razoável você ter pensado nisso bem racional. Boa ideia.
Tiago: Mas enfim eu voltei do Rio de Janeiro foi uma experiência bem legal assim né? Conhecer uma cidade nova. Não voltaria pro Rio de Janeiro por livre e espontânea vontade. Mas me pareceu uma cidade legal. Gostei das praias.
Michael: Te interrompendo só mais uma vez prometo. Amei. Uma estrela.
Tiago: É bem isso, bem isso. Eu participei desse evento, foi o primeiro evento fora do de Goiás, né? Que eu participei representando o Introvertendo. E a segunda vez foi em Porto Alegre no mês de, na verdade não. Eu viajei pra Tatuí também no interior de São Paulo em março. Estou sendo injusto, na verdade o Rio de Janeiro foi o segundo, mas a história de Tatuí eu já contei várias vezes aqui então não vou repetir novamente. Então a terceira vez foi em Porto Alegre, viajei para Porto Alegre para participar do dia do orgulho autista na Universidade Federal do Rio Grande do Sul né? A UFRGS. Foi um evento que participou eu e o Willian Chimura que já participou aqui várias vezes do Introvertendo. A gente meio que palestrou junto ali e foi uma experiência muito legal dessa vez. Porque eu tive mais tempo para conversar com outras pessoas, né? Porque no Dia do Autistão, lá no Rio de Janeiro, a gente fez um evento transmitido online, então não tinha como ter o feedback das pessoas e lá a gente teve tempo de conversar com pesquisador, com um monte de gente. Foi uma experiência muito legal. E eu fiquei duas semanas, né? Em Porto Alegre. Lá eu produzi muita coisa com o Willian. A gente gravou o episódio do podcast. A gente gravou o vídeo pro canal dele. Enfim. Está material aí espalhado na internet para fácil acesso.
Mas o auge das experiências de viagem foi extremamente recente que foi em Belém. Setembro deste ano. Por quê? Porque Belém foi uma grande aventura. Eu prometi que ia contar sobre a viagem para Belém nas redes do Introvertendo. Porque essa odisseia gigante, nesse episódio gigante, agora que vai começar a história. É o seguinte. Na área da comunicação a gente tem um evento chamado Intercom, que é o maior congresso sobre comunicação que tem no Brasil. Todo ano tem edições regionais e edições nacionais. Lá você pode apresentar artigos acadêmicos, fazer toda a discussão teórica. Mas você também tem produções, você tem produtos e você concorre no prêmio chamado Expocom. Eu inscrevi o rádio documentário que a gente fez, “Autismo e autonomia”, em 2018. Mas eu perdi na edição regional.
Já em 2019 eu inscrevi o Introvertendo, o podcast, porque ele começou dentro da universidade, hoje é uma produção independente, e eu venci a etapa regional que foi em Goiânia. Quando você ganha a etapa regional, você junta todos os vencedores das outras regiões do Brasil e vão pra edição nacional. A outra edição regional no sul foi a sede de Porto Alegre, que inclusive eu tinha me inscrito, acabei não indo, porque, enfim, eu acabei perdendo o evento, mas como eu já tinha sido eleito em Goiânia, fui eleito na nacional. E ela seria em Belém. Belém é uma cidade que eu não conhecia. O mais ao norte do Brasil que eu tinha pisado era Brasília, então realmente estava muito distante do norte do Brasil. E pra ir pra Belém eu tive que comprar passagem de avião.
O professor meu orientador inclusive me ajudou um pouco financeiramente, aliás abraço Pavan, professor sensacional. E em outra parte eu tive que reservar um hostel, né? Então reservei o hostel, comprei a passagem com bastante antecedência e já deixei tudo isso engatilhado. No dia 1º de setembro eu pego o voo, desço em São Paulo, pego a conexão, desço pra Belém, quando eu desço do avião eu já senti aquele clima extremamente quente, um vapor assim como se eu estivesse numa sauna. Uma coisa que eu nunca tinha experimentado porque Goiânia é uma cidade quente, mas mais seca. E é muito engraçado gente, o clima úmido mesmo de verdade. Peguei um Uber, fui pro hostel, desci numa avenida, numa cidade que eu não conhecia nem nada. E aí quando eu desço pra poder entrar no hostel, cadê o hostel? O hostel não existia. Basicamente, eu levei um golpe. Só que eu não tinha percebido que eu tinha levado um golpe a princípio. Pois o hostel que eu reservei era um hostel muito bem avaliado naquele site hub.com. Então já tinha deixado tudo pago, estava tudo certo.
E aí do lado desse hostel existia uma igreja da Assembleia e aí um cara chegou pra mim e falou assim: “não, olha, esse lugar não existe mais não. Direto vem gente aí procurar e fecharam”. E aí eu fiquei pensando, e agora o que que eu faço, né? Você está numa cidade que você não conhece há dois mil quilômetros da sua casa e você não tem onde ficar. Então o que que eu fiz? Inclusive, isso que eu estou contando aqui para você ver o quanto é importante pessoas dentro do espectro terem contatos sociais. Porque numa hora dessa de sufoco que não tem como você conseguir se dar bem só com as suas próprias skills. Você precisa de ter gente para te apoiar. E eu tinha um um amigo de internet há muitos anos, desde dois mil e doze, que morava perto de onde eu tinha reservado o hostel. Liguei pra ele, falei assim, “olha, cê tem como me ajudar nisso aqui?”. Eu cheguei no hostel, ele não existia mais. Ele falou, “pega o Uber, vai pra rodoviária, a gente se encontra lá e a gente se vira pra resolver isso”.
Thais: É, desculpa Tiago, é que nesse caso é específico, eu concordo histórias de que a gente precisa ter as sociais e tal, mas nesse seu caso específico, o dinheiro substituiria a social. Você poderia comprar um um outro lugar imediatamente se você tivesse bastante dinheiro sobrando.
Tiago: É, na verdade, se eu tivesse muito dinheiro sobrando, eu teria reservado um hotel, né? Então, Eu parto do pressuposto de que eu estou dentro de uma cidade com orçamento limitado, entendeu? Mas enfim, eu fui pra rodoviária, como ele tinha sugerido quando ele chegou lá, ele já deixou bem claro pra mim que eu tinha sofrido um golpe. E eu acho que a gente talvez tem um olhar mais inocente com relação a situações sociais? Eu pensei eu e aí eu não tinha ligado os pontos ainda porque ele ligou no hotel no hostel e viu que nenhum dos telefones deles funcionavam mais, eles não respondiam mais nas redes sociais e ele chegou pra mim e falou assim: “a gente tomou um golpe”.
Entrei em contato com a organização do evento porque eles tinham disponibilizado alojamento pros congressistas. Eu não tinha pegado alojamento porque eu pensei: “nossa, agora eu sou estudante formado, deixa eu pelo menos reservar um hotel aqui pra não passar sufoco”, né? Aí eu fui lá pedir ajuda pra ver se eles tinham vaga no alojamento e eles tinham. Isso me salvou bastante. Ok, já foi aí o primeiro o primeiro sufoco em relação a Belém.
Segunda coisa, o clima, né? Era muito engraçado que eu saía do banho e já estava suando. Parece que você tinha que estar tomando banho o tempo inteiro se você não quisesse realmente suar, sabe? É uma cidade muito bizarra assim. E isso quando não está prestes a chover. Aqui quando está chovendo, aí o calor é maior ainda o calor, a chuva necessariamente não ajuda mas ok. Fui pro congresso, na UFPA – Universidade Federal do Pará e aí nesse meio caminho eu estava produzindo uma reportagem para Revista Autismo sobre o número de estudantes com TEA no ensino superior. E aí eu fui procurar o pessoal da acessibilidade da UFPA pra perguntar pra eles se eles tinham pelo menos o conhecimento assim de quantos estudantes com autismo tinham na universidade.
E aí eu conheci uma professora assim chamada Rosi Prado que não só sabia quantos estudantes na na UFPA tem como ela tinha todo um trabalho de acompanhamento desses estudantes. Era uma realidade muito diferente do que eu conheci em outras universidades. E aí eu conheci uma galera diagnosticada e que era atendida ali que recebe um acompanhamento assim de curso algo assim eu já falei aqui da experiência da UFG né? Várias vezes mas está acima da experiência da UFG porque lá eles tem tudo, sabe? Todos os detalhes, todas as informações, todos os tipos de assistência e aí eu conheci outras pessoas diagnosticadas.
Conheci um cara que é a versão do Michael nortista, que é do curso de Farmácia e já escreveu um livro. Engraçado que ele é um cara muito humorístico, mas ele tem um lado muito melancólico, então ele tem um livro chamado Suspiros de Melancolia. E a gente vai fazer um dia um episódio chamado suspiros de melancolia. Vai ser sensacional. Mas voltando à questão, conheci ele, conheci a professora, conheci o Kaio, que é o monitor da área de de matemática, conheci o Lucas que é o outro monitor, do curso de de química.
É muito engraçado assim porque os estudantes lá eles recebem assistência psicológica se eles precisarem, né? Eles são encaminhados. Eles recebem assistência acadêmica. Então por exemplo estou com duvida numa disciplina. Então toda a matéria é adaptada para que a pessoa tenha mais facilidade de entender o processo, eles também fazem mediações de conflitos em turmas em que têm um estudante diagnosticado que está “causando problemas”. Ou que alguém esteja implicando. Então eles tem todo um trabalho.
E aí o pessoal meio que me adotou, digamos assim, com de uma forma muito respeitosa, muito agradável. E eu fiquei todo os dias do evento, nem participei do Intercom direito, fiquei lá entre eles conversando sobre podcast, sobre comunidade do autismo, uma série de coisas assim, andei com eles pela cidade, foi muito legal e aí a gente até chegou a conclusão de que a gente precisa fazer uma integração e a UFPA com o Introvertendo, então futuramente vamos ter episódios aí com a galera da da UFPA.
Mas falando em si sobre o prêmio. Na quinta-feira isso já estava um pouco mais a frente na viagem, eles foram comigo na apresentação do Introvertendo e eu fui apresentar o Introvertendo na categoria produção multimídia, tinha trabalhos de cinco regiões do Brasil. Tinha um cara que fez sobre uma revista do Nordeste teve umas meninas do Rio Grande do Sul que fizeram sobre o um trabalho sobre o conselho tutelar, teve uma em São Paulo que fez um projeto sobre adoção de crianças com deficiência e crianças negras e tinha o pessoal do norte que chegou atrasado e eu não assisti a apresentação deles porque a sala era minúscula e eu tive que sair pra eles entrarem e eu apresentando o Introvertendo.
O resultado saiu no sábado, que foi o dia da entrega dos prêmios. Eu fui lá pro auditório e eu estava super tenso. Eu estava com muito medo de perder porque eu já tinha passado todo aquele sufoco do hostel, né. E aconteceu outra coisa. Sobre a questão do alojamento tem uma coisa que eu não expliquei. O alojamento não era na Universidade Federal do Pará, ficava no Instituto Federal do Pará. Então era uma ponte, uma parceria entre a UFPA e o IFPA. O IFPA só disse que só dizia que podia receber os alunos até sexta-feira. Só que eu não sabia disso, né? Eu não fui comunicado.
E aí aconteceu que na sexta-feira de manhã eu levantei, me arrumei, peguei o busão como eu estava fazendo toda manhã. Quando eu voltei pro IFPA durante a tarde eu estou indo lá pro alojamento entrar no quarto pra poder pegar minhas coisas. Afinal eu tinha que reservar um outro apartamento porque enfim o evento terminava no sábado e eu ia embora no domingo. Teve toda essa bagunça por causa do hostel. Aí quando tem uma mulher da limpeza e ela falou assim, “não, todo mundo foi embora”. Aí eu: “como assim todo mundo foi embora?” Pegaram as minhas malas e levaram pro lugar aleatório que eu nem sabia pra onde era. Aí eu pensei, nossa, não é possível que isso esteja acontecendo. Aí você imagina eu louco pra pegar as minhas coisas pra ir embora, minha mala não estava lá. Tinha tipo sumido a minha mala, não tinha mas ninguém avisou.
Foi a segunda humilhação de viagem aí o que que eu fiz? Liguei no pessoal da organização do evento, fiz eles pagarem o Uber e levar minha mala até mim porque isso foi uma bagunça danada. Aí tinha uma menina na organização que já tinha conversado comigo, esqueci o nome dela, inclusive uma pessoa super legal, ela inclusive pediu desculpas, ela falou que não sabia o que estava acontecendo. Porque foi bem bagunçado, parece que o pessoal da organização foi lá pegar as malas e levar todo mundo pro novo alojamento e eu já tinha saído e aí eles partiram no pressuposto que eu já sabia, tipo foi um negócio muito aleatório.
E aí no dia da entrega do dos prêmios, eu pensando: “se eu não ganhar esse prêmio eu vou chorar muito aqui, porque não é possível, foi a viagem mais caótica possível”. E aí quando chegou a hora da categoria estava o pessoal lá do autismo comigo lá no negócio. E eu lá tenso. Aí quando eles anunciaram o nome do Introvertendo eu de choque assim, eu fiquei meio bugado assim por uns cinco segundos. Aí eu levantei, fui lá, peguei o prêmio, a foto está lá no Instagram. Voltei, parece que tinha saído um peso de cima de mim. Tanto é que depois eu mandei áudios, né? No grupo. Falei pra vocês que o Introvertendo tinha ganhado, mas eu estava tipo super dopadão durante a viagem.
Mas a coisa mais legal além de ter ganhado, é que eles fizeram uma festa surpresa pra mim. Eu nunca fui tão bem recebido num lugar, sabe? Eu cheguei lá, a gente fez uma despedida, né? E aí quando eu entrei dentro da sala da UFPA estava, com palavrinhas, “nossa despedida”. Tinha bolo, refrigerante, um monte de coisas, tipo, eu nunca me senti tão bem acolhido num lugar, sabe? O pessoal é sensacional, já agradeci eles várias vezes, mas é sempre bom agradecer de novo se eles estiverem ouvindo.
Depois que o evento acabou, eu ainda fui pro apartamento que eu tinha reservado. E aí quando eu fui pro apartamento eu percebi que eu tinha reservado um apartamento numa região perigosa da cidade apesar de ser 800 metros do aeroporto. Então eu tive que andar de Uber pra lá e pra cá. Inclusive na volta do evento com o troféu na mão começou a cair uma chuva danada em Belém. Por pouco não molhei. Eu dei uma sorte muito grande que quando eu cheguei no destino já tinha parado de chover, Belém tem dessas. Cai a chuva, destrói a cidade inteira, mas dura poucos minutos. E aí o sol está de novo pairando. Mas foi uma experiência de viagem assim, sensacional.
Porque Belém é uma cidade em si que eu não gostei, é uma cidade quente, muito quente, é uma cidade muito poluída, poluída visualmente mesmo, muita poluição visual. É uma cidade muito suja, é uma cidade que fede e é uma cidade muito violenta. Então é um apocalipse em formato de uma cidade. Mas ao mesmo tempo as pessoas de Belém são muito legais. Então foi uma experiência assim que eu penso que sensorialmente não foi legal, mas foi um aprendizado muito bom.
E outra coisa que eu preciso contar. Além de ter ido nos espaços do evento, eu também fui aos pontos turísticos. E tem um lugar lá em Belém chamado Ver-o-Peso que eu vou te falar, que é um lugar horrível, sabe? Horrível no sentido de ter muita gente, ser um lugar quente, você imagina um lugar cheio de barracas cobertas assim, com muito barulho, muita música, muita agitação. É o lugar que uma pessoa dentro do espectro que não deve estar.
E aí eu fui almoçar lá, comi vatapá pela primeira vez. E achei engraçado que tinha muito pedinte. E tinha pedintes muito violentos. E aí eu na minha inocência, né? Chegou um cara lá pedindo um refrigerante que eu tinha comprado. Eu falei pra ele não. E aí eu insisti, insisti. Só que eu não tinha percebido a princípio que ele era um cara que poderia ir lá e me dar um murro de imediato. E aí eu estava acompanhado de outras pessoas da UFPA e aí eles foram e cederam para mim, percebendo o perigo. Mas eu não tinha percebido o perigo. E aí eu fiquei pensando assim, o quanto que é importante também quando você está numa cidade que você não conhece há uma distância nesse sentido de você não andar sozinho e andar apenas no lugar onde você conhece de verdade. Porque o perigo está para todo lado.
E lá também eu mandei com o celular escondido, né? Porque as mãos leves lá são muito frequentes. É isso. Desculpa aí pela longa história. É mais é uma experiência muito legal com relação ao Introvertendo e vocês vão ver os frutos disso nos próximos episódios vocês que estão ouvindo a gente.
Thais: Nossa que caos.
Michael: Vocês tinham comentado que quando você nunca tinha ido num lugar tão ao norte. E no meu caso uma das minhas melhores experiências na minha vida foi justamente quando eu quando eu fui no lugar mais ao norte até hoje. Na fronteira de Goiás e Mato Grosso. Depois eu acabei indo um pouco mais ao norte, um pouco mais para oeste também. Porque em outras viagens já passamos pela fronteira, mas foi no campo de geologia básica que a gente tem, que é um uma matéria específica. A matéria só focada nesse campo. E são mais ou menos cinco dias de viagem, seis dias aí mais ou menos e a gente ficava em Iporá e nessa viagem sozinha eu viajei praticamente o mesmo tanto que eu viajei no resto da minha vida até aquele momento.
E no final dessa viagem, eu não lembro agora exatamente se foi do final do último dia ou no final do dia quatro. Se não me engano foi no final do dia quatro e já estava bem no finzinho mesmo, faltava pouca coisa… É foi no final do dia quatro porque no dia cinco a gente só teve duas ou três paradas na volta. Mas nesse dia a gente terminou o campo, o dia inteiro com o campo subindo o morro, e a gente já bem cansado o dia super quente, a semana inteira tinha sido super quente. E esse dia estava excepcionalmente quente, muito cansativo.
E de repente nesse último campo, o último morro que a gente sobe e é lugar… Eu fico com raiva de não lembrar mais os detalhes, mas foi bem na fronteira mesmo. Você conseguia ver onde o Rio Araguaia passava, apesar de por causa do terreno a gente não conseguia ver o rio em si, E deram ótimo campo de vista se não me engano a gente estava perto de uma reserva ali então era um lugar super bem arborizado e você tinha cerrado nativo ali em ótima quantidade. Foi para mim de longe uma das melhores cenas que eu vi na minha vida e praticamente como a gente terminou aquele campo, foi uma imagem ficou muito marcada para mim. Valeu a pena demais subir aquele tanto de morro.
Tiago: Sensacional. Só preciso acrescentar uma coisa sobre Belém é se você viaja para Belém e você não vai na Estação das Docas, que é exatamente o lugar agradável do lado do Ver o Peso, que é o lugar desagradável, você não aproveitou o melhor da cidade.
Thais: São várias docas mesmo? No sentido de lugar com navios e contêineres.
Tiago: Sim, exatamente, mas tem tipo uma uma área turística ali dentro com restaurantes e sorvetes típicos. Inclusive eu provei um sorvete de bacuri que é muito bom. Isso aqui é bacuri. É um fruto típico de lá.
Thais: Engraçado que tem alguns frutos que são muito típicos de um lugar. Que aliás tem a ver com viagens, né? que às vezes você vai viajar pra um lugar e conhece coisas bem gostosas tipo, pequi. Eu imagino que seja comum aí em Goiânia, eu não lembro exatamente em que cidade eu estava quando eu comi.
Tiago: Eu odeio pequi.
Thais: Sério? Eu no início achei muito estranho.
Tiago: É um cheiro horrível.
Thais: Depois eu que eu comi arroz com pequi, frango com pequi o problema é que era tudo com pequi.
Tiago: Exatamente esse é o problema.
Michael: Nossa, eu lembro que eu tenho uma história que eu não sei se é uma história de viagem. É uma história de viagem de uma certa forma porque eu estava nessa época eu ainda estava morando em Aparecida de Goiânia e eu estava indo pra Goiânia na semana porque a gente estava tendo o evento do laboratório que eu fazia a parte. Eu tinha saído para almoçar com o resto do pessoal do laboratório e fomos num restaurante. Eu pego lá, estou pegando as coisas, e tem arroz com milho lá. Aí eu pego o arroz com milho. Beleza, né? Nenhum problema. que eu percebo quando eu vou comer é arroz com pequi e assim como o Tiago também odeio pequi eu tive que comer aquele negócio
Thais: Como o Tiago eu vou dar um contexto rápido. Diferente dele, eu comecei a viajar relativamente cedo, mas por conta da minha família né? Viajava muito com a minha mãe. Quando eu era pequena a gente tinha bastante dinheiro. Até a minha avó ter o derrame, quando eu tinha uns dez anos, mais ou menos. Que aí a gente passou a gastar muito dinheiro com ela. Antes disso, a gente tinha bastante dinheiro para aproveitar essas coisas, sair por aí conhecer vários lugares diferentes. A minha mãe sempre foi uma pessoa de gostar de lugares próximos à natureza, vamos dizer assim, no sentido de vegetação mais fechada, ela gostava muito de fazer trilha. E eu era uma criança gordinha e sedentária, então eu tinha dificuldade de fazer isso com ela.
Mas eu gostava também de ficar em um lugar mais tranquilo, fora da cidade, eu nasci em cidade grande, né? Nasci em São Paulo, fui criada lá, cresci lá e só o tanto que o Michael falou que não viajou, ele se mudou, né? Pra mim é o oposto, eu só me mudei pra vir pra cá aqui para Florianópolis. Então, eu só me mudei uma vez até hoje uma na minha vida. E eu sempre viajei bastante. Então, pra mim era muito bom ir para cidades menores, porque São Paulo é bem caótico. Por mais que eu morasse em Pirituba, que é um bairro mais periferia, né. Eu não vou conseguir lembrar todos os lugares pra onde eu fui, até porque tem um seu nem lembro mais o nome, eu só lembro razoavelmente de sei lá, tinha uma trilha pra uma cachoeira, alguma coisa do tipo.
Eu viajava muito pra Ubatuba, a gente tinha uma casa numa vila de pescadores lá. E eu ficava quase o dia todo fora, quando eu era pequena eu gostava bastante de praia, depois de um tempo eu passei a odiar a praia, odiar tipo tudo relacionado a praia, sol, calor e tal. Mas eu não gostava de ficar no meio de um monte de gente na praia. Preferia ficar mais dentro da água. Eu e minha mãe sempre fomos mas dessas né? De não querer ficar naquela muvuca, som alto, barzinho. Então a gente prefere praias mais silenciosas. Como geralmente a gente estava de carro ou tinha dinheiro para pegar táxi, podíamos ir para lugares mais afastados sem grandes problemas levar cadeira de praia, coisas do tipo. Eu era bem aquela criança de ficar perguntando se estava chegando o tempo inteiro, porque claro incomoda ficar no carro, eu sempre tive um pouco de enjoo, quer dizer, às vezes não é só um pouco, às vezes é bastante, né? E eu nunca consegui dormir direito na viagem. Já dormi algumas vezes, mas não direito. Algumas pessoas acham super tranquilo, sei lá, dormir no ônibus todo dia de manhã. Pra mim isso nunca aconteceu. A maior parte das minhas viagens, quando eu estava com a minha mãe, eu lembro que tinha umas vanzinhas de turismo que a gente pegava. A minha primeira viagem de avião pra foi pra Porto Alegre, mas aí a gente ficou mesmo em Canela e Gramado, no Rio Grande do Sul.
Tiago: Aliás, eu conheci Gramado e Canela agora em agosto numa viagem de trabalho. Cidades sensacionais.
Thais: Quero o dia voltar pra lá, agora que eu sou adulta e posso ir pros lugares a minha vontade, né? Eu pretendo voltar, porque eu lembro que eu gostei demais, eu lembro de algumas impressões, mas eu não tenho uma uma visão tão clara de como foi a viagem como um todo. Eu lembro que eu gostei muito das comidas, eu lembro que tinha um mini mundo lá que…
Tiago: Gostou da cerveja.
Thais: Não, ó.
Tiago: Você era criança, tô brincando.
Thais: Eu bebia um pouquinho de cerveja quando eu era criança, a gente não via problema nisso não tanto que nunca foi pra mim, talvez aquela história das pessoas tenham gosto pelo proibido né? Para mim cerveja nunca fez parte do proibido porque sei lá desde pequena eu podia tomar um pouquinho de cerveja. Mas eu lembro que eu gostei muito de viajar de avião, lembro que eu não tive medo, eu até me sentia bem, eu sempre fui uma criança também muito qual que é o nome quando… Arrogante! Né? Tipo eu sou foda, então eu eu me senti muito mais forte assim por um monte de gente ali que tava com medo, criança que tava com medo esse bando de babaca, eu estou muito bem aqui, coisas do tipo.
Agora uma coisa que eu me lembro é que eu levava sempre o meu gatinho de pelúcia para todas as viagens que eu ia. E eu também levava travesseiro. Então, eu tinha o meu travesseiro e eu carregava pra todo canto. Então eu não tenho certeza agora tá se pra Índia eu levei o travesseiro, o gatinho eu não levei naquela época. Mas é engraçado que eu tive essa questão de estar sempre com alguma coisa familiar né? Algo que estava sempre e aí eu lembro também que a gente teve uma viagem de navio quando eu era pequena e que eu também não só levei o meu gato de pelúcia como eu entrava com ele na piscina depois para fazer o gato secar era meio difícil, porque não não tinha um secador de cabelo ali ou coisas do tipo. E eu também não tinha dificuldade com balanços do navio, coisas do tipo, eu ficava um pouco perdida e eu não costumava fazer as atividades com as outras crianças nesse aspecto.
Mas eu tinha comentado de Ubatuba, né? Em Ubatuba era bem comum eu me socializar com as outras crianças, o que não era comum em outros ambientes. Por exemplo, já comentei que na escola eu preferia ficar com as professoras. Agora em Ubatuba eu ficava bastante com as outras crianças, mas eu me lembro muito bem que eu era uma criança muito mandona. Eu sempre fui, né? Então as coisas tem que ser do meu jeito, então eu tô fazendo, tem que todo mundo fazer assim se não você está errado. Então eu era bem chata mesmo pras outras crianças, né? Eu tenho quase certeza de que muita gente só ficava saindo comigo porque sabia que minha mãe ia dar lanchinho no final do dia. E não por não gostarem de ficar comigo de fato. Mas eu gostava de por exemplo dar aula a pessoas, coisas do tipo, muita gente achava que eu ia ser professora, até parece, né? E coisas desse tipo.
Tiago: Tinha, isso comigo também, quando não diziam que era professor, ia ser tipo promotor, juiz, ou alguma coisa desse jeito.
Thais: É, eu acho que porque até por a gente ser meio…
Tiago: Pedante.
Thais: Pedante! Isso! Uma palavra pra isso, que eu ia falar tanto lá do arrogante, mas a gente acaba parecendo uma liderança nesse aspecto de “ah eh esse é o jeito certo e vamos fazer assim e aprendemos isso então façam de tal jeito”. Então é bem engraçado porque no final não tem nada a ver com a minha personalidade fazer esse tipo de coisa. Agora, depois que a minha vó teve o derrame e a gente passou a ter menos dinheiro, mesmo assim a gente ainda viajava bastante pro interior de São Paulo.
Então, a gente passeava de carro, pegava uma semana, algo mais ou menos assim, ia para uma cidade e ficava andando. Porque a gente considerava que uma semana era um tempo bom pra conhecer a cidade, né? Saber, quando a gente tava começando a conseguir se locomover na cidade sem mapa, aí a gente tinha que ir embora, mas ok. E aí uma vez a gente foi pra Santa Rita do Passa Quatro, que eu acho que ainda São Paulo, quase Minas, mas eu não tenho certeza, na verdade a gente tava indo pra Araxá, se não me engano e aí ficava no caminho.
Tiago: No Triângulo Mineiro.
Thais: Eu não, não lembro exatamente a posição do Triângulo Mineiro, né?
Tiago: É Araxá, Uberlândia e Uberaba, né? São as três grandes cidades do Triângulo Mineiro e elas ficam digamos assim aí a poucos quilômetros da divisa com Goiás. É tudo nessa região.
Thais: Ah, realmente eu não me lembrava. Teria que pesquisar no Google. Mas uma coisa curiosa que aconteceu em Santa Rita do Passa Quatro, que infelizmente a gente não tirou foto e muita gente acha que a gente mente na hora que fala isso. Mas não, é bem literal, a gente não tava encontrando lugar paa almoçar. Então, eu e minha mãe chegamos, eu acho que era um final de semana e tava tudo fechado, a gente com muita fome e a gente encontrou um restaurante que estava fechado pro almoço e eu nunca tinha visto o restaurante fechado pro almoço. As pessoas em geral acham que eu estou zoando. Mas não. Realmente isso aconteceu.
Tiago: Quando você falou que era algo que as pessoas dizem que é mentira e você fez o contexto com Minas Gerais. Eu de verdade achei que você ia falar do ET de Varginha.
Thais: ET de Varginha? É gente é não. Isso aí é mentira. Isso aí eh não. Nem nem ia ter de Varginha, Area 51. Não, não rola. Não é porque eu vim aqui para Ilha da Magia que nem o pessoal chama Florianópolis, que eu deixei o meu coraçãozinho hard science de lado, tá?
Tiago: Ilha da magia parece tanto o nome de gravação de DVD de pagode, sabe?
Thais: Ilha da Magia?
Tiago: É algo nesse nível.
Michael: Eu ia falar que também parece outra coisa, mas.
Thais: Mas foi interessante assim conhecer cidades menores também, no final a minha mãe acabou até conhecendo uma cidade que ela gostou tanto que resolveu morar lá. Foram viagens legais por mais que tenham sido viagens de baixo custo, então dá pra você viajar e aprender coisas boas em viagens que não custam tão caro, né? Mas uma viagem que foi muito bacana. E foi de avião nesse caso, porque era meio longe também. Foi uma pra Foz do Iguaçu, que eu lembro que eu fiquei muito impressionada com as cataratas de Iguaçu, eu olhando aquela água toda, aquela massa de água imaginando tipo que você não consegue morrer afogado lá muito provavelmente porque eu acho que você morre simplesmente esmagado pela quantidade de água e isso me deixava completamente hipnotizada olhando aquela água toda caindo ali. Então é um lugar pra onde eu pretendo voltar só pra ficar olhando aquele monte de água de novo. Foi bem legal. tem muito lugar legal no Brasil, tá?
Eu sei que muitas vezes as pessoas pensam em destinos turísticos fora do Brasil, claro que tem muito lugar legal fora do Brasil também, mas eu acho que vale a pena explorar esse eh essa diversidade de paisagens que a gente tem aqui. Eu nunca fui pra região norte.
Tiago: Momento valorize o turismo nacional.
Thais: É, aí aparece a bandeirinha lá, Ministério da Cultura, Ministério do Turismo, sei lá, tipo, Governo Federal, patrocinado por… Vocês estavam falando das regiões pelas quais vocês viajaram, eu nunca viajei pra Região Norte. Particularmente hoje em dia eu não gosto nada de calor. Quando eu era criança não me incomodava tanto, como eu comentei. Quando eu era criança eu gostava de praia, aí eu passei a odiar praia por um bom tempo e aí depois que eu vim aqui pra Florianópolis que eu comecei a visitar as praias sozinhas, sozinha em horários bem alternativos. Eu passei a gostar mais. Inclusive da hora que a gente estava falando de viagem, uma coisa que eu tinha pensado em falar e a gente começou a entrar em outros assuntos, que eu falei de viajar pro meu estágio, né? Eu sempre fui muito de pegar horários alternativos, então, só ia, sei lá cinco da manhã, seis da manhã. Pessoal me achava muito louca por fazer isso, mas não pegar trânsito, não tem um monte de gente em volta, para mim era um ganho absurdo. Então, até hoje eu faço isso, eu vou para praia bem cedo, não tem ninguém lá e aí também na hora que começa a encher de gente, eu pego e vou embora, volto para casa e pronto, acabou. Então eu voltei a gostar de praia.
Tiago: Eu faço isso a minha vida inteira, assim, quando eu fazia o ensino médio eu pegava ônibus cinco e meia da manhã, sem necessidade, só pra não ter que pegar o ônibus cheio.
Thais: É, pra mim isso faz muito sentido. Então, é algo que você economiza uma energia muito grande por num num ficar no meio de uma multidão de gente. E agora pensando em algumas viagens mais específicas, em hábitos que eu tive e que às vezes incomodavam minha mãe.
Uma vez eu fui para Minas mas não acho que foi essa de araxá, agora eu tenho certeza. Mas foi uma vez que eu fui pra Minas, a gente ficou em um hotelzinho lá e na época eu já tinha notebook. Então, eu já era um pouco mais velha. E aí eu não queria ir conhecer os lugares. Ela saia pra, “ah, hoje eu vou tomar banho de sais não sei onde, vamos?” Eu, “ah, não, eu quero ficar aqui dentro do quarto vendo anime”. E aí eu dormia durante o dia, ficava acordada vendo a anime durante a noite e ela falava, “ah, mas você nem está aproveitando a viagem”.
Na verdade, eu estava aprontando, assim, do meu jeito. Mas para as outras pessoas, às vezes é difícil entender que você está aproveitando ali, você só não está aproveitando junto com ela do mesmo jeito que ela. E hoje eu percebo também que para ela isso fazia falta, não era algo que eu percebesse na hora, precisei de um toque de outras pessoas pra perceber isso, que ela queria que eu participasse junto, né? Mas era bem comum acabar tendo algum hábito peculiar meu. Então que nem essa diversão de horário, de ficar com o computador pra todo lado. Pegar um livro e ficar lendo.
Tiago: Eu acho muito curioso como Minas é um estado com tanta cidade, com tantas diferenças que eu tenho muitas histórias bizarras de viagens em Minas também, né? Porque eu morava em Minas e ia pra Bahia. Eu lembro que uma vez a gente passou em Montes Claros e aí o carro quebrou e teve que ir para o mecânico e aí por algum motivo eu não lembro muito bem. Eu sei que eu caí dentro daquela vala onde o mecânico entra embaixo ou onde tem escadinha e eu fiquei tudo sujo de graxa. São coisas que ocorrem comigo durante as viagens.
Thais: Eu quase caí com o carro nessa vala, complicado mas ok. Continuando aí eu só fiz uma viagem de carro que eu dirigi de fato. Que foi pra casa da minha mãe também achei cansativo mas volta ao que foi muito melhor do que se eu tivesse ido de ônibus com bastante certeza.
Algumas viagens que eu fiz durante o ensino médio, eu participava das olimpíadas de astronomia. A Olimpíada de Astronomia é diferente das outras Olimpíadas pois não tinha a fase estadual, só tinha nacional, não sei como tá hoje em dia. Tinha nacional e internacional, aí depois passou a ter duas internacionais e o Brasil optou por uma só, e eu viajava muito para o pro interior de São Paulo e teve uma vez que fui pra pro Sul de Minas para fazer segunda e terceira fase da nacional, porque a primeira fase era na nossa escola e aí a segunda e terceira fase eles reuniam todo mundo do Brasil em uma dessas cidades. E a primeira vez que eu fui, foi na oitava série e foi em Águas de Lindóia.
E só que eu não conhecia direito as pessoas da astronomia, depois eu passei a gostar muito das pessoas de astronomia, mas eu acho que eu já comentei isso aqui, que eu me sentia de fora do grupo, né? Eu me sentia muito mais naquele grupo do que em qualquer outro, mas mesmo assim em relação às outras pessoas, eu me sentia fora do grupo. As pessoas tinham que se organizar pra ver quem ficava com quem nos quartos e todo mundo se conhecendo, “ah você fica comigo, você fica comigo”. E eu sobrei, né? Obviamente, aí teve uma menina que depois fez faculdade comigo e com quem eu converso muito até hoje e falaram “ah sobrou ela” e ela fica com você aí eu falei “ah, ok”. E no final teve uma colega nossa que disse “não você fica com a gente” aí ela foi embora, então eu fiquei sozinha de novo. E eu fiquei naquela e agora que eu vou fazer né?
E aí veio uma monitora que na verdade era uma professora, que estava lá meio que pra ajudar a coordenar os alunos. E aí ela falou “ah então você fica comigo”. Só que ela não era da astronomia nem nada do tipo, ela era só uma professora que tinham mandado a mais, porque o número de alunos era muito grande e a professora que era de astronomia de fato não seria suficiente. Já que ela teria que estar em vários lugares, ela teria palestras e tudo mais e não ia poder ficar com a gente o tempo inteiro. E tinha também os monitores que eram de diversas universidades. Além de alguns ajudavam nas aulas na nossa escola e tudo mais. A minha escola inclusive tinha aulas específicas, né? Para essas Olimpíadas.
Como eu fiquei no quarto da professora, eu ia com ela pros vários lugares. Então, mais uma vez eu acabei não tendo socialização com os outros alunos da minha escola. E ela socializava muito com alguns professores e pais que estavam acompanhando os seus filhos e que estavam sozinhos também. Então eu acabei tendo mais contato com essas pessoas, no final a gente meio que formou um grupo, um quarteto entre aspas que durou pelo resto das Olimpíadas, né? E essas pessoas aleatórias que ninguém conhecia que caíram lá, apareceram e aí nesse dia, a gente teve a prova. Porque a gente estava lá para fazer a segunda fase.
E depois que eu fiz a prova, a gente tinha falado o seguinte, agora vocês voltam pro hotel e à noite a gente vai rever as questões. E era noite, tipo umas oito, nove da noite, coisa assim. E a gente voltou pro hotel e essa professora falou, ah não, esse pessoal tá querendo ir lá à noite para festa, para algo assim, sei lá, eu tava na oitava série, né? Eu achei estranho, mas aí ela falou, “não, eu não vou deixar ninguém ir, não é para você ir”, eu estava no quarto com ela, então eu não saí e na hora eu pensei, “ah, realmente, né? O pessoal deve tá querendo é bagunçar porque é isso que as pessoas fazem”. Para mim era assim que se passavam as coisas na minha cabeça.
E aí de repente à noite chegou a professora de astronomia de fato entrou no quarto, me deu uma bronca absurda de porquê você não está lá com todas as outras pessoas. Eu falei “ah porque eles me falaram que não pode”. “Não você tem que ir pra lá agora” e aí eu tomei muita bronca por causa disso a outra professora acabou tomando bronca também falaram “ah não era pros alunos irem” só que assim, ela não tinha sido instruída a respeito disso né, então teve vários problemas não vão entrar no mérito. Mas é uma viagem que eu me senti meio alienada vamos dizer sim eh sem piadinhas de aliens com astronomia também, tá gente?
Tiago: Eu acho curioso que esse sentimento é um sentimento compartilhado assim durante toda a minha trajetória acadêmica, sabe? E inclusive algumas viagens estudantis eram horríveis assim nesse sentido porque a exclusão era muito visível. Era algo que ficava escancarado no sentido de sobrou o professor, então você vai dormir com o professor. E sobre essa coisa de alunos aprontarem, minhas viagens do ensino médio, era cada história que tinha uma vez que tinha um casal da nossa turma que a professora pegou eles transando e o pessoal da turma inteira encobriu eles, entendeu?
Thais: É, então eu também tive bastante dessas, justamente por a questão de não fazer parte de um grupo de fato, né? Não me sentir parte de um grupo. Então, acabei entrando no que o Tiago tinha falado de que às vezes você ter contato com as outras pessoas ajuda em outros aspectos. Então você saber o que está acontecendo, por exemplo, nesse caso se eu soubesse que “ah todo mundo está indo lá porque realmente vai ter essa revisão de prova e é pra gente ir lá ouvir o outro professor falar”.
Tiago: Ah! Era uma revisão de prova? Eu pensei que era uma festa aleatória. Era?
Thais: A mulher não deixou as pessoas irem porque ela achava que era uma festa aleatória, mas não, era de fato uma revisão de prova. E eu achei que ela estava certa, mas nós duas estávamos erradas. Por isso que a minha professora me deu bronca, entendeu? Revisão não é revisão no sentido que a gente tem na faculdade, né? De ir lá, sei lá, chorar entre aspas mas o professor ia pegar e comentar cada uma das questões, falar um pouco sobre isso. Então tem esse problema da alienação, da gente não tá ali no meio, então não tá ciente do que tá acontecendo, às vezes mudam o evento de horário, a gente não fica sabendo, então é realmente importante você ter contato. Apesar de ser meio difícil.
Tiago: Eu acho que isso está muito relacionado à questão que a gente discutiu no episódio de regras sociais, né? Que o episódio quarenta e um, que é muito sobre essas coisas, às vezes a dificuldade ela superficialmente ela parece tão simples mas tão simples que as pessoas aprendem as coisas naturalmente e as pessoas pegam as situações sociais numa leitura automática, mas as pessoas autistas têm precisando de treino pra poder pegar isso, né?
Thais: É, as pessoas não explicam pra gente de forma lógica, né? Elas esperam que a gente vá entender, porque parece um negócio óbvio e não, a gente não entende, a gente tá perdido. Tipo, o que está acontecendo? Todo mundo sumiu, mais ou menos isso. Então, teve uma outra vez quando eu entrei na faculdade. Inicialmente eu resolvi que eu queria participar de tudo que desse. Então, eu participei do Grêmio, eu não participei da atlética, eu entrei na atlética e achei pessoal muito porra louca, aí fui embora. Mas eu fiquei um pouquinho no centro acadêmico.
Tiago: É a definição das atléticas do geral.
Thais: Eu fiquei um pouquinho no centro acadêmico aí também não curti tanto. E aí eu comecei a participar do Grêmio, participei do jornal, eu fazia tênis de mesa. Eu era muito ruim em tênis de mesa, absurdamente ruim, minha coordenação motora mas tudo bem. E como tinha pouca mulher, né? A faculdade de engenharia, a gente tinha dificuldade de montar time, então eu ia meio que com reserva para a gente não correr o risco de perder por WO. E aí eu fui nas viagens em duas das viagens, né? De jogos no meu primeiro ano, depois eu não fui mais, eu só fui no primeiro ano, que foi a engenharia das que era das várias engenharias. E o interUSP, das várias instituições da USP.
E na engenharia que foi a primeira teve uma situação meio estranha porque o time de tênis de mesa tinha reservado um hotel, todos tinham combinado aquilo e aquilo não tinha sido combinado comigo, então eu não sabia o que estava acontecendo para variar e aí tinha o alojamento da atlética, que era o lugar mais barato pra ficar que foi a minha opção, né? No primeiro ano da faculdade, porque fui bancada pela minha mãe inclusive e aí lá no alojamento eu não conhecia muita gente, eu conhecia o pessoal do Grêmio mas eles estavam todos juntos lá e aí alguns estavam com namorada e queriam ficar se pegando com os namorados. Então eu não estava sendo bem vinda lá no quarto.
Basicamente uma das namoradas virou e falou que não tinha espaço pra mim ali. Ok. Aí eu peguei e fui procurar um quarto que tivesse um lugar. Vários estavam lotados. Tinha um monte de gente até no corredor. E eu achei um quarto que tinha um lugar, joguei lá o meu saco de dormir, minha minha mala e saí pra ver a cidade e as coisas e quando eu voltei a minha mala estava no corredor e aí eu peguei as minhas coisas, minha mala, coloquei de volta no quarto, dormi e no dia seguinte de novo eu saí, né? E quando eu voltei minha mala eu estava do lado de fora de novo. E eu não entendi também o que estava acontecendo.
E aí eu comentei com um dos meninos do karatê. Eu falei pra ele que eu não estava entendendo e tal e aí ele descobriu que era um cara do basquete que tinha meio que decidido que esse quarto aqui é para o pessoal do basquete não é pra pessoa de fora, só que eu não tinha onde ficar, entendeu? O meu time não estava, eu não conhecia as pessoas ali. Eu não conhecia direito as pessoas da minha faculdade, aliás. Só algumas da minha turma.
E aí o menino do karatê conversou lá com o cara do basquete e acertou as coisas pra eu poder ficar lá no quarto, dormir lá. Só queria dormir só, não queria fazer nada. Tanto que um dia eu cheguei e senti muito cheiro de maconha e já era de madrugada, né? Tipo não, não era de madrugada, era meia-noite mais ou menos. Aí eu peguei e saí e fui andar na rua.
Como eu participava do jornal aí eu resolvi entrevistar algumas pessoas que eu encontrei na rua pra escrever um artigo de jornal. O que foi bem divertido, os outros artigos de esportes tem um um lado muito “ah nós somos foda olha tudo que nós ganhamos”. E o meu artigo, que eu escrevi foi o ponto de vista das pessoas da cidade né? Com relação a um evento desses indo pra lá. Então a gente estava muito animada, meninas que a “nossa mas é engenharia então a gente vai conhecer um monte de homem”. Gente de comércio falando, “nossa, as nossas vendas aumentaram muito”. Gente da farmácia falando, “ah, a gente vendeu um monte de engov e camisinha”.
Tiago: Basicamente uma jornalista. Pegou um outro ângulo da notícia.
Thais: O outro ângulo, nossa, foi muito legal, isso daí. Então, assim, a viagem acabou sendo legal nesse aspecto, eu aproveitei do meu jeito, bem diferente das outras pessoas, até teve um colega meu que esses dias falou, nossa, mas costuma ser um caos. Falei, “realmente, foi um caos, mas eu fiquei meio que do lado de fora, a maior parte do tempo”. E uma coisa que é meio espantosa, assim, do meu ponto de vista, é porque eu não gosto de barulho alto e tudo mais, mas lá e eu nem ficava bêbada, tá? Algumas pessoas podem não acreditar, mas eu realmente não estava bêbada. Mas eu estava em um ânimo tão grande em relação a algumas coisas. Com relação aos jogos, a gente ganhar os jogos e a nossa faculdade tinha uma bateria muito grande e quando a bateria entrava eu não me incomodava. O que é bizarro. Não faz sentido porque se tiver hoje em dia uma bateria muito longe de mim eu vou estar bem incomodada. Então eu tenho a impressão…
Tiago: Bom considerando que você ficou num quarto que tinha fumaça de maconha. Talvez você foi uma fumante passiva.
Thais: Pode ser. Talvez eu estava bem maconhada. Sem perceber. Mas eu tenho a impressão de que algumas situações. Eu não sei se é adrenalina, mas deve liberar alguma substância meio doida aí no meu corpo que eu fico entorpecida, como disse o Michael. Em relação a algumas coisas eh e naturalmente mesmo. Eu realmente quando eu estava no ensino médio eu costumava brincar que eu achava que meu cérebro produzia alucinógenos. E eu não sei assim o que que o meu cérebro faz mas alguma coisa faz porque é meio estranho isso.
Mas de qualquer forma foi uma experiência boa nesse aspecto, eu fui em mais uma viagem, esse foi um pouco diferente, mas não é o tipo de viagem que eu goste, né? Em relação ao normal, prefiro ficar quieta, vendo lugares mais tranquilos. Em outra viagem para gente não se estender tanto assim, que eu mais uma que eu quero comentar, eu já comentei em outros episódios e foi bem marcante aí na minha vida, foi a viagem pra Índia, que foi por causa da astronomia também. Foi no primeiro ano do ensino médio que eu fui pro internacional. E aí a minha escola pagou tudo. Então até porque na época a gente não ia ter jeito nenhum pra pagar a viagem saindo. É interessante, é bem diferente do que as pessoas imaginam, né? Porque eu não consegui conhecer muitos lugares na Índia, a gente ficou hospedado em um centro de energia nuclear, de estudos de energia nuclear, né? Não, não foi tipo no quando a gente fala isso as pessoas acham que a gente ficou numa usina nuclear.
Tiago: Não. Eu acho que não, viu? Acho que só autistas pensam que ficou no centro nuclear ouvido literalmente.
Thais: Pode ser. Bom, e estou explicando porque eu imagino que tem autistas ouvindo. Não, eu não fiquei em um lugar radioativo, eu acho. Né? Se foi, não era pra ter sido. Mas era um lugar altamente militarizado. A gente tinha que o tempo todo tá com crachá, os caras vinham conferir se a gente tava com cada chave, eles estavam bem armados, coisas do tipo. E até porque eu lembro que na época já estava…
Michael: Estava praticamente dormindo aqui, o que? Onde você estava?
Thais: Na Índia. Na Índia. É. Estou falando da Índia. E bom, a índia tem há muito tempo conflito com o Paquistão. Na época estava tendo algumas tensões também, então as pessoas estavam ainda mais alertas do que o normal né? Ainda tem muitas histórias ali pra eu ficar falando horas sobre isso. Já aconteceu aliás já ficar falando horas sobre isso mas acho que o principal aspecto é que eu tive dificuldade com a comida. Eu sempre gostei muito de comida apimentada, o que eu não conheço muitas pessoas que gostem tanto de pimenta quanto eu. Mas lá chegou em nível que eu realmente não conseguia comer em alguns momentos. E quando eu voltei pro Brasil inclusive eu deixei de sentir o gosto por muito tempo. Então, precisava colocar um absurdo, assim, de pimenta pra eu sentir um pouquinho e falar, “ah, realmente, tem um pouquinho de pimenta aqui”. Coisa que, assim, mas ninguém aguentava colocar na boca, eu estava sentindo mais ou menos.
E quase tudo lá era frango, né? Porque não tem praticamente carne de vaca nos lugar eu fui pelo menos, tem lugares da Índia que que tem sim, tá? Eh, porque tem várias culturas dentro da Índia, tem muçulmanos dentro da Índia e tudo mais, mas lá onde eu fiquei, não tinha. E chegou a um ponto assim na comemoração final do último dia, o último banquete entre aspas e eu não aguentei mais. Aí eu realmente coloquei o negócio no prato, fiquei um tempão olhando, pensando, não, eu tenho que comer porque eu já não tô comendo direito faz um tempão, eu me alimentava de torrada, quase todo dia, né? Eu fazia uma pilha de torrada com manteiga e engoli aquilo lá. E passava o resto do dia nas torradas do café da manhã. Mas eu estava tentando me forçar a comer e eu não consegui. Eu coloquei o negócio na boca, fiquei um tempo assim falei “nossa se engolir eu vou vomitar”. E aí eu devolvi pro prato. Eu não sou de fazer isso. É um negócio que eu considero bem nojento. Mas não dava.
Tiago: Você falou inclusive com essas palavras no episódio cinquenta e oito de adolecencia que você contou essa viagem, né? É algo bem marcante pra você. Eu não faço isso, mas naquele dia eu fiz.
Thais: É, então, nossa. Foi realmente muito marcante porque me incomodou bastante. E teve muitos dias assim que a gente se alimentou de trufas, eu tinha comprado várias trufas, trufa de chocolate, não trufa do cogumelo. Eh até porque cogumelo é caro, nunca comi trufas de cogumelo. Mas…
Tiago: Hoje é dia dos alucinógenos.
Thais: Opa. Os alucinógenos devem ser bem mais baratos do que duas. Mas a gente se alimentou alguns dias de chocolate, de coisas bem aleatórias assim porque a comida lá era bem difícil. Mas teve uma situação que eu achei muito legal e na época eu não percebi, tá? Eu só fui perceber muito tempo depois, às vezes isso acontece, eu fico pensando a respeito do que aconteceu e depois eu percebo alguma coisa que eu nunca tinha reparado. Que foi o seguinte, no café da manhã, naquela época costume de todo dia tomar leite gelado com Sucrilhos ela o leite é quente. Sempre era leite quente e aí eu pedi pra um dos atendentes com meu inglês horrível.
Ele conseguiu entender que eu queria leite gelado, não queria aquele leite quente e aí o cara falou beleza, obviamente não com essas palavras, era em inglês. Mas basicamente, eu fiquei muito tempo esperando e a gente tinha prova naquele dia. Então eu comecei a ficar muito estressada porque o cara não vinha nunca com maldito leite e aí quando ele chegou eu estava muito bravo assim é que eu realmente não sabia falar palavras agressivas em inglês, mas eu mal agradeci o cara e peguei ali tomei o leite gelado e tudo mais e depois de muito tempo eu pensei que na verdade o que acontece é o seguinte como o leite lá não é pasteurizado que nem aqui eles fazem o leite por isso que ele está sempre quente.
Então o cara ferveu leite e foi gelar o leite pra mim. E aí hoje eu percebo, nossa que fofo da parte dele, absurdamente fofo. Se eu tivesse percebido eu teria agradecido muito e obviamente não eu não sei, mas vamos ficar mas eu espero que ele esteja muito bem e que ele seja muito feliz e eu espero muitas coisas porque foi incrível. Seria muito mais normal alguém virar pra mim e falar, não tem. Tipo, não tem mais tipo se fodeu, pega aí o quente mesmo e não. Então, foi também só o que me marcou.
Então assim, da Índia, o que me impressionou mais foi essa relação, assim, que pareça foram as pessoas, né? O cuidado das pessoas, o carinho das pessoas. E eu nunca fui de reparar esse tipo de coisas, eu demorei muito, inclusive para perceber isso. Foram anos, né? Isso foi legal. Em termos de meios de transporte, olha gente, eu sei que a gente falou mal dos meios de transporte aqui, a gente tem muitos problemas, mas lá é muito pior. Não que a gente tenha que se contentar com o que a gente tem aqui, mas lá é muito, muito, muito pior. O trânsito é pior, os motoristas são piores, o caos é maior em todo canto. Então, o Brasil não é um lugar bom para asperger sim, mas a gente tá na Índia, isso já devia ser motivo de felicidade.
Michael: Não sei se isso vale por muita coisa, porque é a Índia.
Thais: É, então, mas imagina, é a Índia, tem muita, muita gente lá. Imagina quantos aspergers e autistas de diversos níveis de espectro moram lá e como deve ser.
Michael: Uma derivação genética super absurda, se bem que não dá pra saber se é porque aí é porque tem um bilhão de pessoas na Índia por isso que eles tem tanta variedade genética ou se é algo exclusivo da índia porque o único exemplo que a gente tem é a China e bem, ninguém vai lá na China perguntar se as pessoas saem bugadas toda hora.
Thais: É que na Índia também você tem que considerar que tem uma quantidade muito grande de culturas que meio que se encontram ali. Você pode até ver a parte histórica da Índia é fascinante né? Mas entra naquilo que a gente estava falando mais cedo de volume. Você tem muita gente, então você passa a ter muita gente de todo tipo, é uma coisa que sempre falam no xadrez verbal assim, “ah, tem uma minoria, mas o problema é que toda minoria na China e na Índia significa milhões de pessoas”. Então, “ah, tem uma minoria ali de dez milhões de pessoas”.
Michael: Que no caso da Índia ela é bem conhecida por ter muita anomalia genética tipo muita mesmo. Eu estava comentando e daí é meio difícil saber se é porque tem muita gente lá mesmo ou se é algo exclusivo da Índia porque bem não dá pra saber se na China é assim.
Tiago: mas de uma forma geral eu acho que o Brasil é um país muito bom ainda para o autista por causa de um quesito que cara o nosso país avança muito. Que é questão de legislação nossa legislação que é muito avançada. Eu acho que o maior problema é o clima mesmo, sabe porque boa vontade para tornar a vida das pessoas melhor, não falta.
Thais: É, em vários aspectos é bom, mas nem todos.
Michael: Eu vivi pra alguém elogiar de alguma forma a legislação brasileira.
Thais: Mas aí uma coisa que aconteceu também na viagem da Índia entra naquelas coisas de que a gente às vezes não sabe como lidar, né? Com uma situação muito inesperada foi que quando eu estava voltando eu eu não comprei nada, tá? Porque eu olhava as coisas, algumas pareciam caras, na verdade o nosso dinheiro se multiplicava na Índia, então na verdade as coisas eram baratas, mas como eu não tinha muito dinheiro assim, não tinha costume de gastar o dinheiro, tinha costume de economizar. Então eu ficava com receio de gastar ali e eu economizei quase toda a mesada que a minha mãe me deu que na época eram trezentos dólares. E aí, bom, não lembro como que estava, quantos reais valiam um dólar na época tá? Mas na volta, no aeroporto me falaram que tinha dado excesso de bagagem.
Eu estava com os professores lá. Só que os professores não estavam muito no caso. Eles no máximo estavam traduzindo. E eu não tinha comprado coisas. Então eu achei muito estranho. Mas o que eu ia fazer? E aí a mulher falou “ah, deu quinhentos dólares que você tem que pagar”. E aí eu virei professor e falei” professor, eu não tenho quinhentos dólares”. E aí a mulher perguntou pra ele, que estava intermediando, quanto eu tinha. Eu respondi que tinha duzentos e cinquenta dólares, que era o que tinha sobrado.E ele falou beleza, pode ser. E só anos depois eu descobri que eu fui roubada Porque não é assim que funcionam as multas “tipo quanto você tem? Ah pode ser me dá aqui que pronto, tá tudo certo”. Então assim, apesar de todo cuidado e carinho que as pessoas da Índia tem, também teve isso.
Michael: Não, o que eu acho mais impressionante é que você foi roubada. Seu o professor tinha noção disso e ele foda-se.
Thais: Ele deu ok. É, ele só traduziu o roubo pra mim e beleza. E não me falou nada, ok. Aí depois eu nossa eu fiquei muito mal e aí eu tenho um outro colega que ah sei lá eu eu acho que ele é asperger também. E aí ele virou e nossa “mas eh por que que você fez isso né? Você devia ter jogado todas as suas coisas fora e comprado porque deve sair mais barato se eu jogar tudo fora e comprar de novo”. Fez muito sentido.
Mas eu estava muito triste, aí eu mandei ele calar a boca porque eu estava quase chorando. Eu tive que contar aquilo para minha mãe, felizmente ela entendeu que na época ela não entendeu que eu tinha sido roubada também, tá? Então não foi só eu. Mas ela percebeu que eu não tinha feito aquilo de sacanagem, não tinha perdido dinheiro aleatoriamente, eu realmente fiquei bem triste com o que aconteceu. Fazer o quê?
Tiago: Eu só entendi que você tinha sido roubada quando você falou que você tinha sido roubada.
Thais: Pois é, né? Isso porque nós somos adultos que já viajaram e tudo mais. E não é uma coisa que fica assim tão clara para a gente, quer dizer, a gente não é menos experiente. Mas sei lá, eu me sinto trouxa com essas coisas. Às vezes a gente é muito inteligente pra algumas coisas e muito trouxa para outras.
Tiago: Exatamente.
Thais: Então essa aí foi uma situação desse tipo. Bom, então a gente falou aí dos de ir viajar e algumas coisas que às vezes eu reclamava mãe que pessoal, em alguns lugares tratavam a gente bem, os comerciantes principalmente, né? Mas a população em geral ficava reclamando muito, eu lembro que uma vez eu fui pra Ubatuba e peguei ônibus lá, né?
Quando eu não estava com a minha mãe e aí as pessoas reclamando, ah esse bando de triste, não sei o que, eu ia pensar, “poxa, mas turista é que movimenta o comércio, o que esse povo está reclamando”. E hoje em dia se eu moro em uma cidade turística eu percebo que realmente as vezes é bem cansativo. Época de temporada aqui Florianópolis é bem comum nas férias as pessoas virem pra cá, principalmente férias de verão, porque temos muitas praias, né? Aí que é linda, né? Tem muitos lugares bonitos.
Só que por exemplo, é bem comum acabar a água da cidade porque a gente não tem uma vazão que comporte a população a crescer tanto, né? O que a gente chama de população flutuante. Que a população que vem pra cá só pra turismo e depois vai embora. Então a infraestrutura da cidade não comporta. O trânsito fica uma loucura, um caos em vários lugares. Se a gente quer ir ao mercado, se a gente quer ir no shopping tem muita gente. Então é bem cansativo mesmo para quem mora. Aí a gente tem que parar e pensar por esse lado de que grande parte das coisas da cidade só funciona, só existem por causa do turismo. Só que no dia a dia é difícil mesmo.
Então eu acho interessante hoje em dia ter esse outro lado, mas em certo aspecto é em tem uma outra que é nas férias, por exemplo. Ano Novo, Natal, que é quando as pessoas tão vindo pra cá comemorando essa época aqui, é a época que eu tô saindo, né? Muita, hoje em dia eu vou visitar minha mãe. Então, eu já comprei, inclusive, a gente tá gravando em setembro, eu já comprei a minha passagem pro Natal pra ir pra lá e obviamente é mais barato sair da da ilha quando está todo mundo vindo pra cá e o oposto. Claro que as passagens da época ainda são mais caras do que em outras épocas. Mas são vários aspectos que eu não conhecia porque eu morava em São Paulo. Então pra mim não faz muito sentido.
Michael: Olha só vou comentar pra vocês que se por um dia qualquer dia desses você estiver passando pelo norte do Paraná você provavelmente vai encontrar uma cidadezinha bem no meio entre Maringá e Londrina chamada Arapongas caso você não saiba agora você sabe que isso é o nome de um par e absolutamente toda a rua dessa cidade tem nome de pássaros.