Introvertendo 40 – A Arte do Pink Floyd

Durante quase 50 anos de discografia, o Pink Floyd extrapolou as barreiras do rock psicodélico, se firmou como um dos maiores nomes do progressivo e deixou sua marca na história da música britânica e mundial. Nosso episódio destrincha a sua discografia, os melhores e piores álbuns, as tensões sobre seus integrantes e, também, curiosidades e atualidades sobre os integrantes ainda vivos.

Participam desse episódio Luca Nolasco e Tiago Abreu.

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Transcrição do episódio

Tiago: Olá pra você que escuta o podcast Introvertendo, essa plataforma que une pessoas que estão dentro autista para falar de coisas legais e também para falar de baboseiras. Meu nome é Tiago Abreu e estou aqui com vocês para falar de Pink Floyd.

Luca: Olá, meu nome é Luca e eu vou tentar não ser muito orelha nesse episódio.

Bloco geral de discussão

Tiago: Eu acho que a gente pode começar a falar de Pink Floyd e dando o resumão do que é a banda. Pra quem não conhece, é uma banda britânica que estreou se não me engano, no ano de 1965 e seguiu sua atividade mesmo fazendo turnês e shows até os anos 1990 e que foi conhecida especificamente pela participação de quatro integrantes, mas que já passaram cerca de 6 e o Luca vai falar mais ou menos um pouco sobre esses integrantes.

Luca: Dos que tiveram maior influência e são mais conhecidos por muita gente, tem obviamente o Roger Waters e o David Gilmour ambos tiveram seus atritos pessoais e diversos problemas, mas foram de imensa importância eu acho pra banda. Depois vamos falar mais sobre particularmente cada um, mas eles são pessoas bastante difíceis de entender porque despertam paixão entre muitos fãs e eu não sei exatamente se tomar o partido de cada um é muito correto.

Bom, além deles tem o tem o Richard Wright, ele foi uma pessoa muito quieta e que se absteve de participações assim mais públicas, mas ele foi uma pessoa que conseguiu manter a banda em pé por muito tempo porque ele era mais pacifico dali pelo menos quando tinham as brigas, porque o mais pacífico mesmo eu acredito que tinha sido o Nick Mason, que é basicamente equivalente a um cachorro calmo que você acaricia e ele te afaga de volta, sabe? (risos) Nunca teve problema com ninguém na banda e nunca teve nenhum problema fora.

Tiago: Eu acho que ele seria equivalente ao Ringo dos Beatles, né?

Luca: Exatamente, ele é o Ringo do Pink Floyd, ele nunca participou de nada muito polêmico e nunca se envolveu em brigas na banda e tá aí até hoje.

Tiago: Além de ter esses integrantes que foram os quatro mais populares, você teve o Syd Barrett, que foi o líder criativo do Pink Floyd nos primeiros anos, nós vamos falar um pouco sobre ele, mas ele saiu da banda logo após o primeiro disco. E também um cara que quase ninguém conhece, que é o Bob Klose, que depois virou um fotógrafo (risos). Será por que, né?

Luca: É exatamente.

Tiago: E e se a gente for falar, por exemplo, dos discos, é bom separar algumas fases. O Pink Floyd teve o seu momento mais psicodélico, teve um momento experimental que eles não sabiam exatamente onde iam chegar, até que em 1971 eles adquiriram uma sonoridade. Em 1973 eles se tornam sucesso mundial com Dark Side of the Moon, eles constroem uma sonoridade que pega muitos elementos do rock progressivo. E é partir desse alicerce que a banda constitui álbuns conceituais, muitos aspectos visuais. E é com algumas crises de formação que eles chegam em 1994 que com o penúltimo disco deles que foi o The Division Bell e a partir dessa turnê eles praticamente penduraram as chuteiras.

E no ano de 2014 saiu o último álbum da banda que é o The Endless River, que foi gravado na mesma época de Division Bell. Nós vamos falar sobre cada um desses discos no próximo bloco, mas antes eu quero saber do senhor Luca quais são suas músicas favoritas do Pink Floyd?

Luca: Cara, eu acredito que minha música favorita sem uma razão específica é Summer ‘68, com certeza o do álbum Atom Heart Mother. Acho que foi lançado inclusive em 1970. É uma música calma, que não representa nada do que a banda predominantemente é, só que ainda sim ela é uma música que me cativou por muito tempo. Não sei se se dá pra colocar um trecho da música, eu acho que só o comecinho de piano aqui é muito bom. E qual que seria a sua Tiago?

Tiago: De cabeça assim, pensando, eu acho que a minha música favorita do Pink Floyd ou é Us and Them do Dark Side of the Moon ou é Nobody Home do The Wall. São duas músicas que têm abordagens muito diferentes. Us and Them é uma música praticamente do Rick, né? Que é uma música que tem um um traço ali de jazz rock que é também uma variante que as pessoas chamam do rock progressivo, tem as letras irônicas do Roger enquanto Nobody Home é uma música mais depressiva e a base de piano. Na verdade, tudo do Pink Floyd que vai mais pro teclado e pros pianos é o que eu costumo gostar um pouco mais.

Luca: E é engraçado porque o que eu costumo gostar um pouco mais são as músicas de predominância criativa do Rick que só fui descobrir depois que eram dele, mas assim são as que eu tendo a gostar bastante.

Tiago: É, eu também sou Team Rick também, eu acho que ele é o integrante mais subestimado do Pink Floyd, inclusive uma vez eu falei isso num num post de um grupo do Facebook e falando que o Rick era o melhor integrante do Pink Floyd e aí o pessoal começou a brigar, falou assim: “você é louco? Você é doente?” (risos)

Luca: Mas não tava errado, assim (risos).

Tiago: Então assim, pra contextualizar o Pink Floyd, a banda vem daquele cenário que viria a constituir o rock psicodélico dos anos 60, também com toda a influência dos Beatles. E após tentativas de formação de de bandas, teve o Sigma 6 e projetos que uniram o Roger, o Rick e o Nick, que eram a base, digamos assim, eles acabaram conhecendo o Bob Klose e os quatro formaram a banda que se tornaria Pink Floyd, só que ainda sem o nome Pink Floyd. Até que eles conheceram o Syd Barrett, que veio substituir o Bob Klose

Luca: Os três, eles estudavam Arquitetura e conhecendo o Syd que estudava artes se não me engano, né? Então o Syd ele estudava artes e foi o líder criativo da banda nos primeiros anos. Com isso acho que com pouco tempo acho que menos de um ano até eles lançaram o Piper The Gates of Dawn, né?

Tiago: Eu acho que foi mais ou menos dois anos ainda, porque em 65 é mais ou menos essa época que o Syd se estabelece Além disso, nesse período, então eles tavam estabelecendo a sonoridade, você tinha outras bandas ali nesse cenário britânico que estavam se estabelecendo também com com muitas coisas por exemplo o The Who, que vinham dessa mesma geração e em 67 eles colocam isso a luz com o The Pipers. É engraçado que esse disco ele é gravado mais ou menos na mesma época que o Sgt. Peppers do dos Beatles que também é considerado um ícone do rock psicodélico que acabou influenciando muito.

E é engraçado muito que essa relação entre Pink Floyd e Beatles vocês vão ver a medida que a gente for falar, tem muitas coisas que ligam os integrantes das duas bandas com isso mesmo sendo Pink Floyd de uma geração muito posterior.

Luca: O Piper The Gates of Dawn não é nem de perto um dos meus álbuns favoritos, mas ele tem músicas interessantes. Porque não é exatamente o que o Pink Floyd ficou conhecido por ser, mas mostra muito o lado criativo do Syd que eu acho que por mais que eu não goste tanto mais hoje em dia é muito interessante de ver. Nesse período eles tiveram uma fama inesperada, não foi algo estrondoso, mas foi uma fama inesperada. Foram fazer vários shows em bares e shows pequenos assim, conseguiram até uma notoriedade bacana pela pelo Reino Unido, mas nada fora de lá no início, né?

Tiago: Todas as promessas de sucesso nos Estados Unidos que são sempre a aquela porta do estrelato internacional para bandas britânicas começou a se arriscado com a própria condição mental do Syd, que é um assunto assim gigantesco da gente discutir. Alguns dizem que ele teve esquizofrenia, alguns dizem que ele era autista…

Luca: E dizem que foi uma mistura muito ruim de drogas, não dá pra saber ao certo que foi.

Tiago: O que sabe é que ele usava muita LSD e durante as apresentações no palco ele se tornou muito errático e pior, dentro da condição criativa da banda, ele apresentava uma música e depois em seguida já tocava a música de uma forma totalmente diferente, ele não mantinha mais um padrão de constância. Pra eles lidarem com isso eles não sabiam como tratar uma situação tão complexa. E aí eles chamam um cara pra ajudar nessa situação, que era um cara chamado David Gilmour. E ele foi professor de guitarra do Syd e a banda vira um quinteto.

Pink Floyd ficou como um quinteto por alguns meses, mas isso acabou não dando muito certo, porque durante essas apresentações o Syd ele saia completamente de órbita, o Gilmour tentava entrar na linha ali, se juntando a ele pra querer fazer parte do show mas a coisa tava ficando muito insustentável. E eu acho que quando falam de esquizofrenia do Syd e aí é um ponto que eu acho muito controverso é que ele tinha uma consciência aparentemente muito clara de que ele tava sendo tirado da banda, que ele tava prestes a ser expulso da banda, tanto é que ele escreveu uma música que foi presente no disco seguinte que ainda tem a participação dele mais mínima que é a Jugband Blues.

Luca: Sim, a questão da consciência do Syd é muito complexa porque ele em diversos momentos apresentava plena consciência e de suas participações, seus deveres e em outros momentos apresentava completamente o contrário. Então apesar de ser insustentável a participação na banda eu achei que foi de certa forma uma atitude um pouco brusca e até agressiva da banda de tirar ele do nada. Até onde ali eu não vi que ele apresentou muito ressentimento com isso, mas ele com certeza pode ter acabado piorando um pouco a condição dele, que tudo que precisava seria um pouco de apoio e não ser tratado assim, eu acredito.

Tiago: Eu acho até que a banda se sentiu um pouco culpada nesse aspecto porque por exemplo, o Roger ele foi ele fez alguma coisa logo após que o Syd saiu e que organizou a questão da carreira solo dele, mas eu não lembro qual foi a participação efetiva que o Roger teve, mas eu lembro que o Roger participou e o Gilmour produziu o primeiro disco solo do do do e o Rick também gravou teclados e pianos pros discos. Então eles estavam ali envolvidos na carreira solo dele, mas quando o assunto era Pink Floyd eles seguiam.

E aí a própria saída do Syd deixou ele sem direção. Porque o cara que pensava as composições e tudo era o Syd e eles não tinham um grande compositor pra trabalhar nesse aspecto. Por exemplo, o primeiro disco do do Pink Floyd, eu acho que ele é quase todo escrito pelo Syd, tem algumas colaborações do Rick, mas o Rick é um compositor secundário, muita das vezes e o Roger, quando ele começa a compor, ele sempre compõe falando de uma forma negatividade a falar do pai dele. E isso pra crítica era inaceitável, a crítica não gostava quando o Roger falava das questões do pai dele, da segunda guerra e ele já começou isso desde o segundo disco que é um disco bastante difuso, né?

Que é Saucerful of Secrets. Esse disco inclusive ele é muito engraçado porque essa fase do Pink Floyd é uma fase que você não sabe se o vocalista principal do Pink Floyd é o Gilmour ou é o Rick. E é engraçado que esse é o primeiro disco e talvez o único da banda em que o Rick é o principal vocalista, porque ele é o compositor da maioria das faixas e as músicas dele ele canta sozinho, aquelas músicas mais tranquilas, que são músicas tão suaves e muito diferentes do espírito do Pink Floyd. E aí é muito engraçado porque os discos seguintes eram sempre eles tentando experimentar, eles fizeram Saucerful of Secrets que era simplesmente uma bagunça instrumental.

Luca: Saucerful of Secrets dá pra ver que a banda tava completamente sem rumo, que tem várias muitas músicas e cada uma parece que tá atirando pra um lado pra ver qual que dá mais certo. Porque no primeiro álbum todas as músicas são mais animadas e apresentam pelo menos um direcionamento criativo. No segundo álbum isso não existe mais e no terceiro parece que eles apontaram pra um lado, só que foi um lado bem estranho e que eles nunca mais voltaram depois, que foi um lado esquisito, tendendo ao psicodélico, só que de músicas enormes e sem muito nexo entre as músicas, eu não sei dizer. É um pouco desconfortável até escutar o Ummagumma.

Tiago: Eu acho muito engraçado porque a indústria musical era muito mais tolerante com esse tipo de artista nessa época. Uma banda com Pink Floyd, que é uma banda que devemos admitir, é uma banda muito inconstante em termos de discografia, não é a banda que tem aquela discografia perfeita que todo mundo costuma dizer, até alcançar o sucesso, de fato, que foi com o oitavo álbum, eles já teriam sido mortos hoje em dia artisticamente se eles tivessem falhado no segundo disco.

Então, eu acho muito interessante que a indústria musical era muito mais tolerante e talvez se ela fosse hoje em dia tão tolerante quanto era no passado talvez muitos artistas que hoje a gente demoniza muito cedo eles teriam oportunidade pra chegar a um ponto criativo a serem cultuados como os artistas antigos são. E esse saudosismo é uma desgraça também, no fim das contas.

Eu acho que o primeiro disco que dá indicações que o Pink Floyd poderia ter uma salvação digamos assim é o Atom Heart Mother, porque é o disco que você consegue ver muito bem a identidade de cada um, então você vê por exemplo o Roger com as suas canções depressivas, você tem o Gilmour com aquela coisa contemplativa da natureza e e o tom romântico que ele gosta muito mais de abordar e o Rick com aquela coisa melancolia, às vezes até da nostalgia. Então, acho que é o disco que você vê cada elemento do Pink Floyd chegando a uma direção e ele se encontrando consigo mesmos e como banda.

Luca: Eu acredito até que por serem menos músicas no Atom Heart Mother, o álbum conseguiu ser mais coeso, porque apesar de ter duas músicas enormes de vinte e muitos minutos você consegue ver a identidade de cada música e consegue ver que a música em si ela é muito bem construída. No Ummagumma parecia que eles fizeram o máximo de músicas possíveis também pra ver qual que dá certo. Já no Atom Heart Mother eles decidiram fazer poucas e fazer elas muito bem, o que eu achei que foi um direcionamento interessante.

Inclusive eu tava lembrando agora que se não me engano quem é o vocalista da minha música favorita desse álbum, que é desse álbum inclusive que é Summer 68 é o próprio Rick.

Tiago: Inclusive uma coisa que eu acho muito legal no Pink Floyd é isso. Você escreveu a música, você canta. Então além de você sentir o instrumento, a tensão sonora, você ouve também a voz daquele que escreveu. Inclusive o Nick é o único que não entra nessa relação, mas tudo que o Nick compôs pra banda geralmente é alguma coisa junto com os demais ou alguma coisa instrumental que vai entrar em algum ponto ou outro.

Então, o Pink Floyd clássico na minha impressão, ele começa no Meddle. O Meddle de 71 é o primeiro disco que você fala: “esse é o Pink Floyd que todo mundo conhece”, pelo menos popularmente. Porque é o disco que ele com aquela direção, a sonoridade tá fechada dentro daquele tom experimental um pouco prog. Esse disco eu gosto muito de One of a These Days, por causa de toda atenção a narrativa que a música constrói, então é um negócio muito legal também que o Pink Floyd consegue criar, de contar histórias nas músicas e eles usam essa habilidade um pouco tempo depois.

Luca: O Meddle não é exatamente um álbum que eu gosto, mas realmente mostra que eles acharam direcionamento e era isso que eles iam seguir depois. Tem poucas músicas também e eu não consigo gostar de todas, se muito eu gosto de duas nela, mas ainda assim é um álbum que eu acho bem construído, é um uma preferência pessoal minha não gostar, mas como álbum ele é muito bem construído eu acho.

Tiago: E esse disco tem digamos assim a faixa que dá definição pro Pink Floyd pro futuro que é Echoes. Ela começa exatamente por um piano do Rick, então você vê que de muitas das coisas mais geniais que o Pink Floyd fez, sempre começaram a partir de alguma coisa dele assim e com toda a construção melódica que vem do Gilmour, do Roger também. As pessoas também eu acho que elas tendem a olhar o Roger muito como cara das letras, mas o Roger tem uma contribuição musical muito significativa pro que o Pink Floyd se tornou.

E esse álbum dá a base pra eles começarem a trabalhar no Dark Side of the Moon e entre Dark Side of the Moon eles pararam a produção do disco e fizeram Obscured by Clouds, que é um dos meus discos que mais gosto. Ele não é um bom álbum, mas ele tem toda a sonoridade que o Pink Floyd ia terminar de desenvolver. Então é pra mim é um bom disco de bastidores, sabe?

Luca: O Obscured by Clouds eu adoro aquele álbum e eu sei que não é bom (risos). A maioria dos fãs do Pink Floyd não gostam nada dele, eles consideram talvez um dos piores, mas eu acho tão bom assim. Ele é muito melancólico pra mim, muito triste até, mas eu gosto demais dele. Não sei se foi exatamente por eu ter escutado muito em momentos ruins e ter marcado, mas eu acho extremamente bom, de verdade. E talvez é meu segundo álbum favorito, eu diria isso, sabe?

Tiago: Ah, eu também gosto pra caramba dele e ouvi ele também momentos horríveis. Então Burning Bridges, por exemplo, é uma música que eu gosto pra caramba e tanto instrumental dela, a Mudmen. Eu lembro que uma vez eu trabalhei durante duas semanas numa loja de TI até ser demitido dela, eu acho que agora eu contei até essa história em algum episódio do podcast. E aí uma vez ele pediram: “coloca uma música” aí e eu coloquei Burning Bridges. Aí o meu chefe chegou pra mim e falou assim: “nossa, que música de cemitério, coloca uma coisa mais alegre”. Aí, o meu colega de trabalho falou, não colocar outra coisa aqui, ele deve ter colocado, sei lá, alguma coisa sertaneja, sabe? Porque era o que eu tava gostando de ouvir e aí eu coloquei Burning Bridges durante o horário de trabalho (risos).

Luca: Acontecia algo exatamente quase a mesma coisa comigo, eu estava escutando música no fone de ouvido na escola. Aí uma colega minha muito alegre, chegou tanto pegou meu fone, foi escutar e era, cara, deixa eu lembrar qual que era. Era desse álbum. Era Childhood ‘s End, que é muito depressivo também. A letra, eu acho bem, né, sabe? E ela me olhou com a cara muito estranha (risos).

Tiago: Inclusive essa canção que você citou foi a última música escrita pelo Gilmour sozinho pelo Pink Floyd durante muitos e muitos anos. Porque a colaboração dos créditos do Dark Side of the Moon já criaram um padrão que Pink Floyd repetiria durante muitos anos que é letras do Roger, sonoridade Roger, Nick, Gilmour. E então, por exemplo, o porque Dark Side of the Moon é tão importante, muita gente não entende. O primeiro disco que eu ouvi do Pink Floyd foi Dark Side of the Moon e eu achei o disco um saco.

Mas primeiro, quando você não entende a questão linguística, a questão da língua do inglês e você não relaciona com a questão dos efeitos, do contexto histórico, então o disco foi gravado na Abbey Road, ele tem algumas técnicas de gravação muito avançadas pro período, experimentações que só artistas grandes como os Beatles faziam um pouco tempo antes e temas universais como a questão da morte, como a questão da relação social, o nós entre eles, que é, por exemplo, o que vem Us and Them, a questão da loucura, né, que é um tema que eles também pegaram muito do Syd e isso repercute em muitos álbuns.

Então, ele é um disco muito fechado, muito correto em si mesmo, sem falar que o trabalho melódico do disco, então ele é um disco muito correto, talvez ele não seja o disco mais recomendado para um ouvinte casual conhecer Pink Floyd, mas ele é o disco mais perfeccionista da banda e bem estruturado.

Luca: Eu só não considero um disco perfeito porque a música Money não se encaixa com as outras. Parece que todas as músicas tem um direcionamento e a Money foge dele. Aí o álbum fica um pouco desencaixado por causa disso. Mas toda produção foi muito bem feita, toda criação e a sonoridade muito bem feita. Eu acho que é o álbum mais representativo do que é o Pink Floyd com certeza é ele. E assim, dos álbuns do Pink Floyd também consideram mais bem feito, apesar de ter essa música que eu não consigo suportar ela.

Tiago: É engraçado porque tem muitas histórias sobre a gravação desse álbum. Se nós formos contar aqui detalhadamente dá um episódio inteiro, mas uma das histórias que eu acho mais interessantes é que eles durante as sessões de gravação, eles gravavam entrevistas com pessoas que estavam próximas de executivos, de gente da limpeza e tudo mais, perguntando coisas fundamentais da vida pra usar em algum ponto do álbum.

Até o momento que eles se encontraram com Paul McCartney e aí eles fizeram umas perguntas sobre morte, o Paul McCartney ficou assim tipo que porra é essa, sabe? E eles decidiram não usar porque a voz do Paul McCartney é muito característico, então as pessoas iam ouvir e identificar que era o Paul McCartney respondendo, eles queriam como se fossem pessoas comuns. E aí eles acabaram só conversando com o Denny Laine, eu acho que é o nome dele, que era o guitarrista do Wings, que era a banda que o Paul tinha formado com a esposa dele.

E o álbum é cheio desses easter eggs assim de certa forma. E Dark Side of the Moon se tornou um disco tão vendido, mas tão vendido, que na indústria musical não tinha vinil suficiente para produzir. Então pegavam outros discos que falharam em vendas, destruíram eles e gravavam Dark Side por cima pra vender. Então, levando assim, absurdo de se pensar, né, que a indústria inteira tinha que se mover pra produzir um disco de um artista só.

Luca: É, e esse talvez foi o álbum que projetou a banda pro mundo inteiro. Porque antes, por mais que tivesse uma repercussão, às vezes nos Estados Unidos ou em outros lugares, ainda era aquela banda britânica que ficava mais lá e depois disso explodiu, todo mundo conheceu a banda. Gente no Brasil conheceu gente e gente no mundo conheceu.

Tiago: Eu acho que isso inclusive criou aquele grande problema da banda que se refletiu no disco seguinte, o Wish You Were Here. Porque eles viram que o sucesso ficou tão grande que eles se sentiram engolidos por aquilo, pelas pressões da indústria e tudo mais. E aí eles decidiram fazer um disco que refletisse isso, que refletisse essa angústia e que refletisse também a questão do segmento tanto da loucura quanto da indústria musical que eles consideravam doentio. E aí que eu acho que a participação do Roger começa a ficar predominante porque toda aquela questão que era muito mais focada na ambientação, na observação sonora, ela fica presa mais no discurso.

Então, o Roger como um excelente letrista, ele começa a ganhar protagonismo e poder na banda, ele começa a cantar mais, né? O Dark Side é um disco que o Gilmours canta muito mais e tem uma participação significativa do Rick como intérprete. O Wish You Were Here é o primeiro disco que o Rick não canta como vocalista. Então aí que você percebe uma das mudanças. E tem uma questão muito curiosa que acontece nas gravações desse disco que é o Syd aparece no meio desse processo.

Luca: Esse álbum eu acho que ele representa o momento de ápice da culpa que eles sentiram pelo tratamento que deram pro Syd, porque as letras representam pelo menos em parte um pouco da loucura do Syd, do como que ele foi engolido pela indústria, até o Welcome to the Machine, as teorias são de que era uma música que representava como que o Syd foi tratado pelos executivos na indústria.

E pra fechar tudo isso, o Syd ele apareceu no meio das gravações, acho que cinco anos depois de ter desaparecido pra eles e terem perdido o contato e completamente diferente. Ele apareceu no meio da mixagem da do Shine On You Crazy Diamond já obeso, careca, totalmente diferente e com sobrancelhas raspadas e falando coisas que não tinham exatamente um nexo, visivelmente diferente da pessoa que eles conheciam antes. E acho que isso impactou muito eles. O Syd logo depois já saiu e eles não tiveram contato por muito tempo de novo. Mas teve muito impacto. E há a teoria de que até a música Shine One You Crazy Diamond tem esse nome em homenagem ao Syd, porque se você pegar as iniciais é SYD. É um álbum quase reflexivo, muito interessante de se ouvir. E quando você tem esse contexto, ele passa a ser muito mais depressivo do que parece.

Tiago: E esse álbum, além de tudo, foi uma pressão criativa, porque antes deles trabalharem esse disco tradicional, eles iniciaram um projeto que era chamado se não me engano Houseland Objects e que era o objetivo fazerem músicas por objetos. Então, a partir dessas experimentações, eles não conseguiram chegar em nenhuma música, eles conseguiram chegar em Shine On You Crazy, que é uma música grandiosa. Só que você percebe nesse disco que o próprio Nick, por exemplo, ele começou a ficar muito isolado com relação a banda. Ele não tava com capacidade de produzir porque tinha acabado de entrar no processo de divórcio.

O Roger, se não me engano, logo após também ele entraria num processo de divórcio do primeiro relacionamento dele, o Gilmour em seguida ele já teria o primeiro filho, a primeira filha, eu não lembro exatamente e o Rick pelo menos até aquele período ele é o que tava mais estável, ele já era casado a muito tempo e ele tinha os primeiros filhos. E aí esse cenário deles de manter o sucesso, de ter uma vida pessoal que já tava começando a interferir, ela se reflete no disco seguinte e no próprio contexto que vivia a sociedade britânica daquele momento, que vem movimento punk. E o movimento sacode tudo, né? E quando a gente falou, por exemplo, do episódio sobre o Queen teve quase uma porrada trocada entre o Freddie e o Sid Vicious na gravação do News Of The World.

E o Johnny Rotten, que é o vocalista do Sex Pistols, que inclusive ficou conversando sobre música com Brian May nessas gravações enquanto trocavam porradas, ele andava com uma camiseta escrito acho que “eu odeio o Pink Floyd” e eram os olhos dos integrantes cortados. E assim, como a forma de fazer polêmica também. E aí anos depois o próprio Johnny falava assim: “não, quem é o idiota que odeia Pink Floyd, eu tava fazendo aquilo pra provocar”. Essa ânsia de responder o movimento punk na altura fez o Roger também escrever sozinho e assumir um controle muito maior e os outros integrantes ficarem numa posição de segundo plano o álbum Animals. Que é um disco quase sei lá 70% Roger e 30% Gilmour, porque Gilmour escreve Dogs, Dogs ocupa quase um lado do LP, mas é uma canção que ele dividiu ainda créditos com Roger porque o Roger alterou várias coisas na música, que é uma música que ele começou lá na época o disco anterior.

Luca: No contexto da época, o Reino Unido vivia uma espécie de crise social onde os jovens se viam sem exatamente um futuro garantido e se revoltaram com isso. Então o movimento punk ganhou força por conta disso, de algumas outras coisas e representava toda essa ânsia e toda a raiva que os jovens sentiam. Já o movimento progressivo era contrastante movimento progressivo representava uma classe mais uma classe média alta, de músicas de inspiração clássica, músicas longas e contemplativas, tudo isso era o oposto do movimento punk. Então, gerou bastante tensão mesmo nesse momento não só dos ouvintes como dos compositores, como você mesmo disse.

E o álbum Animals como muita gente já sabe ou já ouviu falar, tira um monte de inspiração do livro Revolução dos Bichos, do George Orwell, continua sendo um alvo bem contemplativo só que com críticas muito mais presentes, o que acho que já colocou uma marca que vai ficar pra frente da maioria dos álbuns do Pink Floyd que é críticas sociais. Acho que é uma marca do Roger Waters na banda e que por mais que eu não goste de muitas músicas do álbum, é uma marca que eu acho muito boa. Inclusive minha música favorita do álbum é Dogs, acho que a única música do álbum que eu gosto (risos).

Tiago: Acho muito engraçado com a própria repercussão que a crítica contemporânea tinha com os álbuns do Pink Floyd. Quando o Wish You Were Here foi lançado, ele dividiu um pouco opiniões porque, por exemplo, uma crítica que eu acho muito interessante da época era Rolling Stone falando que eles não sabiam se o álbum era bom ou era ruim, era uma coisa era um tom pesado, né? E esse tom pesado foi se foi se petrificando o Animals. É um disco inclusive pros álbuns clássicos do Floyd que a gente pegava 71 cê tirando o álbum de setenta e um mas a partir do Dark Side em seguida, muitos consideram como álbum mais fraco da banda em comparação a tanto a Dark Side, o The Wall que vem em seguida e tudo mais.

E esse álbum eu acho que ele criou uma cobrança e pessoal especialmente ao Rick em produzir algo. Então, logo após esse disco, o que que ele fez? Ele foi produzir um disco solo pra ver se ele conseguia resgatar a energia criativa. Ele produziu o Wet Dream que é um álbum que eu sou apaixonado, o Gilmour vai lá e faz um disco solo também, mas Pink Floyd cheio de problemas de dívidas e tudo mais, o Animals se não me engano ele foi gravado num estúdio que a banda tinha construído pra pra gravar seus próprios discos, você vê que tem até uma questão sonora muito diferente da limpeza dos discos anteriores, ele é um negócio mais rústico.

Mas assim, o Pink Floyd naquele período, mesmo estando no estrelato, tava gastando muito dinheiro com turnês. E a própria turnê do Animals foi um negócio bem pesado porque o Roger cuspiu na cara de um fã porque eles estavam não aguentando mais aquela coisa dos grandes estádios. Parece que toda banda quando daquele período quando chega ao momento assim de altura e de grandes shows eles se cansam porque eles se sentem alienados. Isso não é uma coisa específica do Roger, por exemplo, os Beatles pararam de fazer shows ao vivo porque eles falaram que tava impossível. O Queen, como a gente já falou nos outros episódios, chegou o momento em que eles estavam cansados de turnês. Só que o Pink Floyd cansou-se muito rápido e era considerada uma banda muito estranha pra época. Eles faziam seis shows e paravam completamente.

Então isso criava umas dívidas muito grandes. E o próprio o próprio Reino Unido tava muito caro em termos de impostos logo após o Animals. E aí eles viram que eles precisavam capitalizar o dinheiro, eles começaram a investir em algumas coisas, investir em pizzaria, investir coisas pra ver se o dinheiro rendia e eles decidiram gravaram o disco seguinte fora do Reino Unido, gravar na França. Essa era a tendência que a indústria musical inteira tava tendo de gravar discos fora do Reino Unido, que era um estúdio chamado Super Bear Studios, que depois foi virar o estúdio do Queen, eles compraram esse estúdio, que foi onde eles gravaram o Jazz e o Pink Floyd foi gravar o The Wall nesse período.

Na época de gravar o The Wall, o Roger já chegou com o conceito pronto, ele escreveu dois discos, um deles foi aproveitado pra carreira solo dele, que foi o…

Luca: The Pros and Cons of Hitch Hiking.

Tiago: Eu amo quando o Luca menciona os álbuns e coisas pra mim porque meu inglês é um lixo, mas enfim. O outro disco, a ideia era o The Wall, que era uma ópera rock, um negócio superambicioso, mas a ideia do Rick era que ele tivesse colaboração e composição, instrumentação e tudo mais. E uma coisa que o Rick tava incomodado com relação a banda era que como o Roger tava começando a dominar muito mais, aquela ideia de que os álbuns eram produzidos pelo Pink Floyd e quando falavam produzidos pelo menos pelo Roger, Gilmour e Rick, tavam sendo produzidos por Roger Waters e David Gilmour. Então ele queria se impor, mas o Rick tava deprimido porque ele tinha acabado de se mudar pra Grécia com a família se não me engano, os filhos dele estavam começando a crescer e ele não tava conseguindo acompanhar a vida deles, tava começando a ficar deprimido, com crises no casamento. Inclusive o Wet Dream tem duas músicas muito referentes a isso quanto a relação dele interpessoal. E nesse disco ele não tava conseguindo produzir e o Roger colocando pressão.

E aí chegou o momento, diz a história de que o Gilmour foi tentar conversar com Rick pra acelerar o processo porque a banda estava endividada aquelas ideias de investir em pizzaria, etc, tudo furou, então a banda ficou muito pior financeiramente. Então o Roger falou que tinha que produzir e lançar o disco até tal data porque se não estavam ferrados, o Rick não conseguia acompanhar e o Roger tava ficando furioso.

E aí o Gilmour foi conversar com ele e aí o próprio Rick eu acho que tava irritado também, eu diz a história que um dia o Roger chegou lá e demitiu o Rick e ninguém fez porcaria nenhuma, até porque demitiram o Syd, né? Você vê que compaixão na banda não existia mesmo, em nenhum aspecto. E aí o Rick ficou revoltado e falou, não, mas eu quero terminar de disco e aí o Gilmour falou, não, então você grava, você grava como músico contratado e aí ele recebeu pra gravar os discos e também para participar da turnê do disco. E chamaram mais dois tecladistas pra tocar, um deles era o Peter Wood e outro era o Fred Mendel, depois foi gravar dois discos com Queen, que eu tinha falado, que ele participou, então essas bandas sempre tem uma relação uma com a outra no fim das contas.

E aí eles começaram a trabalhar no disco que é praticamente cem por cento, quase cem por cento Roger, inclusive tem uma implicância maior ainda do Roger com o Rick que eu acho nesse disco, porque quando o Rick foi trabalhar em Wet Dream ele não mostrou aquelas músicas pra ninguém. E quando o disco foi lançado, o Roger ouviu e falou assim, caramba, tem um monte de coisa aí que dava pra usar pra banda, por que que você foi gravar isso em carreira solo? Cê é doido, sabe? Então, acho que ele ficou com muita irritação também pelo fato de que o pouco que o Rick tava produzindo e que ainda era muito bom, acabou saindo em carreira solo. E ele ainda pegou umas duas ou três músicas do Gilmour do que iam sair no disco solo dele que era o David Gilmour e acabou aproveitando, mudou algumas letras e acabou se tornando três músicas se não me engano desse álbum que é…

Luca: Comfortably Numb.

Tiago: Young Lust, e inclusive essas músicas que são composições do Gilmour nesse álbum, elas são muito diferentes. Ela são as mais diferentes do álbum, assim, em termos de textura e tudo mais e as músicas do Roger tem um sentido. O Roger não é um bom vocalista, né? Então, assim, ele tem muita personalidade ao cantar, mas eu não gosto da voz dele. Então, The Wall é pra mim é um dos melhores discos do Pink Floyd, mas é quase que um semi disco solo do Roger. Ele não é um discurso solo do Roger porque tem muita coisa do Pink Floyd e tudo mais porque Pink Floyd é Roger também, né? Mas tem esse peso assim muito maior dele.

Luca: Esse álbum realmente foi o álbum que instaurou toda a instabilidade na banda. Toda instabilidade, brigas que você vê depois, começaram ali. Eu acho que foi realmente muito necessária a participação dos outros integrantes da banda neste álbum, porque senão seria mais um Pros and Cons of Hitch Hiking que por mais que seja um álbum conceitual e tudo mais, não é exatamente o álbum muito bom. O The Wall é um álbum muito bom, eu não gosto da maioria das músicas, mas é um álbum muito bom. Só que eu acredito que só é por conta dos outros participantes.

Eu acho que o processo depressivo do Rick começou a se intensificar demais nessa fase nunca melhorou depois disso. Não sei exatamente se pela arrogância ou pela necessidade, mas por grande culpa do Roger que a própria banda era o sonho dele, começou a se esfacelar depois.

Tiago: Eu sou suspeito pra falar do The Wall porque o The Wall foi o disco me fez gostar muito de Pink Floyd. Eu já tinha ouvido outros álbuns, mas nunca tinha me apegado. E ele forneceu assim uma coisa porque ele tem as letras, tem as críticas sociais, ele é um álbum atmosférico e você ouve, você se sente imersivo ali, por mais que ele seja o álbum mais básico, instrumentalmente. Ele é um disco que te faz sentir muito a atenção da banda, então ele é um algo muito forte emocionalmente. Porque tem bandas que fazem discos durante crises que eles saem um monte de merda porque basicamente eles não conseguem traduzir aquilo, os seus sentimentos numa questão pra frente, entendeu? E The Wall parece que é um disco que ele ele pega toda aquela carga negativa e potencializa na força do som, na força das letras, nos sentimentos.

Mas é um disco difícil, difícil até na própria questão das turnês, porque por exemplo uma que teve muito grande entre a banda que a banda tava endividada, The Wall é um álbum duplo que é muito mais difícil de ser vendido apesar do sucesso do single…

Luca: Another Brick in the Wall, Pt. 2.

Tiago: Esse single que inclusive tem uma mudança ali do Bob Erzin que era o produtor que ele falou em aplicar um estilo dance nessa música que era uma uma coisa que o Roger por exemplo era contra e que soou a música muito melhor, né? Acabou dando um impacto muito diferente. Então é um disco que se dava muito bem comercialmente em termos de venda, foi um disco muito vendido, acho que foi o segundo mais vendido da história do Pink Floyd, mas ao mesmo tempo a turnê era muito cara e o Roger se recusou a fazer show em estádio. Inclusive teve uma oferta milionária que o Pink Floyd recebeu pra fazer uma apresentação nos Estados Unidos, se não me engano nessa época que ia sanar todas as dívidas da banda e ele recusou antes mesmo de falar com os integrantes. E aí isso deixou o Gilmour e o Nick muito irritados.

E tem mais uma coisa sobre as turnês, né? As turnês eram muito caras, o equipamento era caro porque eles tinham que fazer o negócio com isopor, então gastava muita coisa e além de tudo o Rick ele recebia com o músico contratado pra tocar e o Rick fez performances perfeitas nesse disco porque a esperança dele era ele ser o cara mais eficiente durante a turnê pra ele ter readmitido de volta na banda, coisa que não aconteceu. Isso deve ter frustrado ele muito. Então a turnê de The Wall foi muito graça, né? Inclusive o Roger ele ia para um camarim separado enquanto os outros integrantes iam pra outro, né? Então ele se tornou a estrela da banda e essa alienação que ele sentia com relação ao público, ironicamente se voltou pra própria banda também, então ele tava alienado de todos.

Luca: É, foi um álbum fracassado no que eles queriam que era recuperar o dinheiro (risos), mas foi um álbum muito bem sucedido na questão de de ser conceitual e de trazer fãs. Eu acho que se você tiver dificuldade em visualizar o que o álbum representa ou as músicas representam, talvez compense bastante assistir o filme The Wall, porque ele mastiga e digere pra você bastante dessa representação e transforma em imagem que pra muita gente pode ajudar. Pra mim ajudou inclusive. Eu achava insuportável o álbum. Então, talvez fique a indicação de assistir o filme The Wall.

Tiago: Inclusive, sobre a questão do filme, eu acho que o The Wall ele tem uma força maior como obra artística no cenário do rock no geral, justamente por ele fornecer experiência visual, que era uma coisa muito pouco comum no cenário musical da época. Então você produziu o álbum, você produziu uma turnê que era toda baseada naquele estilo visual e você tinha o filme que acompanhava aquilo. Então, o que o Roger compôs não foi só músicas, foi uma história que acompanhava também imagem que é basicamente o que a música é hoje. A música uma experiência só de áudio, é uma experiência visual, o artista lança o álbum e lança os clipes já tudo de uma vez, as lives, então nem uma música hoje não é acompanhada por vídeo e o Pink Floyd foi meio que nessa direção muito antes.

Luca: É, o Pink Floyd ele derivou e até eu diria que melhorou um conceito iniciado pelos Beatles com o Yellow Submarine. O Pink Floyd pegou esse conceito já um pouco até antigo deles que viu que não tinha sido aperfeiçoado pois ninguém foi lá e fez algo melhor que por sua vez foi um desastre monetário, mas foi muito bem produzido, muito bem feito.

Tiago: E aí o Rick foi demitido, o Rick volta pra vida dele e ele sofre um processo de divórcio. Então ele ficou sem a esposa, sem os filhos e, no fim das contas, ele não conseguiu se realocar musicalmente. Então, eu vou só fazer um parêntese com relação aos projetos do Rick. Ele fez um disco horrível chamado Identity que era de um projeto musical chamado Zee, que era ele com mais um cantor chamado David Harris, que era um baixista também e eles gravaram um disco juntos de New wave, mas aquela coisa que você fala tá o que que o Rick tá fazendo nisso aí?

E fora disso o Pink Floyd ia se juntar para gravar mais um disco. E aí o Roger já chegou com o conceito pronto só que o Roger o que que ele fez? Ele fez uma versão derivada de The Wall, ele pegou todas as consequências de The Wall e fez um disco em seguida que eu gosto das letras, mas é um disco que você percebe 100%: esse disco é um disco só do Roger. Ele escreve todas as músicas, os solos do Gilmour são muito bons nesse álbum. Eu acho que tirando esse álbum, o Animals é o que tem os melhores solos do Gilmour, mas o o acho que o Gilmour conseguiu colocar toda a garra dele no solo de guitarra.

E em substituição aquela sonoridade dos órgãos Farfisa do Rick, toda aquela coisa que que era muito presente nos anos 70, 80, até a versatilidade foi substituído por um piano frio e dramático do Michael Kamen, que é um cara que é muito de orquestra né? Ele fez alguns arranjos de orquestras mais legais. Ele se não me engano trabalhou com o Paul McCartney, trabalhou com Queen no A Kind of Magic, Who Wants to Live Forever é o mesmo arranjo também é do Michael Kamen. Então toda aquela coisa daquele tom de piano mais frio foi o que ficou com o Final Cut. E Final Cut é o disco basicamente é como se fosse a lápide do pai do Roger né? Então ele personalizou ao máximo a partir desse momento da carreira.

Luca: Final Cut ele demonstra uma coisa que o Roger tem muita, talvez facilidade ou até dificuldade que é ele ter muita dificuldade de escrever algo que não seja quase autobiográfico. A maioria das músicas dele são referentes a ele ou ao pai dele ou tangenciam a história, o que eu que deu pra ter incomodado demais o David Gilmour, que percebeu que a banda tava se tornando a história autobiográfica do Roger.

E acho que depois de ter tido todo o problema que teve com o Rick e ver que a banda tava se tornando basicamente um projeto solo do Roger, isso gerou muita instabilidade, briga e os dois até entrar numa briga judicial para saber quem teria os direitos de uso. O Roger processou e tudo mais. No final o Roger perdeu, se não me engano perdeu. Ah então você completa.

Tiago: É o seguinte, vamos voltar um pouco antes. Em 1982, antes deles lançarem o próprio Final Cut, a imprensa, se não me engano a Rolling Stone, chegou a perguntar pro Roger qual era a direção que ele queria tomar. Não sei se foi antes ou foi logo depois de lançar o Final Cut. Só pra lembrar, Final Cut foi um desastre comercial. A banda já tava muito endividada, ficou endividada mais ainda porque eles só venderam três milhões de cópias. Roger não quis fazer turnê daquele disco e a banda ficou parada ali sem fazer nada.

A Rolling Stone, eu acho, se não me engano, perguntou pro Roger quais eram os próximos projetos. Ah eu vou tocar com um tecladista e mais um baterista. Então assim, na ideia dele iria seguir solo, o Gilmour seria o guitarrista do projeto solo dele (risos). Só pra você ter ideia do início da megalomania. Eu gosto muito do trabalho do Roger, mas aí não vamos passar pano pra ele. Ele se tornou o cara mais babaca possível a partir desse ponto, porque ele praticamente levou os outros a se tornarem um projeto solo dele.

Em 84, o Gilmour fez também toda a resignação dele para produzir o About Face que é o segundo disco solo dele, que é basicamente um disco que ele fala o tempo inteiro quanto que ele considerava o Roger um amigo e que agora o Roger é um traidor (risos). Inclusive é o melhor disco da carreira solo do Gilmour na minha opinião, porque ele o disco que ele não tenta ser o guitarrista do Pink Floyd e sim um artista solo de fato e algumas músicas podem até ter sido aproveitadas pelo Pink Floyd, mas muitas músicas ali foram rejeitadas.

Chegou no ano de 1985 e o Gilmour falou em gravar um disco do Pink Floyd. O Roger falou assim, não, não vou gravar. Pink Floyd é uma força criativa gasta, foi mais foi isso que ele disse que se não me engano pra imprensa. Ele falou e e eu não vou gravar e vocês vão gravar porra nenhuma também. Ele entrou na justiça para pegar o nome Pink Floyd e não permitir com que eles gravassem. Então, ele saiu da banda e falou: “não, eu saio, mas vocês também não vão seguir com o grupo”.

E aí ele entrou na justiça e ele ganhou em partes, ele ganhou de direito sobre as composições dele em The Wall e o Final Cut. Então são direitos do Roger, não do Pink Floyd. Qual era a tensão do Gilmour perder isso na justiça, né? Porque o Gilmour correu atrás porque o Nick já tava ligando o foda-se, o Nick tava cansado, ele até lançou um disco solo em 1985 com vários músicos, aquela coisa meio sabe?

E aí durante esse período a preocupação era não ser integrante da formação original. E aí o Nick aceitou entrar nessa briga e aí dois integrantes do Pink Floyd contra um, os dois ganharam a maioria do material. Mas aí o Nick tava desestimulado a gravar, ele tava totalmente fora de forma, o Gilmour era o único que tava em forma mas ele sozinho ia fazer o que? E o Rick tava perdido por aí, então era muito difícil.

Luca: O Rick tava sem família porque tinha sofrido divórcio. Tava sem amigos porque não teve mais a banda e em um processo muito sério de depressão, ele sofreu muito com isso. Então assim era uma banda basicamente acabada. Querendo o Gilmour ou não, a banda tava quase morta ali. No final o Roger tava quase certo né? Mas ainda assim eles tentaram e foi nesse cenário, no meio de todas as brigas judiciais, que eles começaram a produzir o Momentary Lapse of Reason, que é o meu nome preferido é esse, que é um nome muito bom e é considerado um dos piores álbuns do Pink Floyd.

Ele tem músicas não tão bem produzidas e parece até um pouco solto, mas eu gosto de uma música muito específica que eu acho que a maioria das pessoas acaba gostando que é uma pérola achada no meio daquele álbum ruim que é Learning to Fly. Mas aí o Tiago pode falar mais sobre ele.

Tiago: É muito interessante as sessões criativas desse álbum porque o Roger, ele basicamente zombou da banda dizendo que eles não iam conseguir fazer um disco sem ele, começou por aí. E o Gilmour começou a ir atrás do Rick pra pra ver se conseguia trazer ele de volta. Só que assim o Rick ele só voltou de fato no final desse disco então o Rick quase não teve participação nesse álbum. E aí o Rick tava começando um namoro que não sei se exatamente ele acabou se casando com essa mulher com que ele namorava na época. E aí os dois começaram a visitar o espaço de gravação desse disco.

O Nick ele precisou se não me engano voltou a fazer exercícios porque ele tava ele já tinha parado de tocar e tudo mais. O Gilmour começou a compor as músicas do disco mas ele começou a ter uma dificuldade muito grande pra escrever letras. E ele pensou: “não, eu não dou conta de escrever realmente o disco do Pink Floyd sem o Roger. Ele chegou a cogitar isso, isso tá escrito nas biografias, né?

Então ele chamou compositores externos pra escrever letras. O Bob Ezrin, que tinha produzido The Wall aceitou produzir e trabalhar na produção desse disco, inclusive o Roger ficou muito chateado porque o Roger trabalhava com ele aí o Roger se negou a trabalhar com ele depois que ele também começou a trabalhar com o Pink Floyd. E tinha umas tretas assim. Tinha um show do Pink Floyd numa cidade aí na semana seguinte era o Roger aí eu sei que o show do Pink Floyd lotava e o do Roger era vazio. Então ele teve essas tretinhas também de início e o Roger acusava que a banda tava sabotando ele, um monte de coisa assim.

A única música que tem a participação do Rick nesse disco é On the Turning Away, que é uma música que também tem um pouco mais de elementos do Pink Floyd do que todas outras músicas, por exemplo, é uma música muito boa mesmo, a melhor do disco, mas não tem nada a ver com Pink Floyd. Esse disco é um disco solo do Gilmour com a assinatura do Pink Floyd. Inclusive eu diria que o About Face com a assinatura do Pink Floyd seria um disco melhor do Pink Floyd do que o Momentary porque o Momentary é triste. Se você discorda, se você acha que esse álbum é bom, é só você se lembrar que esse disco tem uma coisa chamada A New Machine, que é a pior coisa que o Pink Floyd já pode ter feito.

Luca: Eu senti uma dor física, quando eu lembrei de New Machine (risos). É muito ruim (risos), não tem descrição. On the Turning Away é uma música que tem os aspectos melancólicos que o Rick carregava, mas nem a ajuda do Rick para produzir músicas fez um uma salvação neste álbum, não ajudou.

Tiago: E sobre a turnê desse álbum, porque a turnê desse álbum foi a melhor coisa acontecer pro Pink Floyd. Foi uma das turnês mais lucrativas da história da música até aquele período. A turnê ajudou a banda a quitar todas suas dívidas. Então o Gilmour teve o compromisso de reestruturar. O Gilmour nessa época inclusive ele trabalhou muito paralelamente com outros artistas, ele gravou uma música com Paul McCartney e ele aparecia direto em todos os lugares, sabe? Gravou um um projeto lá pro pro Rock Aid Armenia, que era um projeto que se juntou todo mundo pra cantar uma música do Deep Purple e ele tocou guitarra nessa música. Ele apareceu lá nas festas de aniversário do Freddie Mercury lá posando fotos com ele nos últimos anos de vida.

Luca: O Gilmour também era muito próximo do David Bowie, inclusive anos depois, muito tempo depois, acho que quase uns 6 anos, o Bowie fez um projeto junto com o Pink Floyd. Mas isso é de falar depois.

Tiago: E aí é muito engraçado que ele tinha essa visão assim até digamos assim se a gente for usar um termo bem Roger Waters, um mercenário sabe? Então assim ele tinha visão comercial. Eles fizeram inclusive um show numa cidade não sei se foi na Holanda que teve um sério problema com relação a água, questão flutuante de água, foi 1989, se não me engano alguma coisa assim que causou problemas ambientais no negócio de tanto que a estrutura do show do Pink Floyd tava muito grandiosa. Mas aí eles chegaram da década de noventa com crítica da crítica, porque a crítica odiou esse disco, o Roger inclusive fez um comentário irônico sobre esse disco, ele disse que pelo menos a capa era bonita (risos).

Luca: Ele não tava errado, a capa realmente é muito bonita.

Tiago: O problema é que só a capa, né? (risos). E aí eles ficaram um tempo também sem gravar por um por um período e aí se não me engano no ano de 1993 eles decidiram gravar mais um disco e aí o o Gilmour continuou com aquele problema de não ser um cara que escreve letras. E aí nessa época ele começa a namorar a Polly Samson, que se tornou a esposa dele e ela acabou escrevendo muitas das letras pra ele do álbum seguinte que era o Division Bell.

Inclusive tem uma coisa sobre tretas sobre a gravação desse disco porque o Rick escreveu várias músicas desse álbum, mas a forma como eles tinham para selecionar as músicas era uma forma digamos assim meio democrática que cada um dava notas pras suas pras músicas pra ver que aquelas mais bem votadas entravam pro álbum. Não tinha um conceito a ser trabalhado. Acontece que o Rick ele dava nota máxima pra todas as músicas dele e ele acusava o Gilmour de dar nota máxima a todas as músicas dele. E aí no final das contas só teve uma composição majoritária do Rick nesse disco. Então assim, é um disco que tem muita coisa do Rick na instrumentação, mas mesmo assim só tem uma música que é a composição dele que é Wearing the Inside Out.

É um disco que perde muito nesse aspecto. Então a ideia do conceito do álbum é um álbum sobre comunicação e é um disco também para lavar roupa suja sobre o Roger, né? Porque pra isso que eles acabaram servindo. E é nesse aspecto que eu acho que tanto o Gilmour quanto o Roger foram muito sacanas porque assim o Gilmour menos. Mas assim, os dois continuaram nessa guerra de egos e destroçando o colega deles de banda que estava ali tentando produzir e que não tava bem. A diferença é que Gilmour manteve o Rick junto com ele durante o resto da carreira, não abandonou ele. Já o Roger, né, demitiu.

Luca: Isso eu acredito que afetava muito mais o Rick do que, porque o Nick ele simplesmente fala OK eu desisto, foda-se o Rick ele ficava mal e depressivo e triste. Então essa briga de egos deles dois eu acho que acabou a banda por causa disso. E é algo bem tosco porque a banda tinha muito potencial a frente e acabou não sendo aproveitado. Porque um era megalomaníaco e o outro queria mandar indiretinha em música. Não serviu muito sabe?

Tiago: Inclusive a turnê do Division Bell foi a última turnê do do Pink Floyd e foi uma turnê que deixou a banda no superávit, completou as contas e durante a turnê se não me engano, o Gilmour mandou um convite pro Roger pra voltar pro Pink Floyd. E o Roger obviamente recusou. E foi essa turnê que veio um dos discos ao vivo do Pink Floyd. O Pink Floyd na verdade não tem nenhum disco ao vivo que cê fala, cara esse disco é perfeito, todos eles tem muitos problemas, mas o Pulse é o menos pior deles.

Luca: É, o Pulse ele é muito bom, extremamente bem produzido e com a qualidade de gravação das músicas muito boa pra um show. Tem músicas do Pulse inclusive que eu prefiro a versão do Pulse do que a versão de estúdio. Então isso mostra que o álbum pelo menos não é perfeito, só que é muito bom. Inclusive tinha um disco que eu dei pra Tiago de presente porque eu acho que ele ia fazer mais uso do que eu porque eu tenho no celular, então não tem porque eu ter o físico.

Tiago: Inclusive, você falou de versões melhores, só tem uma música que eu acho melhor que a versão de estúdio que é Learning to Fly, que ela tem uma dinâmica maior. Mas qual que é o problema dos discos ao vivo do Pink Floyd? Ou eles eram muito crus quando a banda tava ali junta. Por exemplo, naquela época ali do Live at Pompeii, tinha experimentações que era legal as ideias que eles tinham, mas que a execução não era muito polida. E você tem o Pulse que é polido demais e que grande parte da execução instrumental vinha de colaboradores.

Então, por exemplo, eles tinham um baixista que fazia os backings porque o Rick quase não fazia nas músicas, cê pode ver que o Rick não tem muita voz do Rick e além de tudo, assim, percussionista, backing vocals, você vê assim que Pink Floyd mesmo de fato são três integrantes e eles tão apagados ali no meio do negócio, né? E mais assim, no fim das contas são três caras de meia idade destruídos pelas relações sociais que tão tentando sobreviver e eles conseguiram chegar aos anos 90.

Mas pra mim, qual foi a maior sacanagem que o Gilmour fez com o Rick? Logo após a turnê de Division Bell, o Rick estava escrevendo um conceito pra um disco do Pink Floyd em seguida, que seria talvez o primeiro disco do Rick que ele ia assumir uma posição mais de protagonismo, que seria o Broken China. E aí ele chegou pro e falou, bora reunir a banda pra gravar mais um disco e o Gilmour falou, não quero.

Luca: É, o Gilmour ele mandou uma de Roger, ele falou, OK a gente não vai fazer e como é o que eu quero, não vamos fazer. O Rick então ficou bem chateado com isso e publicou o álbum na carreira solo dele, que inclusive eu diria que seria um dos melhores álbuns do Pink Floyd caso fosse lançado porque eu acho muito bom o álbum. Ele é muito difícil de achar, não tem por exemplo no Spotify, não tem muitos lugares online, mas caso você seja interessado ele vale muito a pena. Tem todo um aspecto bem melancólico e triste e de ambientação bem dark assim, só que ele é muito interessante de escutar, é muito bom de ouvir. Eu comecei a escutar ano passado quando terminei o namoro, não aconselho isso, se você não estiver bem, não escute o álbum. Mas fora isso eu aconselho bastante a escutar.

Tiago: Sabe o que eu acho muito legal desse disco do Rick? É que ele seria exatamente um Pink Floyd contemporâneo. Porque o grande problema do Division Bell que a crítica apontou é que era uma simulação do Pink Floyd de plástico, então ou seja, eles tentaram modernizar no Momentary e não deu certo, então transformaram um processo totalmente analógico em 93 e isso fez mal pra banda, porque eles tavam totalmente desconexos da geração dos anos noventa. A geração dos anos noventa quando ela fazia revisionismo, era revisionismo dos Beatles daquela coisa dos anos sessenta, mas sempre com o timbre bem característico. E esse disco seria um progressivo que que é coerente com o período.

E o conceito das músicas que ele escreveu sobre Broken China é basicamente sobre depressão e como se cada pedaço do disco fosse um processo mental, né? E aí quanto mais você aprofunda o disco mais pesado ele fica.

Luca: Inclusive parece que o álbum de 94, o Division Bell, ele parece muito ser uma tentativa artificial de trazer pros anos 90 o álbum de 1970 que é o Atom Heart Mother. Parece uma tentativa artificial de atualizar o Atom Heart Mother. Acho que tentando até por uma tentativa de ignorar os álbuns de predominância do Roger e não deu muito certo. Eu gosto, mas não deu certo. Já o Broken China é algo completamente diferente e que mesmo sendo bem diferente de tudo, ainda representa muito do que o Pink Floyd era, que era algo experimental, assim como foi o Broken China e deu muito certo, não monetariamente, não de sucesso, mas deu muito certo na sua tentativa que eu acho que álbum muito bom.

Tiago: Inclusive você falou sobre essa questão do álbum de 1970. Eu já vi muita gente falando que o Division Bell foi uma tentativa do Gilmour fazer a sua versão do Dark Side. Ou talvez até do próprio The Wall, que é o disco sobre comunicação, porque The Wall falava um pouco sobre comunicação que era questão de você se sentir isolado de você falar e não ter a resposta, porque você tá entorpecido e tudo mais. E o Division Bell seria o outro lado do muro. Então, digamos assim, é como se fossem dois dias apresentando um muro também. É claro que The Wall é muito melhor. Mas enfim (risos).

Inclusive  nenhum dos integrantes conseguiu estabelecer uma força de popularidade semelhante ao que eles tinham conseguido juntos com Pink Floyd. Então o Rick ficou ali varzeando, o Nick também, porque o Nick não lançou nada, o Gilmour virou guitarrista da banda do Paul McCartney em meados de 99 quando a esposa do Paul McCartney morreu, a Linda, e isso a gente vai falar num episódio sobre Paul McCartney que foi o álbum Run Devil Run, que é um disco que o Gilmour é o guitarrista e ele fez as apresentações da turnê do Paul McCartney e inclusive acompanhou o Paul McCartney em apresentações de TV e como guitarrista de apoio, sabe? Como se fosse um cara superdesconhecido, sabe? Até engraçado.

Enquanto o Roger teve uma carreira solo produzindo discos que ele tentou se atualizar, mas sem sucesso e em 2000 ele lança o In the Flash ao vivo que é o disco que a maioria das músicas são músicas do Pink Floyd, então ele também acabou sobrevivendo só de músicas do período dele do Pink Floyd e é isso. E eu acho que já desemboca no Live 8. Foi um evento meio que pra simbolizar os vinte anos do Live Aid, quem sabe mais ou menos o Live Aid a gente falou isso no episódio sobre o Queen e o Live 8 foi um evento que visava trazer algumas atrações internacionais para conscientização de algumas questões da África e uma das ideias era reunir o Pink Floyd.

O Bob Geldof, que é um dos caras por trás disso, foi o ator principal do filme de The Wall. Ele nunca gostou de Pink Floyd, mas isso fez ter uma relação dele com a banda, né? Se não me engano a princípio o convite para reunir o Pink Floyd veio na mão do Roger e Roger topou de imediato. Ee queria muito que o Pink Floyd voltasse. Já quando veio esse convite pra mão do Gilmour, porque o Gilmour tinha que topar, o Gilmour ficou meio assim meio relutante. Eu não lembro exatamente como foi a história, não sei se o Roger chegou a ligar pro Gilmour, mas eu acho que teve sim um convencimento do Roger pro Gilmour topar a gravar.

E uma coisa muito interessante é que se vocês forem assistir a performance do Live 8, que dá uns vinte minutos mais ou menos que o Roger tá super alegre em ter todo mundo reunido de volta e o Gilmour tá lá sério, na dele, sabe, tocando e uma coisa meio fria mesmo. E o Nick também tá muito alegre na performance. O Rick tá um pouco de segundo plano, ele quase não aparece nas imagens de câmera e no final da apresentação o Gilmour agradece e já vai saindo. E aí o Roger puxa ele pros quatro se juntarem e fazerem a imagem, digamos icônica que é a imagem deles nos anos 2000.

Foi a última reunião do Pink Floyd, três anos depois o Rick morreria, quando o Rick morreu, tanto Roger quanto Gilmour admitiram que eles ficaram brigando durante anos e não deram o devido valor. É aquela coisa, quando a pessoa morre aí vem falar do valor da pessoa e tudo mais. E nesse período o Gilmour lançou também alguns discos ao vivo com repertório do Pink Floyd inclusive tem um que eu gosto muito que é o Live in Gdansk, que é um disco muito bem estruturado. O Rick tem muito protagonismo até, tem algumas músicas que ele canta como vocalista. E acho que a morte do Rick coloca sepulta assim juntamente com ele a esperança do Pink Floyd retornar. Então é aquela coisa. O Rick morreu e com ele morreu Pink Floyd junto.

Luca: O Rick morreu em 2008 e em 2006 dois anos atrás morria o Syd Barrett que ficou completamente escondido ou até por trás. Porque acho que as pessoas esqueceram da existência dele e ele quando tinha crises, ele passou a morar na casa da mãe dele, o hobby dele era fazer pintura e tudo mais, mas nunca mais se envolveu com com a música ou com com as pessoas do passado dele. Acho que depois disso não tem muito mais sobre Pink Floyd, tem 2014 que eles lançaram um álbum The Endless River. É um álbum predominantemente instrumental, não é considerado muito bom. É muito simbólico, mas não muito bom.

Tiago: A crítica recebeu ele melhor do que o Division Bell, inclusive porque ele é muito mais honesto na sua proposta. Ele foi gerado a partir de uma sessão de um disco instrumental que o Pink Floyd realmente ia lançar logo após o Division Bell, mas acabou arquivando, que era a chamada de The Big Spliff. E esse disco foi feito como uma forma de homenagear o Rick. Então é o disco que o Rick é o protagonista, mas sem o Rick vivo. É um negócio muito pesado. Não é um disco que eu gosto de ouvir, mas eu acho que tecnicamente falando, ele é muito melhor do que muita coisa que o Pink Floyd tinha lançado por causa da questão da honestidade e por eles terem admitido que era o último do Pink Floyd, o cara das letras é o Roger e só sonoridade que restou.

Luca: É, a única música do álbum que tem letra é a última música, né? É uma música que eu acho legal, não é preferida nem nada, mas eu acho muito legal porque ela é bastante emotiva e bastante autorreferente sobre que a banda é agora, sobre a falta que ele sente do Rick e sobre todos os problemas que estiveram e que de certa forma superaram, eu acredito.

Tiago: Pra fechar esse episódio, nós temos que falar sobre atualidades e Pink Floyd, né? A banda em si nunca fez show no Brasil. O Roger chegou a fazer shows no Brasil durante os anos 2000, fez nos anos 2010 e o Gilmour pisou pela primeira vez no Brasil se eu não me engano em 2017, né? Ele lançou um dis 2015 e esteve presente, mas a grande polêmica mesmo foi o Roger Waters fazendo a turnê do álbum…

Luca: Is This the Life We Really Want?

Tiago: … que inclusive foi produzido pelo Nigel Godrich, que é um dos caras que formam o alicerce musical do Radiohead, ele que produz todos os álbuns da banda desde 95 e é um disco que eu acho legal também. É o disco mais correto do Roger em anos e ele veio pro Brasil trazer todo o aspecto da turnê. E um dos temas que o Roger gosta de falar é de fascismo.

Luca: Eu acredito que o Roger ele é bastante pessoalmente impactado pelo fascismo porque o pai dele morreu na Segunda Guerra e isso é um tema que como eu já disse antes ele gosta muito de tratar porque é um tema que impacta ele. Então todos os shows que ele pode, ele vai tratar isso não só no Brasil como em qualquer lugar. Ele inclusive é um ativista muito forte sobre boicotar Israel por conta das posturas dela com Palestina e questões do gênero. Como ativista, eu acho a postura do Roger interessante, às vezes muito invasiva, mas eu acho interessante. Qual a sua opinião?

Tiago: É eu acho que uma das necessidades que uma pessoa tem quando ela se trata de ativismo é ser provocador quando necessário e o Roger ele é extremamente provocador, então ele incomoda. Ele ter chegado no Brasil exatamente no período das eleições e ter provocado num segmento de eleitores, que a gente pode chamar de bolsonaristas, eleitores do Bolsonaro, isso mostra que a música dele talvez tenha relevância a ponto de chocar e tudo mais.

O que eu penso que os artistas quando eles envelhecem é que eles se enquadram com um problema muito grande que é o fato deles enxergarem que muitas vezes o que eles têm a dizer de declarações sobre a vida, sobre a sociedade, sobre a própria música deles não refletir mais o mundo que eles vivem. E o Roger é um cara que tenta estar presente nessas discussões. E as pessoas aqui no Brasil ficaram um pouco sentidas com essas coisas dele, com relação ao Bolsonaro e tudo mais, tanto é que aquele cantor o Lobão que acabou se tornando representante do segmento da direita no Brasil ele ficou tão puto com o Roger Waters que ele disse várias vezes que o Roger não é nada e tudo mais, que as músicas dele são horríveis porque o Roger recebeu Caetano Veloso pra dar uma entrevista. Os dois começaram a conversar e ele não deu a menor ligação pro Lobão.

E o nosso ministro da cultura do Brasil quer dizer o nosso não, o nosso ex-ministro da cultura do Brasil que chegou a afirmar que o PT tinha financiado alguma coisa pra poder inflar sobre as eleições em relação ao Roger (risos). E óbvio que a investigação depois disse que não tinha nada a ver. As pessoas podem fazer várias críticas, inclusive legítimas ao PT, mas o PT não tem esse poder todo pra fazer um artista internacional fazer campanha para o PT (risos).

Luca: Não só isso, como fazer o Roger. Porque o Roger, como eu tinha dito, ele não tem posturas assim só no Brasil, ele teve na Bolívia, ele teve em nos Estados Unidos, inclusive o álbum da turnê dele, Is This the Life We Really Want?, é um álbum só de indiretinha pro Trump. O álbum ele fala basicamente só sobre o Trump. Você pode achar muitas coisas do Roger, mas que ele foi contratado por um partido acho que já é demais. Ele só é uma pessoa um ativista que quer provocar e eu acho que ele é muito bem sucedido nisso.

Tiago: E eu acho que as vaias que ele recebeu nos shows reflete uma coisa muito problemática que se vê no rock hoje em dia, isso eu falo no Brasil. Muitas vezes a sonoridade pras pessoas está desconectada das letras. Então, as pessoas ouvem e acham batida legal, o ritmo legal, mas elas não conseguem ver o contexto cultural que aquelas músicas estão inseridas, o que elas falam e tudo mais. Então, falava, “ah, não sei o que, o Gilmour é muito maior do que ele, porque o Gilmour não mistura política”.

O Gilmour é super político também. A questão é que o Gilmour faz muito mais a linha daquele idoso contemplativo que quer curtir o resto da vida com a mulher do que o Roger que vai lá e levanta a bandeira e tudo mais. Mas eu acho muito engraçada a capacidade que o brasileiro muitas vezes tem de levar pro lado pessoal de no dia anterior amar Pink Floyd e todas as coisas que o Roger escreveu e no dia seguinte falar que ele é um comunista safado, né? (risos).

Luca: É, eu não tenho muito mais a declarar, realmente é isso. Eu acho que muito mais desconhecimento do que do que incapacidade, porque se você conhecer a banda, você vê que ele sempre foi muito crítico de posturas, não do Brasil, mas posturas do Reino Unido, sabe? E daí pra frente virou um ativista muito forte, não só ele, como todos assim, então, poxa, pelo menos tente conhecer antes, sabe?

Eu acho que a única exceção é o Nick Mason, porque ele virou um um colecionador de carros da Fórmula 1 (risos). Então é isso pessoal, se vocês gostam de músicas do Pink Floyd e álbuns, mandem recados pra gente, mandem suas impressões aí que vai ser muito legal ler tudo sobre vocês. Um abraço.

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