Muitas pessoas autistas, especialmente aquelas que também tem TDAH, podem lidar com a questão da procrastinação. Ela afeta a produtividade no trabalho, na vida acadêmica e em outros aspectos. Neste episódio, depois de procrastinarem este tema por 5 anos, nossos podcasters finalmente discutem o assunto mais adiado da história do podcast. Participam: Michael Ulian, Paulo Alarcón e Thaís Mösken. Foto: Tiago Abreu. Arte: Vin Lima.
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Transcrição do episódio
Thaís: Olá pra você, que eu venho te introvertendo esse feito por autistas para toda a comunidade. Meu nome é Thais Moskën, eu sou autista, trabalho hoje como administradora sistemas e agora eu tenho 32 anos, mudamos o dígito, e eu vou ser hoje host desse episódio em que a gente vai falar um pouco sobre procrastinação. E este foi o episódio que mais demorou pra gente realmente gravar (risos), a gente demorou muito tempo falando que ia gravar isso daqui, então finalmente estamos com o nosso episódio.
Paulo: Olá pessoal, aqui é o Paulo Alarcón, só eu fui responsável por uns cinco adiamentos da gravação desse episódio, que é uma das pautas mais antigas que o podcast tem.
Michael: Posso fazer a introdução depois? A gente termina de gravar e eu gravo a introdução, eu prometo. Pode deixar, eu deixo pra depois, beleza?
Paulo: (Risos)
Thaís: E bom, pra quem não percebeu, quem está procrastinando a sua apresentação é o Michael (risos), então acho que é meio óbvio pra quase todo mundo que já ouviu o nosso Introvertendo, e o Introvertendo é um podcast feito por autistas com a produção da Superplayer & Co.
Bloco geral de discussão
Thaís: Vamos lá pessoal, começando a nossa conversa, primeiro um ponto que é importante a gente falar o que é procrastinação. Porque procrastinação não é sinônimo de adiar as coisas. A procrastinação é um ato consciente de você adiar algo e normalmente sabendo que aquilo pode ter um efeito negativo e também é um ato opcional. Então, por exemplo, o Paulo falou que foi responsável por vários adiamentos, mas acho que três das vezes que ele foi responsável pelo adiamento ele estava doente. A não ser que ele tenha escolhido ficar doente, acho improvável, isso não é considerado procrastinar (risos). Vocês gostariam de acrescentar um pouco aqui para ficar um pouco mais claro o que é procrastinação?
Michael: Mas, mudando rapidinho de assunto, vocês vão ver Barbie e Oppenheimer no mesmo dia também?
Paulo: Pô, eu animo com Oppenheimer, mas…
Michael: Não, não, tem que ir ver os dois juntos, tem que ver Barbie e depois ir ver Oppenheimer.
Thaís: Do que a gente está falando exatamente, que eu não estou entendendo?
Michael: Viu, eu consegui! É mais ou menos assim que é procrastinar. Saiu dois filmes, um filme da Barbie e um filme do Christopher Nolan sobre Oppenheimer. No mesmo dia.
Paulo: Que é um dos pais da bomba atômica.
Thaís: Você está falando sobre os filmes para não ter que falar sobre procrastinação, é isso?
Michael: Exato! E agora você pegou o que eu estava tentando fazer (risos). Não tem um exemplo melhor do que a prática. Tem vezes que você ativamente se auto sabota tenta fugir das coisas. E tem vezes que dá certo, viu? Estava quase tudo certo. Eu quase tirei a Thaís do rumo da conversa.
Thaís: (Risos) Ai, céus. E é exatamente, esse é um ótimo exemplo de alguém intencionalmente tentando adiar a gente a fazer alguma coisa que é gravar o episódio, sabendo que depois isso vai ter uma consequência negativa que é a gente ter que gravar o episódio tendo ainda menos tempo disponível para fazer isso (risos).
Paulo: É, que para quem grava não sofre tanto, mas para quem edita…
Michael: Vocês me lembraram de quando eu estava fazendo as transcrições dos episódios. Demorou só três anos para eu terminar tudo.
Paulo: Eu fiquei com uma transcrição por quase seis meses. Bom, vamos voltar ao assunto do episódio e parar de procrastinar. A procrastinação, ela vem também muito por conta de um sentimento de perfeccionismo que a pessoa também busca fazer a coisa ou alguma atividade de forma perfeita, e aquilo vai ficar perfeito e adia a atividade até não poder ser mais adiada e ter que fazer meia boca.
Thaís: E uma outra causa também que pode levar à procrastinação tem a ver com um mecanismo de compensação. Não sei se esse é o melhor termo, mas de dor versus prazer. Então, é se você prefere ter a dor logo para depois isso passar e não ter mais que pensar naquilo, ou se você prefere ter prazer inicialmente e atrasar o máximo possível a vinda da dor, mesmo que aquilo continue na sua lembrança que você tem que fazer em algum momento.
Michael: O que inevitavelmente traz muito mais dor, porque a ansiedade é uma filha da puta.
Thaís: Sim, inclusive um tópico que eu coloquei aqui que eu acho que é importante nós falarmos sobre é a questão de ansiedade, de stress e de princípio do prazer, que foi isso que eu comentei agora há pouco, apesar de que, certamente, se vocês pesquisarem por princípio do prazer, vocês vão encontrar muito mais conteúdo e conteúdo muito melhor explicado do que o que eu conseguiria falar, mas tanto a ansiedade quanto o stress, elas tanto podem causar a procrastinação quanto elas também podem advir da procrastinação. Então, conforme você leva mais tempo adiando o que precisa ser feito, isso costuma trazer um sentimento de ansiedade de tempos em tempos, de lembrar que aquilo ainda é um problema. Você ainda não resolveu aquilo. Então, isso pode ter outros efeitos colaterais também. Especialmente se você transforma isso num hábito em que quase todas as coisas que você tem que fazer e que você não gosta acabam sendo adiadas várias e várias vezes.
E a gente fez, agora há pouco, um exemplo prático de procrastinação, mais na brincadeira, mas se a gente parar para pensar de forma mais séria sobre os momentos em que a gente procrastinou alguma coisa, costumam ser justamente as coisas que a gente não gosta de fazer, não quer fazer, justamente por conta desse princípio do prazer. Aquilo é uma dor para a gente e às vezes isso é parte também do autoconhecimento. Então, você entender quais são as coisas que te trazem dor fazem com que você consiga decidir um pouco melhor o que fazer da vida. Eu estava dando um exemplo para o Michael agora a pouco sobre quando eu estava no estágio. Uma das tarefas que atribuíram para mim algumas vezes, muito mais vezes do que eu gostaria, era a tarefa de ter que ligar para várias empresas para fazer pedir orçamento de materiais de construção.
Basicamente, a tarefa era ligar e mandar e-mail para muitas pessoas. E a ideia é que eu fizesse lá umas 20 ligações por dia. Eu conseguia fazer três com muito sofrimento e eu não sabia porque eu me incomodava tanto com aquela tarefa porque eu estava sempre tentando fazer outra coisa. Então eu ligava e aí eu passava um bom tempo anotando o que tinha acontecido na ligação ou passava um bom tempo me preparando para a próxima ligação porque para mim era uma dor muito grande. E no final eu só não percebia que era uma tarefa para a qual eu não era adequada, me fazia sofrer, e se eu tivesse que trabalhar com aquilo eu sofreria todos os dias. Acho que serve como um mecanismo, parar para pensar na procrastinação, e entender como que você não quer viver.
Paulo: Eu já sofri vários episódios de procrastinação em muitas etapas da minha vida, inclusive profissional. Meu primeiro paper onde eu poderia ter ido apresentar um trabalho em Cancun no México, falhei para o próprio Achini para escrever o artigo mesmo já tendo os resultados.
Michael: Compartilho esse sentimento, inclusive acho que já contei em outros episódios do fato que a minha iniciação científica eu passei boa parte de um ano trabalhando nela, trabalhando na pesquisa, uns seis meses focados na pesquisa. Pronto, desses seis meses, era só escrever os resultados. Tinha adiantado muita coisa, eu já tinha chegado no prazo que eu precisava e era só reportar isso. Eu fiz tudo em meio dia do prazo final de entrega. Foram seis meses trabalhando na parte prática, coletando dado, analisando dado, vendo se estava tudo certinho tudo, e escrevi o artigo em si meio dia antes do final, do último prazo de entrega… me enrolei, eu fiquei seis meses enrolando para escrever essa merda.
Paulo: Eu também fiquei enrolando, só que no dia do prazo de entrega eu fiquei uma semana até 8 da noite no serviço escrevendo esse paper.
Michael: Assim, ainda mais ter um artigo completo, você vê o negócio que precisa de muita revisão realmente você pegar… com o PIBITI ainda eu tive bastante sorte, primeiro porque foi PIBITI então assim, era tudo muito coisa técnica, tipo demorou mais por causa da minha falta de vontade de querer escrever. Beleza, a parte de fazer a pesquisa é legal, a parte de ter que fazer um relatório sobre isso não foi nem um pouco legal. Fazer um paper mesmo, nossa é muita revisão, até você ter cada frasezinha do jeito que você quer, cada frasezinha do jeito que não vai ter um corno filha da puta que vai olhar essa frase aqui e vai tirar fora de contexto para encher o saco. Isso é um saco. Isso também na questão do perfeccionismo que você falou, acabei de dar o exemplo de como o perfeccionismo funciona na prática, né? Tipo, você não consegue pensar: não, eu vou fazer esse texto de uma forma que fique bom. Se eu botar essas três palavras nessa ordem, alguém vai conseguir interpretar errado? Se alguém conseguir interpretar errado, não. Eu vou ter que excluir toda essa merda. Ficou uma porcaria, eu vou ter que começar direto de novo. Não ficou bom. É mais ou menos assim.
Paulo: No meu caso, a gente tinha também o problema de ou estar escrevendo algo muito resumido e precisando dar mais detalhes, ou estar escrevendo algo muito detalhado e precisar resumir porque não tem necessidade de tanta coisa. Porém, toda afirmação tem que ter ou algum resultado, ou alguma referência.
Michael: Tá aí um negócio que eu odeio falar, tipo, o problema não é achar as referências, o problema é você por elas fisicamente no documento, formatar tudo bonitinho. Geralmente quando eu estou fazendo pesquisa, é quase literalmente “vozes da minha cabeça”. Tá, beleza, eu sei que eu li isso em algum artigo, em algum dos meus 20 anos de vida. Tá, mas agora eu preciso dessa merda de artigo para por aqui. Como que eu formato? Beleza, vai umas 3 horas, 3 dias, umas 3 semanas. Achei a porcaria do artigo, finalmente. Ele fala realmente o que eu estava pensando que ele ia falar. Agora, como eu formato ele do jeito que… ahhh, não, não, não. Já tá dando PCSD aqui.
Thaís: É comum nesses casos se você tem que formatar algo e você não gosta daquilo, você preferia continuar pesquisando. Você simplesmente continua pesquisando. Supostamente é algo bom em alguns aspectos, e você pode até justificar que você está ampliando sua pesquisa, conseguindo mais informações. Mas, na verdade, o seu foco não é ampliar a sua pesquisa. O seu foco é não ter que formatar e fazer uma coisa de que você goste mais. Então não quer dizer que a procrastinação signifique sempre que você não está fazendo algo útil ou que você está só dormindo, só sendo preguiçoso. Não é isso. Você pode, inclusive, estar fazendo algo que demanda muita energia ou fazendo algo que você achou muito bom mas que não era a prioridade, porque você está tentando adiar a sua prioridade.
Michael: Inclusive, em uma tangente sobre isso, às vezes você está fazendo algo, por exemplo, vou dar um exemplo das referências, tá, beleza, por que você não pega outra pessoa que está trabalhando nesse paper contigo e bota ela para fazer essa parte chata de formatação? Pede ajuda para ela. Você não vai fazer isso. Não, não, não, não. Eu vou passar o meu serviço para outra pessoa fazer? Não, é meu serviço. Eu vou fazer, eu, eu, eu, eu consigo. E você prossegue a não conseguir e não fazer. Pelo menos no meu caso, é uma coisa, acaba que a procrastinação comigo tem muita relação com o meu orgulho, beleza, não. Eu falei que eu vou fazer isso, eu vou fazer. Não, eu vou fazer. Mas, assim, eu não quero fazer e eu vou enrolar o máximo possível para fazer isso. Mas não, eu prometi que eu vou fazer, então eu vou fazer e voltar atrás, não fazer nunca nunca nunca. Eu vou fazer, só vai demorar uns três anos, não vou fazer.
Paulo: Uma questão até que eu já falei com algumas pessoas, principalmente a minha esposa, não é uma questão de se eu vou ou não vou fazer, é em quanto tempo eu vou fazer. Uma hora eu faço, pode demorar só.
Thaís: É, eu hoje em dia não tenho mais essa questão de orgulho, quer dizer, às vezes tem, mas eu tento não ter na maioria das vezes, porque realmente tem algumas coisas que eu não gosto mesmo de fazer, eu já descobri isso e eu sei que eu fazendo outras coisas em que eu sou melhor e de que eu gosto mais, eu consigo trazer mais resultados, por exemplo, para a empresa. Então, pensando no meu trabalho especificamente, tem algumas coisas em que é necessário negociar com múltiplas áreas, era um problema, por exemplo, que eu estava vendo hoje, uma tarefa que eu não estava querendo avançar nela, eu estava procrastinando nela, inclusive eu falei isso para a minha chefe, falei: “oi, então, eu estou procrastinando nisso” (risos), porque eu precisava negociar algumas coisas com várias áreas diferentes, eu não sou boa nisso, eu me incomodo muito em ter que fazer negociações com outras áreas. E eu não me incomodo em eu ter que trabalhar, eu ter que fazer alguma coisa, construir alguma coisa lógica, por exemplo, desenvolver alguma parte do sistema, isso tudo bem. Mas eu ter que alinhar com todo mundo o que vai ser feito e quando cada pessoa vai fazer é ruim.
E se eu conseguir alguém para fazer a negociação para mim, eu consigo não ter que fazer uma coisa na qual eu sou ruim, então, uma pessoa que é melhor nisso do que eu faz essa parte, eu não me estresso, eu não tenho que procrastinar, eu só pego e faço. Então, a outra parte, a minha parte, que geralmente as pessoas talvez não saibam fazer ou não gostem de fazer, mas eu gosto. Então, para mim, isso tem às vezes a ver também com focar em ser bom ou melhorar o que você gosta de fazer para que você não tenha que focar tanto nas coisas que você não gosta. Não que no dia a dia você consiga evitar todas elas, mas eu acho que no trabalho dá para você otimizar muitas vezes o seu tempo e a sua performance tendo isso em mente.
Paulo: Isso é uma coisa que eu vivo na prática. Eu sou uma pessoa muitas vezes preguiçosa, faço aquilo que eu gosto e o que eu não gosto eu tenho uma tendência a procrastinar mesmo. E eu já estive em empresas onde boa parte das minhas atividades eu precisava escrever relatórios. Aí ao invés disso eu fico muito mais feliz quando eu crio um script que me gera o relatório do jeito que eles querem, pegando isso tudo automaticamente de onde tem as informações. Mas tem algumas situações também que eu não tenho como fugir e hoje, por exemplo, eu estou com um problema porque eu preciso fazer uma apresentação das coisas que eu fiz, que foram muito bacanas, das coisas que eu pretendo fazer, mas estou procrastinando a preparação da apresentação porque eu não gosto de ficar desenhando, fazendo design de slides e tentando montar essas coisas.
Michael: Não tentando roubar o foco do episódio de novo, não sei se você viu, e eu não sei se vai ter a versão paga do chat de GTP, mas agora ele tá como uma função para gerar gráfico e essas coisas.
Paulo: Hum, isso eu não sabia.
Michael: Inclusive a parte gráfica. No caso que você explicou, seria exatamente o que você precisa agora, nesse momento.
Paulo: Acho que ele ia ajudar. Enfim, e aí uma empresa que eu trabalhei há um tempo atrás, eu tive sérios problemas porque eles não homologaram o script que eu tinha feito para gerar o relatório que eles queriam de forma automatizada.
Michael: Nesse sentido, justamente nessa realidade de trabalho, eu tenho me adaptado um pouquinho mais e aprendido a lidar um pouco melhor com o problema de procrastinação. Apesar de que assim, aprender a lidar é uma palavra forte, porque na prática o que eu normalmente faço é usar minha procrastinação a meu favor. Tipo, o exemplo que a gente deu de usar algo que você é bom como uma válvula de escape pra você fugir de fazer a coisa que você deveria fazer, eu uso demais. Eu sou muito bom nas coisas que eu faço lá e eu faço muita coisa. Muita coisa mesmo. Quando eu não quero fazer alguma coisa, o jeito que eu lido com isso é geralmente, tá beleza, eu vou fazer tanta coisa que ninguém pode reclamar que eu não tô fazendo aquela coisa que eu deveria estar fazendo agora.
Tipo, a bom ponto de chegar de não, se alguém reclamar de mim a esse ponto, a pessoa vai se sentir mal, porque não. Olha o tanto de coisas que esse cara vai fazer, eu realmente vou pedir pra ele fazer esse negócio específico que ele tá enrolando? Não, não, deixa para outro fulano fazer isso. Apesar de que mais recentemente eu tenha tentado me esforçar, tipo, tá beleza, isso aqui eu não quero fazer, é um pau no saco. Isso aqui eu não quero fazer, tá, mas isso aqui é algo que tem que ser feito. Oh, fulano, fulano, vem cá você mesmo. Tá, você não tá fazendo nada agora, né? Faz esse negócio pra mim, porque eu tô fazendo outra coisa, ou o fulano faz outra coisa.
Eu tô começando a aprender a lidar com essa sessão, tipo, beleza, não precisa só ignorar as coisas, eu trabalho num ambiente com mais pessoas. Às vezes é ok você pedir ajuda pra outra pessoa, por mais que te fere o orgulho de fazer isso, e daí eu procedo a não fazer isso quando eu preciso também. Tipo, eu também tenho o mesmo problema de, tipo, tá, eu tenho que fazer essa X tarefa. Essa X tarefa envolve eu fazer uma parte dela e depois coordenar o resultado disso pra outras pessoas fazerem, quando darem oportunidade desse serviço. Eu vou fazer a minha parte com excelência, o que antes lá eles demoravam 15 dias pra fazer eu faço em 2, 3. Só que daí chega na parte, tá beleza, eu tenho que passar agora os resultados que eu fiz pra outras pessoas darem continuidade, tem que lidar com gente, né? Não. Acabou demorando uns quinze dias do mesmo jeito porque eu não passo pras pessoas fazerem. A minha parte eu fiz não, a minha parte está perfeita. Ignorando o fato que é minha parte também passar pras outras pessoas fazerem isso e não faço. Acontece.
Paulo: É um problema é que eu também sofro.
Thaís: Bom, e o outro ponto que eu coloquei aqui é sobre a procrastinação versus a gestão de tempo e planejamento. Geralmente quando você está procrastinando, isso acaba fazendo com que você perca um pouco de planejamento de quando ou como que alguma coisa vai ser feita. Principalmente do quando, porque estou pensando aqui no tempo. Então por exemplo essa questão que o Michael falou que a galera levava quinze dias, ele faz em dois dias e depois, sei lá, ele demora treze dias pra conseguir falar com alguém pra encerrar de verdade a tarefa. Então efetivamente ela leva o mesmo tempo, o que significa que provavelmente isso atrapalha o planejamento de algumas outras formas, né? Se você consegue lidar melhor com a procrastinação, seja evitando a procrastinação, mais difícil, né? Ou seja, encontrando esses truques, isso acaba te permitindo ter uma gestão melhor do seu tempo, planejar como as coisas vão funcionar, mesmo sabendo que você vai procrastinar em alguma coisa. Às vezes inclusive já deixar algo preparado para aquela tarefa em específico que você sabe que vai demorar.
Então vou fazer alguma coisa que me interessa, gosto e não vou procrastinar e logo em seguida eu vou ter uma outra tarefa que eu sei que eu vou ser um procrastinador nela. O que que eu consigo fazer nesse meio tempo? Como que eu consigo fazer com que isso não atrapalhe, por exemplo, uma segunda tarefa que dependa da finalização da minha. Saber esse tipo de coisa pode te ajudar a pelo menos evitar que a procrastinação te afete negativamente. Eu sei que é um pouco delicado em alguns aspectos, mas existe um nível de problema que é você ter muita muita ansiedade com alguma coisa, ficar estressado e depois ter problema no trabalho versus alguma coisa que é só demorar pra sair, mas isso não se tornar um problema maior.
Paulo: Pra lidar com a procrastinação existem vários métodos, né? Alguns dos mais famosos é o Pomodoro pra você se forçar, ficar na atividade por um determinado tempo, né? Seguindo aquela linha do modo de fazer o molho de tomate, né? O macarrão…
Michael: Ah eu já ouvi falar disso, e eu nunca nem tentei porque nessa parte aí o TDAH me afeta mais do que o que o autismo e tipo, a única opção para isso é ativar o botãozinho vermelho nuclear. Se eu quero fazer as coisas assim darem certo mesmo é a anfetamina. Não tem outro jeito, eu preciso da medicação que controle o TDAH, senão não vai (risos).
Paulo: Existem outras formas, inclui você se dar recompensas por fazer essas atividades chatas.
Michael: Nossa, eu tentei fazer muito isso quando eu tava com as transcrições e puta que pariu, também deu errado (risos). E não é querer desanimar nem o Paulo nem os nossos ouvintes, é que eu realmente sou uma pessoa acima de tudo desorganizada. Quem me conhece, principalmente o Paulo e a Thaís aqui, sabe que eu tenho uma natureza um tanto quanto caótica, um déficit de atenção bem característico, nesse sentido eu sou o pior exemplo possível. Quando eu falo que sem a medicação eu não consigo manter o foco, não consigo manter a concentração, não é eufemismo, não é força de expressão. Realmente meu caso é horrível, é nesse nível mesmo.
Thaís: Mas o fato é que não existe uma receita mágica, existem algumas dicas que podem ser usadas de fato, por exemplo, isso que o Paulo falou, tem também a questão de você ter metas baixas, simples e rápidas de você fazer e atingir. Então, ao invés de pensar em algo muito longo que você precise fazer, tentar fazer em pequenas doses e definir uma pequena dose como meta. Mas também, nem para todo mundo isso vai funcionar, são só ideias. Se a gente jogar no Google “procrastinação”, ou “como evitar a procrastinação”, ou “quero parar de procrastinar”, você vai encontrar trocentas dicas diferentes, algumas vão funcionar para você e outras não, dependendo ou não do seu quadro clínico e dependendo ou não de vários outros fatores.
Paulo: Aí uma pergunta mais da minha parte, vocês acham que por serem autistas, vocês são mais afetados pelos problemas com procrastinação?
Michael: No meu caso, como eu falei, o que mais me quebra com procrastinação vem da parte do TDAH. Mas um exemplo bom que você deu, inclusive, Paulo, e eu reforcei, que é a questão do perfeccionismo, que vem do autismo e afeta demais. Eu já tenho essa propensão a querer fugir das coisas que eu não gosto. Quando eu junto isso com o fato de que eu quero fazer as coisas sempre over the top, sempre o melhor possível, eu não posso tentar desenhar uma linha reta que não, cara, deixa eu fazer uma arapuca aqui pra fazer essa linha ser perfeitamente reta. Tem que ser a linha mais… Tá, como que eu verifico? Deixa eu mandar essa linha para um síncrotron, pra ver se ela tá atômicamente reta mesmo. Não, não, tem que ser a linha mais reta do mundo. Tipo, literalmente, me pediram só fazer uma linha reta por motivo nenhum, mas tem que ser a linha mais perfeita do mundo, porque senão não é uma linha reta.
Vamos no exemplo mais fraco, tipo, o Paulo mandou uma foto do áudio dele no Audacity, e… Eu quase surtei quando eu vi, porque o microfone dele mostra, captura bem a falha do áudio. O áudio tá todo ali, pra cima e pra baixo, pra cima e pra baixo, tipo. Já aconteceu de eu passar horas tentando eliminar essas linhazinhas porque elas me dão agonia e não, o áudio tem que ser perfeitamente limpo. Por mais que o microfone seja uma bosta, a minha placa de captura é pior ainda. Não, o áudio tem que chegar pro Tiago, assim… Se ele der um zoom de 1000% você não consegue achar o porra do barulho no áudio.
Nesse sentido o autismo afeta bastante essa questão da procrastinação, em que… Eu sou bem exagerado com essa questão do perfeccionismo. Só quando eu quero, também. E geralmente quando eu quero é quando eu quero fugir e fazer alguma coisa.
Thaís: Em resumo, algumas características do autismo podem ter relação com procrastinação. Mas eu acho que não o autismo em si, diretamente. Então, algumas dessas manias que a gente tem, acho que algumas das dificuldades também que a gente tem que nem a gente citou várias vezes… Coisas relacionadas a pessoas, ou fobia social, comunicação de forma geral. Talvez por serem atividades que gastam muita energia elas são relacionadas a esse lado da dor e que levam à procrastinação. Pensando nesse cenário de você priorizar o prazer antes e deixar a dor para depois.
Paulo: Eu concordo com isso. E acrescento que uma influência do autismo também pode estar nessa aversão que muita gente pode ter a coisas que saem do seu hiperfoco. Mesmo que pegue um conjunto de tarefas um pouco mais complexas, tem uma atividade dentro dessas tarefas que saem do hiperfoco, ela só vai ser postergada até não poder ser mais.
Michael: Como o exemplo que nós dois temos de escrever relatório. Não importa que o relatório está dentro do nosso hiperfoco. Literalmente, parte do trabalho das nossas vidas é um relatório. Eu não quero fazer isso. Dedo do meio para o relatório. Mas então, Thais, eu sei…
Thaís: Pode falar.
Michael: Eu sei que você está querendo gravar a finalização agora, mas antes de a gente entrar nisso. Vocês viram que está para ser Xenonauts 2?
Thaís: Oh, céus…
Michael: (Risos)
(Fim do episódio)
Thaís: Eu queria saber se vocês têm alguma ideia de como a gente finaliza o final deste episódio.
Paulo: Eu acho que o Michael tem que roubar a finalização de novo.
Michael: Eu tentei, mas a Thais não pegou a deixa.
Thaís: Ah, entendi, era para isso ser a finalização? Ah, não, eu não tinha entendido. Vamos deixar assim, então (risos). Vamos procrastinar a finalização. A gente depois manda uma finalização aí para o Tiago, é isso?
Michael: E agora eu vou roubar a finalização de verdade. Como provavelmente o pessoal do podcast sabe, esse vai ser praticamente o último episódio que vai sair. Vai ter um episódio especial depois, mas, bem, tecnicamente dos episódios dentro da temática do podcast esse é o último. Esse vai ser o último episódio que eu, a Thaís e o Paulo gravamos juntos. Eu sei que vai ter episódio depois de despedida especial, mas foi um prazer e um desprazer estar com todos vocês aqui por todos esses anos. Eu nem lembro mais de quando a gente começou a gravar, acho que foi em 2018, céus, é muito tempo, caramba, eu tô ficando velho.
Thaís: Faz tempo mesmo, 5 anos. Há muito tempo a gente começou a gravar, há um pouco menos de tempo a gente começou a jogar e sinceramente eu preferia estar jogando.
Michael: (Risos)
Paulo: Ah, eu gosto das gravações.
Michael: Me desculpa Tiago, mas estamos os três aqui, puta que pariu, vamos terminar isso logo pra aproveitar a partida, que faz tempo que a gente não joga o RPG do Paulo.
Thaís: É verdade, apesar de que, como eu falei, eu vou ter que pausar pra jantar em algum momento, mas parece que o jantar vai chegar por volta das 10.
Paulo: Paulo, suas finalizações, que a gente cortou você duas vezes já.
Paulo: Pessoal, foi uma honra gravar com vocês pela última vez e espero que a gente continue jogando e que venham outros projetos também no futuro, né. E eu acho que vou pensar em outra finalização melhor pra depois mandar pro Tiago.
Thaís: (Risos)
Michael: (Risos)
Thaís: Bom então pessoal, muito obrigada, fico muito feliz também de ter gravado com vocês, acho que acaba sendo icônico a gente ter como nossa última gravação, a gravação do nosso triozinho. Fizemos várias gravações com este trio e no final este trio foi para além do podcast, então fiquei feliz inclusive, eu não tinha entendido que essa seria a última até pouco tempo atrás (risos). Tava bem perdida nesse aspecto. E tomara que dê certo esse nosso episódio de despedida porque até agora eu não sei exatamente o que vai ser.
Michael: Honestamente, a metalinguagem vai salvar esse episódio.
Paulo: (Risos)
É literalmente um episódio para relembrar a velha guarda do Introvertendo, extremamente meta, extremamente não muito profissional, não muito sério, não muito focado, são só três autistas numa conversa de bar virtual.
Thaís: (Risos) Numa conversa de bar virtual sobre um assunto muito mais profundo do que o que a gente conhece.
Michael: É isso aí pessoal, aqui foi o Gaivota, a Thais, o Paulo, adeus.
Thaís: Acho que agora fechamos, essa daí foi a finalização, finalização.
Paulo: Agora fechamos.
Thaís: A finalização da finalização da finalização.