Introvertendo 221 – Autistas da Região Sudeste

A mais populosa região do Brasil, o sudeste abriga três de suas principais metrópoles, mas também um certo clima de interior em alguns lugares. Neste episódio, o fluminense Paulo Alarcón e a paulista Thaís Mösken recebem Alek Matteo, que mora no Rio de Janeiro, Daniela Sales, de Minas Gerais, e Rian Marques, do Espírito Santo. Os três abordam poluição, questões sensoriais, comida, lazer, preconceitos e acesso ao diagnóstico de autismo na região. Arte: Vin Lima.

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Transcrição do episódio

Thaís: Um olá pra você que é ouvinte do introvertendo, esse podcast feito por autistas pra toda a comunidade. O meu nome é Thaís Mösken, eu sou autista, hoje trabalho como administradora de sistemas e tenho 31 anos. E hoje eu vou ser host desse episódio em que a gente vai falar sobre os autistas da região sudeste. Eu mesma nasci em São Paulo, mas hoje eu moro em Florianópolis e apesar de conhecer as vantagens e as desvantagens de se estar em São Paulo, eu não voltaria pra lá não.

Paulo: Olá, pessoal, sou Paulo Alarcón, sou autista, tenho 31 anos, sou analista de sistemas e eu nasci na região serrana do Rio, fui criado no litoral de São Paulo e atualmente moro no interior de São Paulo.

Alek: Olá gente, meu nome é Alek, eu tenho 23 anos. Na verdade eu nasci no Paraná, mas eu cresci no interior de São Paulo e recentemente eu me mudei pro Rio de Janeiro, porque eu estou estudando, tô fazendo medicina e minha faculdade é aqui. Eu também sou autista e fui diagnosticado recentemente.

Daniela: Meu nome é Daniela, sou mineira, sou de BH, nascida e criada em BH e moro em BH. Tenho 46 anos, sou administradora de empresas e fui diagnosticada em 2017, finalzinho de 2017.

Rian: Tudo bem, eu sou Rian Moreira Marques, eu tenho 22 anos, eu moro em Vitória atualmente, aqui no Espírito Santo. Nasci na Serra, também no Espírito Santo, sou estudante de jornalismo e trader esportivo, eu fui diagnosticado também no fim de 2017, na época eu tava com 17 anos.

Bloco geral de discussão

Paulo: Um programa enfrentado por muitas pessoas que vivem em grandes cidades como São Paulo e Rio de Janeiro é a questão da poluição e do barulho. Como vocês lidam com isso?

Daniela: A minha vida inteira eu morei em bairros muito movimentados, com ônibus na porta, e atualmente eu moro do lado de uma igreja. Para gravar esse episódio aqui, eu estava extremamente tensa, porque é muito barulho. E eu tenho muita dificuldade, às vezes, com barulho, porque o barulho me cansa e me desconcentra. Então, eu não consigo, às vezes, ter um diálogo, manter um diálogo, eu começo a prestar atenção no barulho. E a gente fica com esse barulho na cabeça por dias e talvez até meses. Isso acontece muito comigo.

Alek: Eu não moro na capital, moro do lado, mas eu acho que eu senti bastante diferença quando eu mudei no começo do ano, porque no interior de São Paulo eu morava numa chácara, então às vezes tinha vizinho que fazia barulho e tudo mais, mas não era esses barulhos de cidade mesmo, assim, de carros, de gente passando, vizinho perto e tudo mais. Eu comecei a usar fone direto. Eu ainda não tenho um com cancelamento de ruído, mas eu quero, mas eu comecei a fazer aulas e tudo mais, eu tenho ficado bastante tempo com ele e eu notei muita diferença. Porque eu nem reparava o quanto que eu tenho hipersensibilidade auditiva, mas é uma coisa que é realmente como falaram, parece que fica um eco do barulho na nossa cabeça, a gente chega em casa e tá aquele zumbido.

Rian: Eu moro aqui em um bairro nobre de Vitória, o que mais me incomoda e é muito frequente é o barulho de furadeira e é um barulho particularmente que me incomoda bastante. E também barulhos repentinos. Por exemplo, eu tô tranquilo, concentrado de fone, trabalhando e vem um barulho de rojão. Aí ele me deixa um pouco desconcertado em segundos, entendeu? No meu caso é isso, um barulho específico de furadeira, barulho de furadeira me incomoda bastante.

Daniela: Bom, eu ainda tenho muita sensibilidade a alguns tipos de figuras e iluminação muito intensa e dependendo da figura, da intensidade das luzes, aquilo me causa uma tonteira assim, uma tontura repentina. Eu não consigo enxergar, me dá tipo um… é muito ruim, isso eu não entendia. Hoje em dia eu entendo e evito sempre que eu posso olhar, por exemplo, figuras ou luzes muito intensas. Mas de vez em quando eu sou pega de surpresa. E aí é muito incômodo, realmente.

Thaís: Esses aspectos que vocês comentaram de barulho, realmente são um dos pontos que eu me lembro bem de quando eu morava em São Paulo. Eu costumava inclusive cair bastante na rua e hoje eu percebo que eu caía muito porque eu ia perdendo um pouco do senso mesmo de direção quando tinham muitos barulhos vindos de lugares diferentes. E depois que eu me mudei, vi uma diferença bem grande aqui em Florianópolis, isso nunca mais aconteceu.

Alek: Outra coisa que eu lembrei é que o meu campus fica na beira da Baía de Guanabara e aí tipo, do outro lado fica um aeroporto. Lá passa navios também e vira e mexe, eu levo muito susto. Porque eu ouço os aviões, eu ouço até falando no aeroporto ou o navio faz uma buzina e eu fico assustado e eu reparo que as pessoas não ficam.

Mas eu acho que é justamente por causa da sensibilidade, eu paro assim: “gente que que é isso?”. E as pessoas olham pra mim, é só o avião Alek, mas é é direto, eu tô morando aqui já tem vários meses e eu sempre assusto.

Rian: Eu gosto, particularmente, muito de futebol e tênis. Mas por exemplo, se eu tiver um estádio, por exemplo, é um barulho que eu gosto. Não sei se, por exemplo, acontece com algum autistas também, alguns deles por exemplo: você gosta de tal coisa que o barulho não te incomoda, ou se você tiver um show, por exemplo, de funk ou um show de MPB e isso não incomoda. Pra mim um pub não incomoda. Acho interessante e lembrei de comentar isto como uma característica específica.

Thaís: Eu acho isso bem curioso, pra mim não tem nenhum barulho se ele estiver alto de verdade, que não me incomode, mas certamente tem algumas frequências que me incomodam mais. Então, os graves tendem a me incomodar bem mais do que os agudos. Aquele barulho agudo que o pessoal fala que dá arrepio de passar unha em quadro e tal, esse barulho assim é ruim como um barulho com aquele volume mas ele nem se compara com um grave. Então não sei se se pra mais alguém ter realmente esse tipo de diferença, mas eu acredito que sim. Eu acredito que pra muitos autistas alguns barulhos específicos são bem piores do que outros.

Alek, uma pergunta só pra você. Nos episódios das outras regiões, vários autistas reclamaram de pessoas da região sudeste, principalmente dos paulistanos. A gente quer saber o que você acha: São Paulo realmente é o estado vilão do Brasil?

Alek: Ah, eu não diria vilão, eu entendo porquê as pessoas acham isso. Eu acho que é porque é um estado muito superestimado e acaba tendo uma concentração muito grande de renda e oportunidades. E acaba que a mídia e tudo mais concentra muito aqui no sudeste. Os outros estados têm pouca representatividade, então entendo tudo isso. Mas eu não acho que seja um estado vilão. Acho que a gente tem que valorizar o Brasil como um todo, com toda a diversidade que ele tem. O Brasil é um país incrível e parece vários países diferentes de tão rico que ele é. Então, tem que celebrar toda essa diversidade, não pode concentrar só num lugar, mas não quer dizer que seja assim tudo de negativo tudo aquilo.

Paulo: Uma coisa que eu que eu vejo, apesar de estar no estado de São Paulo, é a forma como os paulistanos principalmente agem diferente dos outros cantos do estado, principalmente interior, litoral. As agendas de todo evento cultural que acontece, o foco acaba sendo São Paulo. É lá onde você tem que ir pra fazer, pra ver alguma coisa diferente.

Thaís: De fato. Como uma pessoa de São Paulo, eu posso dizer que realmente eu cresci com essa mentalidade de: “nossa, nós somos São Paulo, centro do Brasil, a coisa mais importante que existe por aqui”. E eu acho que conhecer pessoas de outros lugares, conhecer outros lugares é justamente o que faz com que a gente vá percebendo como tem coisas boas e coisas ruins em cada lugar diferente. E eu acho que isso vale pra muitos tipos de preconceitos, não sei dizer todos. Talvez generalizar assim seja muito fácil.

Mas eu acho que a maior parte dos preconceitos a gente consegue combater justamente conhecendo coisas diferentes e não ficando só naquela bolhazinha. Eu também não chamaria São Paulo de vilão, mas eu acho que de vários lugares, não só de lá, precisam aprender a conhecer um pouco mais o que tá fora do seu convívio normal. E isso ajuda a reduzir esses regionalismos mais bobos.

(Áudio do WhatsApp)

Rodrigo: Olá a todos, eu me chamo Rodrigo, eu tenho 27 anos, hoje eu moro em Marília, interior de São Paulo, fui diagnosticado com autismo em 2014, com 19 anos, no meu segundo ano de faculdade em Lorena através do CAPS. E é uma coisa curiosa porque eu morei em quatro cidades, nasci em São Paulo, depois mudei pra Cruzeiro até o ensino médio, depois pra estudar e fazer faculdade morei em Lorena e hoje eu moro em Marília, que é do outro lado do estado e é a melhor cidade até hoje que eu estou morando. Tem a tranquilidade de uma cidade de interior, tem a infraestrutura necessária de uma cidade maior e as pessoas são muito receptivas.

Andreza: Eu me chamo Andreza, tenho 39 anos. Sou de São José dos Campos, São Paulo, região do Vale do Paraíba. Nossa cidade é mais conhecida pela aeronáutica, uma vez que a Embraer fica aqui, o INPE, o ITA e recentemente nós recebemos o selo de primeira cidade inteligente do Brasil. Infelizmente toda essa tecnologia ainda não funciona em outras áreas na nossa cidade como, por exemplo, a saúde que deixa muito a desejar e a educação, principalmente educação inclusiva. Fui diagnosticada recentemente com 38 anos, sou uma grande fã do podcast introvertendo que inclusive me ajudou muito no processo de diagnóstico do meu autismo. Um grande abraço pra todos vocês.

(Fim do áudio do WhatsApp)

Paulo: Daniela, Minas é um estado que tem aquela imagem exportada de pessoas acolhedoras e culinária marcante. Isso representa a capital Belo Horizonte?

Daniela: (Risos) Com certeza gente, aqui é muito diferente. Eu gosto muito de viajar, é uma das coisas que eu mais gosto de fazer, gosto de conhecer novas culturas, comida. Ah, gente, não sei nem o que falar, sou mineira, sou suspeita e a cozinha mineira é a melhor do mundo. Só acho que ela empata um pouco com a culinária baiana, mas eu ainda prefiro a mineira.

E como eu gosto muito de viajar, eu vejo muito como a hospitalidade do mineiro é realmente diferente. Tem uma coisa muito de família, de acolher, faz amizade na fila da padaria, na fila do banco. Fala assim: “você é filho de quem?”. Isso é muito comum e é muito engraçado que mesmo em BH, que é uma metrópole, ainda é assim. Então realmente não é lenda urbana, é verdade. O mineiro é muito hospitaleiro e eu, como autista, percebo isso maravilhosamente bem. Porque a gente tem dificuldade de manter amizade e eu percebo que o mineiro tenta manter mais amizades do que pessoas de outros países, principalmente.

Thaís: Então pergunta pro Rian, agora. Aparentemente o estado que as pessoas menos se lembram da região sudeste é justamente o Espírito Santo. Você acha que isso é verdade? E você acha que o estado é desvalorizado?

Rian: Eu acho que não só menos conhecido sudeste, talvez até menos conhecidos juntando o Nordeste e Sudeste. Eu vi até um um um comentário no Twitter esses dias, tinha um um cara e ele falou assim: “se dependesse de mim eu tirava o Espírito Santo do mapa e botava Bahia no Sudeste”. Mas assim, eu acho que realmente o Espírito Santo é desvalorizado, a gente tem muitas culturas boas aqui. Não só a questão do surf, por exemplo. Muitas pessoas também consideram, principalmente cariocas que vem morar aqui, consideram o Espírito Santo uma espécie de Rio de Janeiro 2.0, porque são culturas parecidas, no estilo de andar.

Mas acho que o estado é bem desvalorizado. Acho que as pessoas desrespeitam até muito. o Espírito Santo. É um estado que merecia mais reconhecimento. A gente citou que Minas Gerais tem uma boa culinária e a gente também tem bons pratos, como a torta capixaba. E uma das características daqui, principalmente da grande Vitória, onde eu moro, é que quem mora aqui mais tempo, todo mundo se conhece, é fácil.

E aí a variedade pra sair as vezes é pouca. A cidade é grande, mas eu destaco isso. Você vai em qualquer canto, você conhece uma pessoa e às vezes você já já dormiu na casa da pessoa mas você perde o contato e daqui um ano você olha a pessoa na rua e nem dá um oi, entendeu? Isso é muito típico dos capixabas aqui. Acho que inicialmente é isso.

Daniela: Olha, aqui em Minas, principalmente BH, era super tradicional viajar pro Espírito Santo (risos), viajar pra Marataízes, Vila Velha, eu já passei muitas férias no Espírito Santo…

Rian: Desculpa interromper, mas é bom você citar isso porque talvez a população que mais valoriza o Espírito Santo seja os mineiros, principalmente por causa da praia. Eu tenho uns parentes aqui de BH que vem aqui, eles vem aqui na praia sempre nas férias, ficam felizões cara…

Daniela: (Risos)

Rian: …ficam maravilhados com a praia, parece que a praia é ouro mesmo, entendeu? Os mineiros são os que mais assim valorizam, gostam de vir no Espírito Santo principalmente pelo espírito praiano como também outras coisas.

Daniela: E assim, muitas famílias têm casas de praia no Espírito Santo, é normal. Eu conheço várias pessoas que tem. Já passei muitos carnavais. Hoje em dia mudou, o mineiro ele vai mais pra Cabo Frio. Elegeu outra cidade agora de destino (risos).

Paulo: Como é o contato de vocês com a cultura do estado em que vocês moram?

Daniela: Como eu falei, eu gosto muito de viajar, eu vejo como a cultura está enraizada. Então, justamente viajar foi algo que me permitiu viver outras experiências e sair um pouco desse comportamento tão rígido. Aceitar, conhecer novas culturas, novas comidas. A gente tem aí com certeza a seletividade alimentar, que é algo bem comum pra quem está dentro do espectro, isso abre muito a mente. E eu acho que a partir do momento que eu comecei a ser assim, que eu me permiti viver coisas novas, a minha vida ficou muito mais leve. Então eu acho que é muito legal você manter as suas raízes, mas se permitir viver novas experiências também.

Alek: Eu tô passando por algo muito legal que eu me mudei recentemente de estado. Então, meu contato com a cultura daqui tá começando agora e tá numa fase assim muito de explorar as diferenças que tinha de quando eu morava em São Paulo para aqui no Rio. E por ser a mesma região, eu acho que tem muita coisa que é parecida, mas também muita coisa que é diferente. Então, fica aquelas brincadeiras, biscoito ou bolacha, sotaque, as pessoas reparam também. Tem hora que eu falo chiano, tem hora que eu puxo R, ainda tá meio confuso.

Aqui tem uma bebida que chama Guaravita que é muito gostosa, que é tipo um guaraná mais sem gás. E a primeira vez achei muito esquisito, mas agora eu gostei. Eu tenho visitado alguns lugares explorando, mas ainda está sendo um contato assim muito pequeno porque eu acabei de me mudar. Eu lembro também que quando eu mudei do Paraná pra São Paulo também foi uma adaptação. Aí eu mudei de região, mas eu era do Norte do Paraná então ainda era pertinho. Eu acho que se tivesse ido pro Nordeste, por exemplo, ia ter uma diferença muito maior.

Rian: Os lugares que aqui eu já conheço, as pessoas também. Às vezes é uma questão que até satura, você já tá ambientado com tudo, tanto que eu até comentei eu acho no início do do do podcast que às vezes fica chato de ir no mesmo lugar, falta variedade. No meu caso eu fico com vontade de conhecer lugares novos constantemente. Queria ter tempo, o tempo semanal pra conseguir conhecer lugares novos com com mais frequência exatamente por causa disso. Acho que eu não sei se os outros convidados, mas eu acho que quem mora em lugares pequenos ou estados pequenos, que é o meu caso, tem esse desejo.

E o Espírito Santo, em termos de sotaque, eu não eu não tenho muito. Acho que o Espírito Santo, talvez dos estados do Sudeste, seja o que tem menos sotaque. Em Minas obviamente fica bem visível, mas aqui comigo é bem de boa.

Thaís: Eu achei curioso esse ponto também que o Alek comentou de agora que ele se mudou, está ali conhecendo muitos lugares, está começando a tomar contato com a cultura local. E o oposto, o Rian tava falando como ele gosta de conhecer lugares ali no Espírito Santo, apesar de já estar lá há algum tempo.

E o que eu mais costumo ouvir é justamente que as pessoas, quando estão na sua região natal, acabam não conhecendo ela tão bem, principalmente pontos turísticos de onde você nasceu. Aparentemente é comum as pessoas não irem atrás, as pessoas que moram ali de fato. Os turistas vão mais naqueles locais às vezes do que os próprios moradores. Então eu acho bem legal que vocês exponham esse ponto de conhecer lugares novos, seja em um local no qual vocês não tem ainda muito contato quanto o local natal de vocês em si.

(Áudio do WhatsApp)

Carol: Oi, meu nome é Carol, tenho 25 anos e é bem provável que eu seja autista. Estou em acompanhamento com a psicóloga pra ter certeza. Moro aqui em Guarulhos, em São Paulo, que é a segunda cidade mais populosa do estado, a décima terceira do Brasil e a quinquagésima terceira do continente americano, contando aí um pouco mais de um milhão e quatrocentos habitantes. Nossa fundação foi em 1560 pelo Manoel de Paiva e nosso nome veio de uma tribo indígena que habitava aqui chamada Guaramomis, ou os guarus. Foi inicialmente chamada de Nossa Senhora da Conceição de Guarulhos. E o nosso nome atual, Guarulhos, só foi adotado em 1906. Aqui temos o Aeroporto Internacional de São Paulo que nada mais é que o maior aeroporto da América Latina. É isso.

Leise: Olá, pessoal. Meu nome é Leise. Eu moro em Bambuí, no interior de Minas Gerais, uma cidade com 22 mil habitantes e recebi o diagnóstico com 40 anos. E transformei minha casa numa clínica multidisciplinar. Essa clínica tem os profissionais que o autista precisa e tem o olhar de um autista pra ao mesmo tempo não deixar, não camuflarem as características autistas que não prejudicam em nada. Grande abraço.

(Fim do áudio do WhatsApp)

Thaís: E então pessoal, pra finalizar… de certa forma é a última pergunta fechada que a gente tem, mas depois a gente também abre pra outros comentários que vocês queiram trazer, como que é o acesso ao diagnóstico de autismo na região sudeste do ponto de cada um de vocês?

Daniela: Aqui a gente tem sim acesso a mais profissionais. Então a gente tem uma gama de profissionais e agora muito mais com atendimento online, a pandemia trouxe esse, digamos assim, benefício. Mas não quer dizer que são profissionais preparados, que são profissionais bons. O que eu vejo é que hoje em dia, graças a Deus, os profissionais estão se especializando mais, principalmente, autismo adulto.

Eu, por exemplo, eu fiquei 20 anos peregrinando em consultórios, eu me sentia diferente, eu não me encaixava, eu tava sempre irritada, sempre deprimida e não conseguia entender o que tava acontecendo. E assim, fui em bons profissionais, paguei, outras vezes fui pelo SUS, outras vezes fui pelo convênio. Então eu acredito que nas grandes cidades a gente tem um volume maior de profissionais sim, mas não quer dizer que sejam profissionais qualificados.

O mercado precisa ainda entender muito sobre autismo e sobre outros transtornos psicológicos, mentais, enfim. Eu senti muita diferença na minha vida depois do diagnóstico. Eu acho que os 20 anos que eu fiquei sofrendo poderiam ter sido assim menos doloridos, eu poderia ter deixado de tomar mil medicamentos que eu tomei. Mas eu acho que tudo tem hora certa também. Então graças a Deus tive acesso a bons profissionais e tenho o meu diagnóstico é isso que importa hoje. Mas eu acredito que existe ainda necessidade muito grande de especialização dos profissionais.

Rian: Eu escrevi umas matérias sobre isso recentemente. E eu entrevistei também membros aqui das associações que tem de autismo, principalmente Vitória, e eles disseram sempre: “a gente está buscando essa especialização”, mas nada é esclarecido. Então nesse caso acho que tem muito… digo especificamente no Espírito Santo, mas pode ser considerado no Brasil. Mas já adiantando essa questão do diagnóstico, no meu caso não fui eu que agendei, que tinha essa de desconfiar, foi minha mãe na época. Eu era adolescente ainda, e isso há cinco anos, pelo fato de eu ter tido problemas de fala e ter começado a falar de forma bem tardia, aos 4 anos de idade, foi aí que ajudou.

Demorou, mas saiu o diagnóstico. Diagnósticos tardios no nosso mundo de quem tá no espectro não é algo raro, se tornou algo assim bem constante nos em programas que falam abertamente sobre o autismo. Eu recebi o diagnóstico muito bem, sem nenhuma resistência, não tanta surpresa e não com muito medo assim de preconceito. Óbvio que eu ainda não falo pra qualquer pessoa, por exemplo, que eu tenho autismo ainda por causa do capacitismo, entendeu?

Eu ainda vejo que a nossa luta ainda de pessoas com deficiência no geral, não só autistas, ainda não é uma causa social assim como homofobia, machismo, que já tem um tratamento bem maior, um conhecimento bem maior. Então ainda assim evito as vezes falar com ignorantes desse fator, falar abertamente isso. Mas sempre falo com uma pessoa assim com uma maior facilidade que a gente tem autismo. Acho que esse diagnóstico foi uma coisa que também me fez compreender várias dificuldades que eu tinha, ainda mais de depois que você descobre um um transtorno ou um diagnóstico tão tão impactante como esse.

Alek: Eu acho que uma coisa que ajudou no meu caso foi profissionais que estavam fazendo pós ou especialização ou eram recém-formados que muitas vezes, por exemplo, uma neuropsicóloga que eu fui, ela não era daqui, ela era da região centro-oeste, era de Brasília e ela foi até São Paulo pra fazer a pós dela. E aí como ela estava nesse processo ainda de finalização da pós, ela cobrava um valor bem mais acessível. Eu acho que isso tá perto de vários núcleos de faculdade, de tudo mais, acabam surgindo muitos profissionais que são mais acessíveis mesmo do que outros profissionais mais especializados. Eu acho que isso foi um dos fatores que me ajudou e que eu imagino que deva fazer muita falta, assim, se você só tiver a opção do profissional que cobra muito caro ou o SUS, que a gente sabe que infelizmente as filas são muito longas e é difícil você encontrar um profissional minimamente preparado.

No particular já é mesmo realmente como falaram, infelizmente a informação sobre o autismo ainda é muito cheia de estereótipos e muitas vezes os próprios profissionais não sabem como reagir, como identificar. Então eu acho que o fato de estar próximo a esses núcleos de muitas universidades e tudo mais foi algo que favoreceu.

Paulo: Sim, realmente. As principais universidades estão na região e, por terem mais profissionais, obviamente você acaba achando com mais facilidade um profissional minimamente especializado ali. Em algumas cidades e aí eu encaixo as médias aqui da região, são cidades que não são tão ricas quanto São Paulo, mas tem também uma população mais enxuta, e algumas mantém alguns programas municipais de suporte a autistas. Onde eu moro mesmo eu tenho que ir pra cidades vizinhas, vou a profissionais, mas pelo menos é uma viagem aí de meia hora, de 20 minutos, meia hora pra chegar.

Muito obrigado, gente, pela conversa, por compartilharem essas vivências fora do eixo Rio e São Paulo, principalmente. E deixem uma mensagem final.

Daniela: Bom gente, eu amei participar. Queria convidar quem não me segue ainda, eu tenho uma página no Instagram Vida de Autista e também um canal no YouTube com o mesmo nome, então me segue lá e sempre compartilho minha vida, então por isso que chama Vida de Autista. Eu particularmente descobri depois dos 40, então precisei lidar com todo esse mundo novo que surgiu na minha frente e aí eu troco exatamente essas experiências, conto como foi que me descobri autista depois dos 40, então falo da vida profissional, pessoal, relacionamento interpessoal e relacionamento afetivo. Então eu acho muito importante falar desses temas do cotidiano e é o que eu falo no meu. E coloco algumas coisas engraçadas também, porque eu acho que a gente tem que levar a vida com bom humor.

Então, sempre falo também que vale a pena buscar o diagnóstico em qualquer que seja o momento da sua vida. Então, não importa o que você está passando, se você está casado, solteiro, se você tem 20 anos, 50 anos, 60 anos, você saber quem você é de verdade abre um oceano de possibilidades. E eu queria deixar uma frase que eu li outro dia que virou a frase que eu vou levar pra minha vida. Pra gotas de medo, um oceano de coragem. Então que a gente tenha coragem de ser quem a gente é de verdade, não importa a circunstância. Então eu queria deixar essa frase aí pra vocês.

Rian: Eu gostaria de agradecer primeiramente o convite. Eu sou bem low profile em redes sociais como Instagram e no Twitter por exemplo. E queria incentivar quem sempre quem ainda tem dúvida, sempre buscar casos de desconfianças, buscar o diagnóstico, buscar ajuda também . A terapia especializada foi uma questão que me ajudou muito nesse processo pós-diagnóstico, continua ajudando sempre e é isso. Reitero aqui meus agradecimentos e o convite, até breve.

Alek: Queria agradecer também pelo convite, foi muito legal estar aqui participando e falar que quem quiser me acompanhar mais da na minha aventura de mudança de estado, faculdade nova e tudo mais, eu tenho postado no Instagram Autista na Med e eu falo sobre como que tá sendo essa adaptação na faculdade e sobre o autismo em si.

Tento mostrar que existem artistas em todos os lugares e o diagnóstico não é uma sentença. Pelo contrário, é algo que liberta a gente pra ser a gente mesmo e acho que é isso.

Thaís: E não percam na semana que vem o último episódio da série de regiões, o nosso episódio sobre a região Sul. Falou pessoal, até mais.

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Equipe Introvertendo Escrito por: