Introvertendo 220 – Autistas da Região Centro-Oeste

Com uma mistura do clima seco do cerrado, a peculiaridade do pantanal e o movimento urbano, a região Centro-Oeste guarda contradições e singularidades. Neste episódio, Luca Nolasco e Otávio Crosara recebem Enã Rezende, do Mato Grosso, Jéssica Borges, do Distrito Federal, e Murilo Ferraz, de Goiás. Os três abordam desmatamento, agronegócio, o impacto sensorial das comidas típicas e acesso ao diagnóstico de autismo na região centro-oeste. Arte: Vin Lima.

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Transcrição do episódio

Luca: Sejam bem-vindos ao podcast Introvertendo, um podcast sobre autismo. Hoje sou eu, Luca Nolasco, que vou apresentar.

Otávio: Eu sou o Otávio Crosara, o seu co-apresentador neste episódio do Introvertendo.

Luca: O tema hoje é o títulos da região Centro-Oeste e conosco temos alguns participantes.

Enã: Meu nome é Enã Rezende Bispo do Nascimento, sou médico e autista. No momento estou trabalhando na linha de frente na UTI Covid. Recebi o diagnóstico aos 18 anos, hoje eu estou com 30 anos de idade e moro em Cuiabá, no estado do Mato Grosso.

Jéssica: Oi, eu sou a Jéssica Borges, sou educadora, profissional da inclusão, sou uma mulher autista, mãe de um garotinho autista também. Eu sou daqui de Brasília, nascida e criada aqui no Distrito Federal. Sou diretora do Instituto Lagarta Vira Pupa e tô muito feliz aqui com vocês hoje.

Murilo: Oi, eu sou Murilo Ferraz, sou natural de Jataí, no interior de Goiás e hoje eu moro em Goiânia. Eu sou formado em Ciências da Computação, tive um podcast de filosofia, o Filosofia Pop. Aí depois eu fiz uma especialização em comunicação e eu fui diagnosticado com autismo em 2020, se eu não me engano. Eu tenho hoje 35 anos.

Luca: Valendo sempre lembrar que o Introvertendo é uma produção da Superplayer & Co e feito por autistas.

Bloco geral de discussão

Luca: O Centro-Oeste, principalmente nas últimas décadas, ficou muito atrelado à questão do agronegócio. Onde vocês vivem ou cresceram, essa imagem do agronegócio era muito forte?

Enã: Com certeza. O agronegócio é praticamente é o que movimenta a economia do Mato Grosso e aqui acabamos tendo muito contato com pessoas relacionadas ao setor agropecuário.

Jéssica: A crescente do agronegócio aqui no Distrito Federal e arredores tem um incentivo de planos governamentais e o interesse com foco na agropecuária, mas eu gosto muito de falar da intersecção desse debate do agronegócio com os povos originários, que são os povos que estão a frente dessa discussão do meio ambiente, porque são quem está na linha de frente dessa dessa batalha e contra o agronegócio. Mas eu acredito que especificamente dentro da cidade não tanto, mas ao redor do Distrito Federal, ali a caminho da Chapada indo pra Goiânia, você já vê a crescente dessa expansão.

Luca: Principalmente nos últimos nos últimos 10 anos eu imagino que isso deve ter sido muito perceptível.

Jéssica: Com certeza. A gente tem aí também até dados. Do tamanho da vegetação do cerrado que é a vegetação de onde a gente está eu e os outros colegas aqui. Acredito que algum não, mas a gente observa isso com os dados do IBGE, com os dados que tem saído com relação ao desmatamento dos próprios biomas aqui, a vegetação do cerrado é o bioma que eu acompanho e a gente já tá 50% de perda desse dessa vegetação original por exemplo.

Murilo: Não tem como negar que o agronegócio é muito importante aqui em Goiás e na região centro-oeste toda. Mas como eu nasci e cresci no interior do estado e depois vim pra pra Goiânia, já estou aqui em Goiânia já desde 2004, eu tenho muito tempo que eu tô aqui em Goiânia. Eu acho que tem uma diferença grande assim, eu acho que tem até uma certa emulação do jeito dessa coisa sertaneja universitária, assim, do pessoal, que não acho que o contato não seja tão direto assim não. Mas o pessoal no interior, eu acho que é bem mais forte.

Otávio: A região Centro-Oeste é a única região do Brasil que não tem litoral. Nossos invernos são secos. Como é a relação de vocês com o ambiente e com o clima do Centro-Oeste?

Jéssica: Como eu sou nascida e criada aqui, eu gosto bastante. A gente acaba se acostumando ao lugar que a gente vive. Eu tive uma criação antirracista e uma criação indígena, minha família paterna é indígena, então eu sinto muito forte essa conexão com a natureza, com o clima. A gente não pode deixar de negar que essa época, época de inverno, é época que eu gosto de dizer que o cerradense sofre porque é uma época muito seca.

Eu particularmente gosto do clima mais frio, não gosto do tempo seco como é aqui porque a gente sofre principalmente quem tem questões sensoriais, quem tem alergia, sinusite, essas coisas, enfim. Mas eu já estive em outros estados e apesar de gostar do clima desses outros estados, eu tenho um apego forte com o que eu construí aqui, eu acredito até pela questão do afeto do lugar, do cheiro, do ambiente, mas eu não tenho tanta afeição pelo clima que a gente tá vivendo nesse esse momento, esse clima de secura porque ele faz com que a gente sofra. Mas eu entendo também que as estações estejam mais rígidas aqui no Centro-Oeste em virtude do aumento do desmatamento.

Murilo: Bom, eu aqui com o clima aqui do Centro-Oeste eu sofro o tempo todo aqui. Eu sou o único goiano, o único aqui em Goiânia, que gosta quando faz uma semana de frio aqui que faz em Goiás. Eu nasci lá em Jataí, e Jataí é a cidade mais fria aqui de Goiás. Então era um lugar que pra mim eu acho que era melhor. Mas eu sinto muito incômodo assim no calor. A minha pressão abaixa, eu fico cansado, não gosto nada de estar num tempo muito num clima muito quente assim não. E aqui não faz frio quase nunca. Então praticamente o ano inteiro é ruim para mim aqui.

Enã: Eu sou nascido no Paraná, no entanto eu já moro no Mato Grosso há uma uma boa parte do tempo da minha vida. E assim, principalmente nas regiões Sul e Sudeste nós temos o costume de ver as estações mais bem definidas. No centro-oeste acaba não sendo muito bem assim. Tanto que a gente até brinca, a gente fala que é seca ou chuva. Tem o período da seca que praticamente não chove ou quando chove é muito pouco, no entanto você tem o período do final do ano que é o período do verão no hemisfério sul que é marcado pela chuva. Aí chove praticamente todos os dias. São aquelas chuvas marcadas por temporais.

Aqui em Cuiabá mesmo onde eu moro é praticamente uma cidade conhecida pelo calor que faz. Quando eu me mudei para Cuiabá em 2009, nos primeiros dias todo dia eu tinha dor de cabeça que eu associei ao calor. Hoje eu já me acostumei com o calor daqui. Mas como a Jéssica mesmo disse, o aumento da temperatura também está relacionado com o desmatamento.

Porque antigamente Cuiabá era uma cidade muito mais arborizada, isso fez com que a cidade fosse conhecida como uma cidade verde. As pessoas mais antigas daqui de Cuiabá mesmo diziam que antigamente era bem mais fresco. Aí como derrubaram boa parte dessas árvores e concretaram, o clima é muito mais quente.

E assim, o frio quando faz é pouco tempo. Nosso inverno só dura três dias, depois acaba. Antigamente eu preferia mais o frio. Hoje em dia nem frio nem calor. Eu prefiro um clima mais ameno, de temperatura ambiente.

Murilo: O problema é definir o que é temperatura ambiente (risos). Aqui pros goianos a hora que está 26 graus o pessoal já está com blusa de frio, já está falando que está muito frio. Aí pra mim um pouquinho mais frio é bom. Agora eu nunca passei muito tempo em uma temperatura muito baixa tipo temperaturas negativas ou muito próxima de 0. Lá em Jataí fazia assim um dia de madrugada fazia perto de 0 assim, 3 graus, 2 graus, mas é pouco tempo.

Então assim, eu também concordo. Eu gosto de temperaturas mais amenas, mas o que é temperaturas amenas pra mim e pro pessoal é: “nossa, tá frio demais” (risos).

Enã: É verdade.

Luca: Pra quem não é da região centro-oeste e está escutando, a Jéssica não estava exagerando quando disse que o clima da região centro-oeste é desértico. Óbvio, na maior parte do ano não, mas assim principalmente em agosto, setembro e principalmente no Distrito Federal onde ela mora às vezes a umidade um pouco mais baixa do que a do deserto de Saara. Então eu acho que ela não não estava exagerando nessa parte.

Jéssica: Sim é engraçado porque quando eu vou para estados que a umidade é mais alta o corpo acaba sofrendo, porque eu já acostumei, apesar de sofrer com a umidade com a baixa umidade daqui. Mas essa época, por exemplo, a gente gosta até de brincar aqui no Distrito Federal que o Calango do Cerrado sofre, porque a boca começa a rachar, o nariz fica seco, fica com aspecto de terra, a vegetação fica queimada, o clima fica bem seco mesmo, a gente olha pro horizonte assim e parece que em algum lugar tá pegando fogo, mas é só o clima seco mesmo e a terra.

Enã: E assim, nesse tempo, nesse tempo de seca do Centro-Oeste, um grande problema pra nós autistas e também pra quem não é autista, aliás pra todos no geral são as queimadas.

Jéssica: Exatamente.

Enã: Aumenta o número de casos de problemas respiratórios.

Jéssica: Mas a gente sabe assim que a gente tem os queimadas que são as queimadas que acontecem naturalmente em virtude da estação da época.

Enã: Uhum.

Jéssica: Mas a gente tem o aumento e a potencialização dessas queimadas em virtude do pessoal que potencializa o fogo mesmo. Ali a gente tira, por exemplo, na Chapada. As queimadas naturais da Chapadas elas não eram pra acontecer como elas acontecem atualmente, mas isso é uma forma do pessoal da agropecuária conseguir aumentar o espaço de trabalho deles. Então tem todo o manejo político por trás também da situação das queimadas nessas regiões aqui dos arredores.

(Áudio do WhatsApp)

Larissa: Olá pessoal do Introvertendo meu nome é Larissa, tenho 37 anos, moro em Brasília e fui diagnosticada muito recentemente. Queria falar sobre algumas vantagens e desvantagens de morar na capital do país pra uma autista. Bom, a principal vantagem eu acredito que é o fato o Plano Piloto ser um plano cartesiano. Então é muito fácil se localizar aqui, as ruas não tem nomes, são só números e letras e eu acho isso maravilhoso. Eu queria que toda cidade fosse assim porque essa questão da localização pra mim sempre é um problema e aqui isso não acontece.

Aqui tem muitos espaços verdes, é muito arborizado e não tem aquele excesso de informação visual, aquele monte de prédio amontoado que tem na maioria das cidades grandes. Então eu acho que isso evita aquele excesso de informação visual que de vez em quando faz a gente sofrer um pouco.

E bom, a maior desvantagem é que Brasília tem o pior transporte público da galáxia e é uma vergonha, é uma vergonha a capital do país ter esse transporte público tão ruim. Então, pra quem não gosta de dirigir ou tem dificuldade com volante, Brasília é complicado. E antes que eu me esqueça, parabéns pelo trabalho de vocês. Eu estou maratonando e gostando bastante.

(Fim do áudio do WhatsApp)

Luca: Eu quero saber como que o autismo de cada um de vocês se relaciona com questão cultural, questão de comida. Aí eu começo pelo Enã.

Enã: Eu sou meio suspeito pra falar porque eu amo culturas, eu amo conhecer novas culturas, experimentar novos sabores. E aqui no Mato Grosso temos muitos rios e a cultura gastronômica aqui é bem conhecida pelo peixe. Pra quem mora em Cuiabá, tem até uma frase que o pessoal aqui sempre fala, que se você vir para Cuiabá e comer cabeça de pacu, você sempre acaba voltando.

Eu nunca comi cabeça de pacu, mas todas as vezes que eu saí eu acabei retornando pra cá. E temos muitos pratos típicos também como Maria Isabel, o arroz carreteiro, e também o tal do agridoce, que nem a banana na farofa, famosa farofa de banana. Particularmente assim, eu sou meio eu acho que a única coisa que eu sou é com paladar. Que assim, eu não gosto de doce com salgado, eu gosto de doce com doce, salgado com salgado. Mas assim, no geral eu me adaptei muito bem com a culinária típica daqui.

Murilo: Aquelas listinhas que tem de pessoal faz teste na internet: “se você não comer mais de mais de 6, seu paladar é infantil”. Eu devo marcar assim por baixo uns 20, 25.

Jéssica: (Risos)

Murilo: E aqui em Goiás é a pamonha que o pessoal gosta. E eu tenho problema com alimento que tem um cheiro muito forte. Eu não gosto de queijo, essas coisas, eu não gosto de nada que tenha um cheiro muito forte de milho, cheiro e gosto muito forte de milho também. Então não como pamonha, não como nada dessas coisas que tem aqui de comidas típicas aqui de Goiás. E a guariroba também que o pessoal gosta, que o pessoal chama de gueroba, que é um palmito amargo que o pessoal come aqui, que eu também não gosto, eu não gosto nada amarga. Muito difícil comer alguma coisa amarga.

Pequi eu gosto! Eu gosto de pequi. Mas eu não como muito. Se tiver, eu gosto quando quando faz aquele caldinho que fica ali junto do pequi e gosto de colocar no arroz e tal e pegar uns dois ali no máximo está bom pra mim. Mas eu gosto, pequi eu não tenho problema não. Então eu tenho um pouco de dificuldade sim com a culinária aqui de Goiás. Mas aquele básico assim, o arroz, o feijão e a carne, eu gosto muito e como bastante, mas com essas coisas típicas eu não dou muito bem não (risos).

Jéssica: Ai, eu adoro pequi (risos).

Enã: Eu também! Eu amo pequi.

Jéssica: Eu já ia perguntar o que é gueroba, mas que bom que cê me explicou. Também tenho dificuldade com comidas amargas (risos).

Murilo: (Risos)

Jéssica: Agora já eu aqui no Distrito Federal é muito engraçado porque as pessoas falam que a gente tem um sotaque, que a gente tem uma cultura e tudo, mas a cultura do DF foi construída a partir da migração de pessoas de outras regiões. O Distrito Federal é uma região muito plural, tem muita gente de vários estados. Eu acho que a maioria das pessoas que habitam no Distrito Federal não são daqui. É a cidade conhecida como a capital do rock e eu gosto bastante dessa parte da cultura, inclusive eu acho que moldou um pouco a minha adolescência esse contato com o rock desde cedo, porque aqui a cultura do rock é muito forte ainda, é bem presente.

E quanto às comidas típicas, eu sou filha de baianos. Meu pai e minha mãe. Meu pai veio com a tradição indígena da minha família paterna, minha mãe não é indígena, mas ela trouxe é a cultura da Bahia e aí é uma junção porque em Brasília chega de tudo. A gente tem um ponto turístico aqui que se chama Torre de TV e lá você consegue conhecer um pouco da culinária de vários estados.

Então eu gosto das comidas típicas ali de Goiânia, da Bahia. Eu não como muitas coisas tradicionais lá da Bahia como acarajé, mocotó, essas coisas eu não consigo comer por conta das minhas questões sensoriais. Mas como aqui chega de tudo, pamonha, Maria Isabel, essas carnes exóticas, caldos, arroz com pequi, tem algumas delas que eu como sim que eu gosto.

Por exemplo, quando é época de festa junina eu adoro, tenho algumas comidas típicas dessa época que eu gosto, mas eu acredito que a gente não tenha assim um prato típico que representa o Distrito Federal justamente por conta dessa junção aí da cultura de vários outros estados das pessoas que vieram pra cá.

Otávio: Nós falamos do Centro-Oeste, do clima, da pecuária, da agricultura, mas não falamos sobre o diagnóstico de autismo no centro-oeste. Como que foi pra vocês serem diagnosticados aqui no centro-oeste?

Jéssica: Brasília é uma cidade relativamente cara. Ela tem um custo de vida alto e assim como os outros estados, o trabalho que eu faço através do Instituto Lagarta Vira Pupa me coloca em contato com diversas frentes de outros estados com mães, familiares, pessoas autistas de outros lugares. Eu percebo o lastro do sucateamento do SUS porque quando a gente fala acesso, a maioria da população que é a população que vive sem plano de saúde, a falta de acesso aqui não é tão diferente dos outros lugares, São Paulo, Rio de Janeiro. Goiânia, aqui perto, região do sul, por exemplo pro Rio Grande do Sul, o acesso tá defasado.

Eu tive o diagnóstico com 28 anos, hoje eu tô com 30, meu diagnóstico só veio depois do diagnóstico do meu filho. Tanto por falta de acesso, tanto porque eu também sou usuária do SUS e a gente sabe que o SUS hoje tá bem sucateado, são anos na fila. Conheço pessoas aqui em Brasília que estão há três, quatro anos e ainda não conseguiram uma consulta com um psiquiatra pra tentar fazer uma avaliação diagnóstica. Então eu penso pelo trabalho que a gente tem desempenhado através do Instituto que a realidade do Distrito Federal quando se trata de acesso a saúde de qualidade, intervenções de qualidade e até educação inclusiva de modo geral tá como os outros estados também.

Murilo: Eu não tenho muita participação na comunidade do autismo, eu não não sou não muito integrado na comunidade e dessas discussões. Então, eu não posso dizer muito sobre como é a situação em geral, eu não tenho tanto conhecimento. Mas posso falar como foi o meu processo de diagnóstico. Eu fui diagnosticado há dois anos mais ou menos. Eu acho que pra mim foi mais fácil o diagnóstico agora porque eu trabalho na universidade. Eu trabalho na UFG aqui, então eu tive um encaminhamento melhor. Mas, por exemplo, sobre o acesso ao SUS como a Jéssica falou, mesmo pra não tá não tá buscando isso no SUS, eu tem plano de saúde, eu tive que buscar tanto o diagnóstico, quanto o acompanhamento psicológico, eu tô fazendo particular.

Pelo menos, pra mim, assim, experiência do que, do que o plano de saúde me oferece, é muito ruim pra você conseguir principalmente psicólogo, acompanhamento com psicólogo é muito complicado com plano de saúde. Mesmo tendo plano de saúde, estou fazendo particular. Eu acho então que é bastante complicado o acesso ao diagnóstico, mas eu não tenho como falar no geral, tenho que falar mais como é no meu caso.

Enã: Eu tenho amizades e converso com autistas do Brasil inteiro. E aí eu consigo perceber que os problemas que enfrentamos aqui no Mato Grosso acabam sendo semelhantes com os problemas em outros estados do Brasil. Eu posso falar tanto como médico como paciente por atender na atenção básica. Infelizmente, pra gente conseguir profissionais, para conseguir aquelas terapias que melhorem a qualidade de vida pelo SUS tem sido difícil. E assim, como médico também, eu já atendi crianças autistas e assim, pra essa criança conseguir o acesso a terapias como equoterapia, hidroterapia, todo ano eu tinha que fazer um laudo dizendo que a criança era autista e que precisava dessas terapias. E assim, uma coisa que eu não entendia, por que que eu tenho que fazer laudo todo ano sendo que o autismo a pessoa tem a vida toda? A pessoa nasce autista e a pessoa morre autista. Então ainda assim é umas coisas que precisam mudar.

No entanto, no Mato Grosso, nós tivemos um grande avanço com o projeto Autismo na Escola, onde podemos visitar as escolas do estado, levando informações sobre o autismo. E foi algo que virou um projeto do governo é a distribuição das cartilhas sobre o autismo  que será distribuído em todas as escolas do Mato Grosso. Estamos avançando bastante na pauta da educação e da conscientização sobre o autismo.

Jéssica: Legal, eu acho que é porque se a gente for falar dessa questão do acesso ao diagnóstico, a gente tem um abismo. A gente nunca vai chegar lá na raiz basicamente porque é falta de preparo, falta de formação continuada, falta de acesso. Eu acredito que o SUS é bom, ele precisa de investimento e acredito que se os profissionais que estão lá tivessem formação continuada, tivessem uma capacitação, treinamentos periódicos, muitas coisas seriam diferentes.

Eu acredito ainda que faltam muitas coisas pra melhorar e outros aspectos que demandam discussão, mas eu penso que a raiz do problema pra todos nós da falta de acesso está ligada ao capacitismo que eu enxergo como o topo ali da opressão que a gente enfrenta enquanto autistas. E aí se a gente for fazer as interseccionalidades, se é preto, indígena, LGBT, as coisas ficam ainda mais difíceis, mas eu acredito que a gente ainda tenha muito que avançar em todas as esferas desse tema.

Luca: Gente, eu já vou puxar aqui pra encerrar e vou dar um espaço pra cada um de vocês dar um recado, deixar uma mensagem. Dizer essencialmente o que quiser.

Enã: Eu queria agradecer pelo convite para participar desse podcast. Eu gostei bastante. Uma imensa honra poder conhecer vocês, poder conhecer os convidados. Fiquei feliz. O escritor português Fernando Pessoa tem uma frase que eu gosto muito que “Pedras no caminho? Guardo todas, um dia vou construir um castelo”. Apesar das dificuldades, nunca desistam. Sempre que cairmos vamos tentar levantar, vamos tentar levantar a cabeça e vamos seguir em frente. Muito obrigado por tudo.

Jéssica: Quero agradecer a oportunidade de estar aqui com vocês hoje. Eu acho que sendo a única mulher desse espaço está sendo bem representativo. Falar sobre autismo em qualquer momento é sobre a gente lembrar daqueles que acham que essa luta não diz respeito. Eu tô nas redes sociais e também no Lagarta Vira Pupa e é isso, até mais.

Murilo: Quero agradecer muito aqui o convite, foi muito legal ter essa conversa aqui com vocês. Eu quero mandar um beijo Ana Luiza, minha namorada, que ela é ouvinte de vocês aqui, ela ouve sempre todos os episódios e falar pra vocês seguirem o perfil dela no no Instagram que é o Histórias de Uma Dita, que fala sobre histórias da sobre a ditadura militar. Eu acho que é muito importante a gente relembrar essas histórias aí.

Então quero agradecer muito a oportunidade de participar e eu acho que a gente tocou aqui em assuntos muito importantes, de coisas que tão acontecendo agora no Brasil também que se relacionam com o desmatamento, com respeito aos povos indígenas, e eu quero falar também que eu tenho esperança de que a gente vai passar por esses problemas maiores aqui do Brasil e que em breve a gente vai estar melhor. E obrigado a todos aí. Um abraço.

Otávio: Semana que vem teremos o episódio do Sudeste apresentado pela Thaís. Não percam.

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