Introvertendo 213 – Dislexia e Autismo

Neste episódio, Tiago Abreu recebe a fonoaudióloga Beatriz Verzolla e o pesquisador Tito Aureliano para uma conversa sobre as intersecções dos diagnósticos de autismo e dislexia: como e quando esses dois quadros estão juntos? Como se dá a avaliação e o diagnóstico? Quais os impactos de uma descoberta tardia da dislexia e do autismo? Essas e outras perguntas são respondidas nesta conversa. Arte: Vin Lima.

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Transcrição do episódio

Tiago: Um olá para você que ouve o podcast Introvertendo, que é o principal podcast sobre autismo do Brasil. Meu nome é Tiago Abreu, sou jornalista, um dos integrantes aqui do Introvertendo, também autista e uma das coisas mais legais deste ano de 2022 é que a gente está fazendo agora episódios falando sobre alguns diagnósticos para além do autismo que muitas vezes estão relacionados ao autismo. E agora nós vamos falar sobre dislexia e temos dois convidados que são muito mais gabaritados pra falar sobre isso do que eu.

Beatriz: Boa noite, meu nome é Beatriz, eu sou fonoaudióloga, tenho bastante experiência no atendimento de pessoas autistas, desde a infância até a vida adulta e eu também sou esposa de uma pessoa autista.

Tito: Eu sou o Tito Aureliano, eu tenho diagnóstico tanto de autismo quanto de dislexia. E vim aqui compartilhar um pouco como é a sensação de viver nesse mundo assim.

Tiago: O Introvertendo é um podcast feito por autistas com produção da Superplayer & Co.

Bloco geral de discussão

Tiago: Então, hoje a gente tem uma conversa sobre dislexia e eu quis principalmente chamar o Tito porque eu ouvi um pouco sobre a história dele no episódio do podcast Lógica Autista, que é um pessoal muito gente boa, recomendo demais, o link deles vai estar na descrição do episódio lá no nosso site. E no episódio eu lembro que você falou lá Tito que o seu diagnóstico de dislexia veio antes do autismo. Então eu queria saber um pouco como foi esse processo, porque não é algo muito comum de eu ouvir falar.

Tito: Pois foi exatamente isso. Só pra dizer, eu tenho 32 anos e cresci em Brasília. Eu acho que a ciência avançou muito. A medicina avançou muito e a psicologia avançou muito ao longo dessa última década. Eu entrei na faculdade a primeira vez em 2008. E logo em 2009, 2010, mesmo com muito estudo, eu sempre fui muito CDF, muito nerd. Eu tinha uma dificuldade absurda de conseguir passar nas provas da faculdade. E a didática no curso que eu fiz foi geologia, pegava muito curso de física, de matemática avançada e o método das provas, o tempo que eu tinha, tudo isso eu via que não selecionava, não me favorecia. A capacidade que eu tinha, os tipos de avaliação.

E aí eu comecei a me dar muito mal nas provas, principalmente quando tinha que ter alguma interpretação social no meio e tal. E aí eu casei muito cedo, comecei a namorar e casei cedo e a minha esposa estudou muito didática e nessa parte didática ela lembra de ter estudado ela sempre teve uma atenção muito grande nesses transtornos de aprendizagem e tal. E aí ela levantou essa questão de eu ter alguma coisa. Mas eu já suspeitava com a quantidade de reprovações que eu estava acumulando.

Eu nunca tinha reprovado na minha vida. E às vezes eu tirava dez nas provas. Eu era um aluno mediano, mas o tempo que eu estudava era pra tirar dez em tudo. Minha vida sempre foi estudar, pesquisar, fazer tudo isso. Então, eu comecei a ir atrás de profissionais que tentassem me mostrar o que é que eu tinha. Eu suspeitava que fosse, sempre suspeitei que eu era “levemente autista”, mas eu não tinha dinheiro suficiente pra ir em profissional especializado em Brasília. E a minha vida deu uma reviravolta. Eu tive que mudar de cidade, mudar de faculdade e fui seguindo a vida.

Até conseguir um profissional já foi com 24 anos, que eu consegui um dinheiro pra conseguir um profissional que conseguiu fazer um diagnóstico de dislexia, depois de muitos testes de dislexia com comorbidades indeterminadas. Na época não tinham levantado a possibilidade de TEA nem de outras coisas, mas o que foi levantado foi disortografia, que está associado com problema de coordenação que eu tenho terrível. Eu sou todo quebrado, cara. Eu quebrei todos os dedos da minha mão já.

Tiago: Caramba. 

Tito: E quebrei pernas subindo rocha atrás de fóssil e tudo isso mudou muito a minha vida. Esse diagnóstico com 24 anos, eu pude começar a correr atrás dos direitos. Mas essas comorbidades indeterminadas foi quando deu o gatilho de falar assim: “cara, será que eu sou autista?”. Foi a partir daí que eu comecei a procurar profissionais também, mas aí demorei mais uns seis anos até conseguir encontrar um profissional que eu pudesse pagar, né? Porque pelo pelo setor público que eu estava indo a fila de espera era grande, passei por uns três estados procurando e não consegui.

Então pelo menos a dislexia eu consegui saber e o que me salvou na graduação foi isso. Não pela minha limitação intelectual e cognitiva. Eu tenho um QI mapeado até alto geral. Mas eu preciso de um ecossistema na hora de fazer prova diferenciado pra eu conseguir mostrar que eu posso, entendeu? Até o tipo de prova eu sou melhor escrevendo um artigo científico internacional do que uma prova comum básica de escrever, entendeu?

Então eu eu publiquei artigos na graduação, até internacionais, mas eu reprovava bastante. Então é incrível, né? O contraste que dava na dislexia. É um negócio complicado. Mas a sorte é que a gente tem uma profissional aqui que as pessoas pra explicar melhor.

Tiago: E eu acho muito interessante o que você falou, principalmente sobre o contraste de conseguir uma publicação internacional, mas ao mesmo tempo reprovar nas disciplinas. É algo que instintivamente as pessoas não conseguem explicar o que que há, o que ocorre. Então, talvez algumas pessoas tenham até chegado de paraquedas esse episódio e estejam se perguntando o que é dislexia. E eu acho que a Beatriz é a melhor pessoa pra conceituar pra gente o que é isso.

Beatriz: A dislexia está classificada dentro dos transtornos específicos de aprendizagem que incluem dificuldades na leitura, dificuldades na escrita ou dificuldades na matemática. Pensando na dislexia, a gente tem aí basicamente uma dificuldade na aquisição e no desenvolvimento da leitura que pode vir associada também com dificuldades na escrita e outras condições associadas.

Então se a gente for pensar basicamente no processo de aprendizado da leitura, a gente tem de forma simplificada dois mecanismos principais que estão envolvidos nesse processo de leitura. Que é a decodificação, que significa basicamente a gente transformar, ter contato com aquele código escrito e transformar isso em algum outro código que a gente já conhece. Então, pensando aí numa sucessão entre oralidade é traduzir, decodificar aquele código escrito para um outro código que a gente já conhece.

E um outro mecanismo que é o mecanismo de compreensão efetivamente do que a gente leu. Não basta só a gente traduzir aquele código decodificando, mas também compreender o que a gente lê, o que daí implica várias relações contextuais com tudo que a gente já tem de conhecimento de mundo, tudo que a gente relaciona com as nossas experiências pra que a gente compreenda esse processo de leitura.

Na dislexia, a gente tem principalmente uma dificuldade no processo de decodificação. Em muitos casos, a gente tem uma compreensão oral muito boa, se alguém lê o texto pra essa pessoa, a pessoa consegue compreender, mas na hora de decodificar existe uma dificuldade e que daí consequentemente pode gerar uma dificuldade na compreensão porque houve essa dificuldade para decodificar essa mensagem. E isso pode trazer diferentes repercussões, não só pensando em termos de leitura ou academicamente pensando na disciplina do português, mas em outras disciplinas também porque envolvem processos de leitura e descontificação.

Então aí a gente vai ter questões muito relacionadas com o processamento de informações fonológicas que envolvem a manipulação dos sons, como é que a gente manipula mentalmente os sons conscientemente, como a gente acessa esses sons lá no nosso repertório linguístico e faz a associação desses sons as letras que a gente chama de associação fonema-grafema, que é associar sons, as letras.

Então tudo isso além de uma questão de memória de trabalho, memória operacional, que é a gente processar diferentes estímulos enquanto a gente tá em processo, que é algo que a gente faz muito processo de leitura, né? A gente faz essa associação dos sons com as letras e ao mesmo tempo a gente vai gravando, vai mantendo as palavras na nossa cabeça até a gente finalizar a leitura por completo. E aí a gente precisa resgatar o que a gente leu anteriormente e seguir nesse processo leitura, mantendo tudo ali em na nossa cabeça até a gente finalizar o processo, pra depois decodificada toda aquela mensagem fazer outras associações pra compreensão.

Então a leitura, o aprendizado da leitura, é um processo muito complexo. Diferente se a gente for pensar num típico em relação à fala ou em relação a andar. Isso acontece naturalmente no processo de desenvolvimento típico, a gente não precisa de uma instrução formal. Diferente do processo de aquisição de leitura e escrita, que é necessário um ensino formal para que esse aprendizado aconteça e se concretize. E aí muitas áreas cerebrais da área de linguagem precisam ser reorganizadas para dar conta daqueles processos. Por isso que a gente diz que não é um processo simples. Então muitas dificuldades aí durante esse processo de aflição podem gerar repercussões ao longo da vida da pessoa.

Tiago: Beatriz, uma dúvida no seguinte sentido: Existem alguns diagnósticos que eles muitas vezes tem uma relação com o autismo não necessariamente no sentido de características, mas do fato de muitas vezes estarem acompanhados dentro do quadro familiar, às vezes tem uma pessoa que tem um diagnóstico, tem um familiar, que tem um mesmo diagnóstico ou filhos e etc, como é o caso por exemplo do autismo e TDAH. Eu queria saber: existe uma relação entre dislexia e autismo nesse sentido? Ou alguma relação em termos de características que possam confundir as pessoas?

Beatriz: A dislexia, como é classificada dentro dos específicos de aprendizagem, ela está associada de alguma forma mais fortemente com outros transtornos do neurodesenvolvimento, por exemplo TDAH e autismo. O que a gente tem em relação aos estudos hoje em dia, a gente tem muito mais estudos mais concretos, estudos mais robustos associando a dislexia e TDAH. Isso já está muito mais esclarecido pra gente nessa relação de co-ocorrência. Em relação ao autismo também. O que os estudos indicam é que há uma prevalência maior, também de associação. Mas os estudos não são tão robustos quanto aqueles que a gente tem em relação ao TDAH, porque a gente tem um um fator aí que pode deixar esse processo de diagnóstico mais complexo que tem a ver com as próprias características do autismo.

Se a gente pensar isoladamente nos critérios diagnósticos de dislexia e critérios diagnósticos pra autismo, eles são bem diferentes. A gente consegue ter uma clareza em relação a um ou outro diagnóstico. A questão é quando eles ocorrem juntos, especialmente no caso do autismo, porque a gente já tem uma questão de comunicação social envolvida nos critérios diagnósticos pra autismo e uma dificuldade de linguagem muitas vezes. Não só em relação à linguagem falada, mas também à linguagem escrita.

Por exemplo, uma pessoa que é autista e que tem uma dificuldade na linguagem, isso vai se manifestar também e nos processos dela de leitura e de escrita quando ela tem contato com mensagens implícitas, na compreensão de inferências ou no uso dessa comunicação escrita de forma social, como é que ela se reporta no e-mail, numa discussão formal, de hierarquia, de chefias, etc. Então, a gente tem uma dificuldade que se manifesta em relação à comunicação social que aparece na escrita também. E aí que tá o ponto, a gente diria se isso é uma questão que tem a ver com o autismo e não é algo além, a gente não pensaria numa dislexia ou tem algo aí que não é completamente explicado pelas características do autismo e a gente pensaria num diagnóstico secundário de dislexia, num diagnóstico associado.

Então a gente precisa de uma avaliação minuciosa desse processo de aprendizagem, da leitura, o resgate da história, do processo de alfabetização dessa pessoa, como foi o processo de escolarização pra gente garantir também algo muito importante pra gente fazer esse diagnóstico diferencial não só o de autismo mas pensando numa dislexia exclusivamente, que é garantir que essa pessoa teve o suporte necessário academicamente, o suporte escolar e que isso não foi uma falha durante esse processo na hora de ensinar a pessoa formalmente a leitura e escrita. Porque nem todas as dificuldades de leitura e de escrita são dislexia. Isso a gente precisa garantir uma avaliação minuciosa pra garantir que essa pessoa teve acesso adequado à instrução que ela teve condições e oportunidades de acordo com as necessidades dela.

Principalmente no caso de autismo, que a gente já tem algumas particularidades pra que essa pessoa aprenda a ler e escrever de acordo com as necessidades específicas, então a gente pensar concretamente em ter esse diagnóstico de dislexia também.

Tiago: E quando você fala sobre todo esse processo que é longo, que é rigoroso, faz lembrar toda a trajetória também do diagnóstico de autismo que a gente já conhece dentro da comunidade e a própria história do Tito que primeiro conseguiu o diagnóstico de dislexia anos depois o autismo. E aí Tito, eu queria até saber de você: o seu diagnóstico de autismo ele é bem mais recente. Então talvez exatamente por ser recente, você não tenha tantos relatos ou uma percepção tão aprofundada sobre o impacto do diagnóstico que talvez você tenha em relação à dislexia que são muito mais anos. E eu queria saber qual foi o impacto do diagnóstico de dislexia considerando de lá pra cá assim, quais foram os ganhos que você teve na sua vida?

Tito: Tiago, foi o impacto foi igual, porque quando eu fui fazer o diagnóstico disso, eu fui pensando que eu tinha alguma neurodivergência muito complexa. Quando eu recebi dislexia, eu não fiquei satisfeito só com a dislexia, eu continuei indo atrás, porque eu tinha que encontrar pelo menos cinco profissionais dizendo pra mim a opinião deles e justificando porquê. A questão do TEA também. É uma sopa de neurodivergência em minha cabeça.

Esse negócio do QI alto eu tenho uma área do meu cérebro que tem que ir 144. E outra o QI é 88, cara.

Tiago: É uma diferença significativa, né?

Tito: Na amostragem populacional desse exame, 99,9% das pessoas não tem essa discrepância cognitiva que eu tenho, cara. Então é um negócio muito tenso, significa que… Aí eu lembro a profissional que fez esse exame comigo, virou e falou assim: “é como botar um motor de fusca numa Ferrari”. Por quê? Se eu uso uma linha de raciocínio, né? A memória de trabalho, memória de processamento com a quantidade de coisa que roda dentro da minha cabeça cara, as ideias, os insights, ah tudo que tem na minha cabeça, eu travo, eu travo e dá superaquecimento muito rápido.

Então é um sofrimento muito grande. Quando recebi o diagnóstico de dislexia foi apenas uma formalidade de uma coisa que eu já sentia que tava ali, porque eu recebi com 24 anos e eu já tava na graduação há seis anos. Então eu já estava há seis anos sofrendo com 24 reprovações, cara. E eu já tinha artigo científico. Eu já estava na minha terceira universidade. Eu sabia que eu não era burro. Eu era na realidade muito acima da média dos outros em termos cognitivos mesmo, capacidade de trabalhar essa coisa acadêmica.

Quando eu vi esse diagnóstico, decidi que agora eu vou lutar pelos meus direitos pra conseguir concluir minha graduação. O que que acontece, cara? Quando eles vêem uma pessoa, os professores, eles olham uma pessoa que é muito inteligente e que publica artigo científico que chama mais atenção que os artigos deles e é uma pessoa inferior a eles na hierarquia e ao mesmo tempo essa pessoa vai às aulas deles e tira uma nota muito baixa, que que eles vão pensar? Que a gente tá menosprezando a matéria deles, o assunto deles. E não é isso cara.

Às vezes eu juro pra você, tem matéria que eu estudei muito mais do que a minha própria área de especialização e eu não conseguia tirar mais que 3 na prova escrita. O pessoal olhava pra minha escrita de mão, o pessoal achava que eu era vagabundo porque é uma letra horrível. Eu publiquei livro na graduação. Não só artigo, eu publiquei livro na graduação. E eu tenho uma escrita de uma pessoa que cresceu no meio do mato. É sério.

Tiago: E acabam sendo muitas contradições e então existe esse reflexo da sociedade assim. Pra mim está muito claro quando você fala, que é um processo de sofrimento pra própria pessoa que não, que não se conhece nesse sentido, ou que não tem uma resposta, né? E aí eu tenho até a própria curiosidade de perguntar pra você, Beatriz, a gente ouve muito sobre dislexia relacionada a crianças, assim como a gente ouve muito sobre autismo em relação a crianças, mas quando ela é descoberta tardiamente? Os casos são de pessoas que tem esse histórico que nem o Tito por exemplo está trazendo?

Beatriz: Sim, é bem interessante e existem relatos assim também de bastante sofrimento durante o período escolar dessas discrepâncias. Muitas vezes desempenha muito bem determinadas atividades e em outras têm bastante dificuldade, especialmente quando tem algumas avaliações mais tradicionais ou um modelo curricular mais tradicional gera muitos conflitos porque normalmente são pessoas que são muito criativas que gostam de se expressar muitas vezes, não necessariamente tem uma dificuldade para se expressar, mas se tem essas questões quando existem processos de avaliação mais formal.

E o que acontece muitas vezes, a gente vê isso com muita frequência tanto em relação ao autismo e na dislexia também quando há um diagnóstico na vida adulta, é que a pessoa passou por muitos desafios ao longo da vida e aqui mais especificamente em relação a dislexia muitos desafios na área escolar mas de alguma forma mesmo que ela não tenha tido o suporte que ela necessitaria o que ela ter recebido na infância? Enfim, por várias circunstâncias ela não recebeu, ela foi desenvolvendo algumas estratégias compensatórias ou algumas estratégias para lidar com aquelas situações e aí conseguiu chegar na vida adulta, mas muitas vezes quando há um aumento de demanda, no caso da dislexia um aumento de demanda acadêmica, e entrada na faculdade, isso pode voltar de uma forma mais acentuada, uma dificuldade um pouco maior.

Então esse relato que o Tito traz de “eu estudava muito, estudei bastante, eu até consegui um desempenho mediano, mas o esforço que eu fazia comparando com os meus colegas, era um esforço muito maior”. Então, às vezes as pessoas olham de fora e acham que é displicência, preguiça, descaso e não sabem o tamanho do esforço que aquela pessoa faz pra conseguir ter um desempenho que muitas vezes é considerado mediano por aqueles que estão olhando de fora.

Além do diagnóstico ele ser importante pra pessoa se conhecer melhor, pra pessoa muitas vezes fazer as pazes com ela mesma, não se julgar, não se culpar tanto, para exigir os direitos, adaptações em provas, em concursos públicos, adaptações desse tipo sem sendo academicamente profissional e também para procurar algum tipo de ajuda profissional, no caso um fonoaudiólogo ou um neuropsicólogo e outros profissionais relacionados para fazer intervenções pra aquilo que a pessoa tem dificuldade, porque como é uma questão do neurodesenvolvimento, assim como o autismo é algo que vai acompanhar a pessoa ao longo da vida. Então acho que esses principais são os principais pontos quando a gente pensa num diagnóstico tardio.

Tito: Com certeza. Uma coisa que eu acho muito legal que você perguntou do impacto do diagnóstico são as estratégias. Uma vez você tendo uma comprovação por base em testes, você pode sentar e estudar estratégias de como melhorar a situação. Eu tenho uma fome de leitura, sempre tive uma fome de leitura enorme, mas sempre foi muito sofrido ler. É bom explicar pra audiência como é que funciona o negócio. Eu pego um livro físico, eu adoro cheirinho, eu adoro tudo, adoro ler. As letrinhas ficam dançando, cara. Eu preciso de botar uma régua, um cartão, alguma coisa pra ficar olhando a letrinha assim.

E quando a letra é muito pequena, o espaçamento das linhas é muito pequeno e a fonte é menor do que 11 no livro, tipo aqueles pocket livro ali é um pesadelo pra mim. Então esse tipo de leitura é uma leitura que desprivilegia um cara feito eu. Eu vou sair perdendo com colegas que não tem esse negócio. Agora uma coisa que na academia me favoreceu é que você pode ler digitalmente um PDF e você aumenta o tamanho da letra, aumenta o tamanho da tela, usa o marca texto digital e aí ó, é um artigo após o outro, sabe? É bem mais rápido.

Outra coisa que veio com o diagnóstico, sabendo isso que a Beatriz falou, eu também na época tinha recebido essa sugestão de perceber que minha audição era muito boa, eu não precisava dos olhos necessariamente. Então eu passei a escutar documentos e ouvir livros. Então um cara que lia sei lá um dois livros por mês passei a ler sei lá quantos livros na época de tanto audiolivro que dava com possibilidade de escutar em outras línguas também gratuitamente. No YouTube tem audioslivros que você pode ler e tem programas. O aparelhinho aqui que eu que eu uso é um Kindle que tem vozes muito boas gratuitamente, ele lê pra você, você baixa o livro lá e tem muito livro gratuito, apostila, artigo científico, que ele lê e você escolhe a voz ele lê pra você você bota a velocidade que você quer. E aí com isso cara você consegue se equiparar com colegas ou até passar.

Porque você consegue fazer isso, por exemplo, enquanto você está fazendo exercício, lavando louça, dirigindo. Enquanto você está fazendo uma outra tarefa você pode estar estudando. Você pode estar lendo um livro, se atualizando sobre o assunto. Então trouxe essa possibilidade pra minha vida de eu utilizar outros sentidos e outras técnicas para superar esse problema, né? Então me ajudou muito na carreira, muito mesmo.

Tiago: Ah, interessante, interessante. E Beatriz, considerando que haja gente que esteja ouvindo o Introvertendo, considerando que uma parte significativa da nossa audiência são autistas. E estejam ouvindo e pensando: “será que eu tenho dislexia?”. Qual é o profissional adequado a se procurar no caso assim?

Beatriz: Então, o fonoaudiólogo é o profissional que trabalha com questões de linguagem, tanto linguagem oral, quanto linguagem escrita. Como a dislexia tem muito a relação com essa questão fonológica, uma avaliação fonoaudiológica seria muito indicada, muito importante nesse processo que às vezes vai ser multiprofissional. O neuropsicólogo pode ajudar muito porque tem muitos testes também pra gente conseguir entender o funcionamento global, pensando na em aspectos cognitivos de memória e de linguagem. Então, basicamente uma avaliação com o fonoaudiólogo, neuropsicólogo seria muito interessante pra gente tentar compor esse diagnóstico de dislexia.

Tiago: Muito bom, muito bom. Tito e Beatriz, muito obrigado pela participação de vocês aqui no Introvertendo. E eu queria que vocês falassem então onde as pessoas podem encontrar o trabalho de vocês, saber um pouco mais, fiquem a vontade pra falar um pouco sobre o trabalho de vocês, das suas páginas nas redes sociais.

Beatriz: Produzo conteúdo nas redes sociais no Instagram Paradoxa Autismo. Lá vocês podem encontrar os conteúdos que eu falo, especialmente sobre autismo, junto com o meu esposo, Cristiano, que também é fonoaudiólogo e é uma pessoa autista.

Tito: E eu, Tito, não tem muitos Titos Aurelianos aí. Então, se você colocar meu nome na rede em qualquer lugar, nessa parte de estudos de fósseis, de dinossauros, essas coisas, você vai encontrar. Eu sou diretor de um estúdio chamado Colecionadores de Ossos. A gente tem um canal, eu e minha esposa que também é paleontóloga. E a gente fala de tudo, de fósseis, geologia, paleontologia, biologia e mostra as expedições, pesquisa de laboratório e tudo. E eu também sou diretor de uma franquia de ficção científica chamada Dino Hazard que tem jogo de videogame, boneco, brinquedos, livros, quadrinhos, tudo. Então, é uma maneira de conectar com o nosso universo aí.

Tiago: Show! E antes da gente encerrar esse episódio, eu queria muito agradecer pelas palavras de carinho, pela enxurrada de mensagens que nós recebemos em relação ao episódio de aniversário. O pessoal mandou texto, mandou mensagem no Instagram, email, no WhatsApp…

Enfim, eu queria agradecer de coração a todas as pessoas, a vocês que nos ouvem ao longo desses quatro anos, confiam e gostam do nosso material. E não tem palavras do amor e do carinho que vocês têm nos dado principalmente nesses últimos meses. Então queria aqui manifestar o meu agradecimento. Ninguém mandou áudio especificamente. Então por isso que eu não vou tocar aqui, mas eu queria agradecer pelas mensagens em texto que várias pessoas nos mandaram nas redes sociais, incluindo o Twitter.

E eu queria só fazer uma observação. Muita gente tem mandado mensagem pra gente aqui no podcast, seja no Instagram ou no WhatsApp, apenas coisas tipo: “oi”, “bom dia” ou alguma coisa assim. Gente, por favor, vamos definir uma coisa aqui: Nós somos um podcast de autistas, nós somos autistas. Então se você quer mandar uma mensagem pra gente, você quer falar alguma coisa, manda logo o assunto.

“Ah, mas tem a regra social”. Esquece regra social. Aqui é um podcast de autistas. Se você manda apenas um “oi”, a gente não sabe qual é o assunto e a gente não responde. Então assim, se você mandou mensagem pra gente, ficou no vácuo, manda logo o assunto, tá? Pra gente conseguir responder. Porque a gente recebe muitas mensagens e a gente vai respondendo aquilo que a gente já sabe o que é pra responder de imediato, entendeu?

Só queria deixar esse último recado. Lembrando então a você que nos acompanha aqui no Introvertendo e não sabe, a gente tem uma seção de tocar aqui áudios do WhatsApp quando o pessoal manda ou quando tem algum áudio interessante. E o nosso número é DDD 62 – 994656787, beleza? Um abraço pra você e até semana que vem que vai ser o nosso último episódio este ano por enquanto que vai ao ar semanalmente. Depois a gente volta a um episódio a cada quinze dias.

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