Introvertendo 168 – O Problema do Trabalho em Grupo

Um dos maiores terrores na vida de autistas nos tempos de escola eram os famigerados trabalhos em grupo. Não que as pessoas não-autistas adorem trabalho em grupo, mas autistas costumam sofrer em um nível consideravelmente maior. Com base nisso, apresentamos nossas experiências de atividades coletivas na escola, universidade e empresas, e dicas de como lidar com elas. Participam: Carol Cardoso, Michael Ulian e Thaís Mösken. Arte: Vin Lima.

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Transcrição do episódio

Thaís: Olá pra você que é ouvinte do Introvertendo, este podcast feito por autistas para toda comunidade, o meu nome é Thais Moskën, eu sou autista, tenho 29 anos, fui diagnosticada em 2018 e hoje eu vou ser host deste episódio.

Carol: Eu sou Carol Cardoso, tenho 23 anos e fui diagnosticada com autismo em 2018 também.

Michael: E eu sou o Michael, o Gaivota, eu fui diagnosticado aos 14 anos, isso faz mais tempo do que eu consigo lembrar de cabeça o ano específico e como o tema desse episódio sugere, a pior parte de fazer as gravações do podcast é fazer a coordenação de trabalho em grupo aqui.

Thaís: O Introvertendo é um podcast feito por autistas, com produção da Superplayer & Co e hoje a gente vai falar um pouco sobre trabalho em grupo, principalmente no período escolar, mas talvez um pouco nos outros períodos também, porque trabalho em grupo permeia, infelizmente, ou, felizmente depende, sua vida inteira.

Bloco geral de discussão

Thaís: Durante toda a nossa vida escolar, acadêmica e também profissional, é muito improvável que você consiga passar por tudo isso sem ter feito nenhum trabalho em grupo. Essa parte, às vezes, é especialmente difícil para a gente que é autista. Então, pessoal, eu queria que vocês falassem um pouco sobre as dificuldades que vocês têm na hora de fazer um trabalho em grupo ou mesmo de formar um grupo para fazer o trabalho.

Michael: No meu caso, principalmente, mas na parte da escola ainda, começou a ser um problema um pouco maior pra mim, quando eu entrei na universidade e embora nunca gostei de trabalhar em grupo, geralmente trabalhos em grupo não eram um problema em si, uma dor de cabeça maior do que um trabalho normal, porque era o seguinte: eu simplesmente deixava formar qualquer grupo, eu entrava no primeiro grupo que quisesse eu dentro e quando eu entrava, eu aproveitava e: “eu posso fazer praticamente tudo sozinho?”. “Pode!”. Eu ia lá e fazia tudo que eu podia fazer sozinho. Ponto, resolvido. Era assim, foram raras exceções que eu não usava essa metodologia para fazer. Agora, quando eu entrei na faculdade, quando as coisas começaram a ser um pouco mais sérias e as estratégias tanto não dariam no ponto de vista moral quanto de um ponto de vista prático, porque começaram a entrar nas coisas que você não dá conta de fazer sozinho, em especial na minha área, que eu praticamente todo semestre a gente tinha quase um mini TCC pra fazer. Isso é o tipo de coisa que você não faz sozinha, sozinho, não em dois meses, que é o tempo médio, assim, pra fazer tudo. Como eu estava acostumado a essa altura a fazer tudo sozinho, no meu estilo, eu simplesmente não conseguia intercalar com o grupo. Até em coisas básicas, “olha, você faz essa parte”. Beleza, eu vou fazer do jeito que eu faço todos os meus trabalhos, no último segundo possível. E daí, como você coordena isso com o resto do grupo? Não dava. Era literalmente um terror (risos). Um pouco menos pior foi meu trabalho em laboratório, porque como era um ambiente já entrando um pouco mais para um ambiente profissional, dava pra fazer uma coordenação um pouco melhor do que os trabalhos universitários em si. E outra, como era uma situação um pouco mais específica, mais isolada, eu podia contar mais, ter mais confiança nas pessoas que estavam ali comigo. Então, quando era algo que eu dependia de outras pessoas pra fazer, era algo que não dava pra fazer sozinho e praticamente qualquer artigo acadêmico que tu faz é assim, tu pode ver, vai Researchgate, um artigo acadêmico tem uma caralhada de gente lá, por quê? Porque esse tanto de gente colaborou naqueles trabalhos. No meu caso, eu simplesmente pegava se eu tava colaborando, geralmente era alguém do laboratório que eu conhecia, que eu confiava, que vinha me pedir ajuda. Então, era algo que eu já fazia instantaneamente e quando era o meu trabalho que eu precisava ajuda, geralmente eu deixava o meu orientador ser meu intermediário e pedir pra mim porque, daí, então, a questão que eu tenho uma péssima capacidade de interação social e nem ferrando que eu ia pedir ajuda pra alguém, eu mesmo.

Carol: Eu achei engraçado o que tu disse, porque pra mim era o contrário, porque pra mim as melhores partes eram as partes artísticas e eu basicamente pegava o trabalho pra fazer só eu, na escola, principalmente. Porque toda vez que tinha alguma coisa minimamente prática pra fazer, eu ficava tão empolgada que eu não queria dividir o trabalho com ninguém, era uma coisa bem minha, assim. Eu tive muita dificuldade pra fazer trabalho em grupo desde sempre, desde os primeiros tempos da minha infância, na minha vida escolar e uma das minhas maiores dificuldades era justamente formar o grupo, olhar pela sala e tentar procurar um grupo e olhar pras pessoas e ver quem sem grupo ou, enfim, todo esse processo de olhar em volta da turma, assim, pela sala, já era difícil pra mim, porque eu tinha uma tendência muito grande a ficar sentada na minha mesa, olhando pra mesa, ou desenhando, ou fazendo alguma coisa do tipo. Então, quando a professora falava que era pra gente procurar alguém pra fazer grupo, eu meio que entrava em pânico. Era horrível. E aí, geralmente, eu esperava os grupos todos se formarem. Ou entrava no grupo das pessoas que não tinham grupo, ou perguntava pra professora se ela podia me arrumar um grupo e a professora arrumava. E isso se estendeu até eu acho que metade do ensino fundamental 1 e por fim, assim, do fundamental e pro médio já comecei a conseguir fazer grupo, né? Arrumei um grupinho. Aí tive que me expor pra fazer trabalhos, tipo seminário, e foi a coisa mais difícil do mundo, porque no seminário geralmente as pessoas têm que dividir as partes e eu estava acostumada a pegar a parte de só escrever, ou só pesquisar e anotar e fazer o trabalho escrito e não apresentar. Mas aí apresentar era obrigatório a partir do ensino médio. Então, foi uma dificuldade imensa que eu tive. E, na faculdade, basicamente, todos os trabalhos são em grupo, né? Principalmente na arquitetura. Então, até a parte que eu gostava de fazer, que era a parte prática, que eu achava que eu podia simplesmente ir lá e fazer e ficar, isso caiu por terra na arquitetura. Porque simplesmente é impossível a gente fazer um projeto que seja individual, porque, basicamente, há muitas coisas envolvidas. Sem falar da questão de carga mesmo, da gente ter que pegar e fazer muita coisa, eu acredito que é muito difícil a gente conseguir dar conta de pensar num projeto que vai ser usado pra várias pessoas sendo que eu sou só uma pensando. Eu vejo que trabalho em grupo é uma ferramenta muito interessante, mas pra quem tem dificuldade de relacionamento e de comunicação é um desafio a mais.

Thaís: Assim como vocês comentaram, eu sempre tive algumas dificuldade ou em conseguir um grupo ou então em conseguir dividir as tarefas com o grupo. Eu sempre tive uma necessidade ou pelo menos eu sempre tentei ter muito controle sobre as coisas, eu demorei muito tempo pra aprender a deixar que nem tudo fosse do jeito que eu queria. Então, eu queria fazer o trabalho do meu jeito e aí, ou eu tinha um grupo acordado já antes, com quem eu já tinha combinado o que que ia ser feito, algumas épocas da escola tinham algumas pessoas com quem eu falava mais, outras épocas eu não tinha ninguém próximo. Então, ou eu já tinha essas pessoas, ou então, eu precisava de ajuda dos professores pra encontrar o grupo. Como a Carol falou, era o grupo dos sem grupo, que juntavam todo mundo ali. E o normal era eu perguntar, também, se eu podia fazer o trabalho sozinha. Geralmente, eu já perguntava pro professor antes de me colocar no grupo. Se podia, ótimo, mas, geralmente, eles não permitiam e até um motivo de didática eles não permitirem isso, que é pra, justamente as pessoas treinarem o trabalho em grupo. Por mais que a gente não goste, é uma habilidade que a gente acaba usando bastante ao longo da vida, né? Quando eu tava em um grupo, aconteciam as duas coisas diferentes e às vezes eu perguntava pra eles se eu podia fazer sozinha e aí eu deixava as outras pessoas cuidarem, por exemplo, de comprar comida pra mim no dia que eu tava fazendo, ou pagarem encadernação, embelezarem o trabalho, porque eu nunca fui boa em embelezar coisas, então eu fazia toda pesquisa e aí pagavam a impressão, por exemplo, que era uma coisa cara, antigamente, nem todo mundo tinha impressora. Na verdade, quando eu era pequena, a gente não tinha nem computador, fazia na mão. Então, eu mandava outra pessoa pagar as figuras, pagar revista e, por aí. Mas, em alguns casos, também, eu optei por me preocupar menos com o grupo. Se eu percebia também que o grupo tava querendo se aproveitar muito de mim e aquilo tava me incomodando e eu não precisava daquela nota, porque na época da escola, antes da faculdade, eu não precisava de nota, então, às vezes, eu falava pra eles: “se vocês não fizerem a parte que tô falando pra vocês fazerem, eu não vou fazer a minha”. E isso já aconteceu mesmo de eu simplesmente deixar pra lá um trabalho, porque eu sabia que eu tava tranquila naquilo. Então, eu acho que variava muito de como eu me sentia. E uma coisa que me incomodava também é que muitos dos trabalhos eram lúdicos, não eram coisas mais objetivas, não era uma pesquisa, então às vezes eu tinha até dificuldade de entender como aquilo ia ser avaliado e no que eu deveria me focar. As outras pessoas também não colaboraram muito com isso. Eu acho que se tornava, então, um trabalho meio caótico. Eu não entendia, às vezes, tão bem, o que queriam que eu fizesse de verdade, enquanto o grupo, às vezes, não estava focado em tentar fazer o trabalho e tudo mais. Então, pra mim teve várias experiências que me incomodaram, mas eu tive experiências razoáveis em alguns aspectos, né? Já na época da faculdade, eu era uma pessoa bem ausente, então, eu me empenhei muito em alguns poucos trabalhos, mas na maior parte dos trabalhos eu só falava pra alguém: “me chama se precisar de ajuda”. E, sinceramente, às vezes eu falhava com a pessoa, eu desaparecia. Eu era aquela pessoa que não lembrava direito, às vezes, que a faculdade existia. E foi um período bem ruim em vários aspectos, eu fui uma péssima colega de grupo também e eu fico bem feliz que a faculdade tenha acabado. E agora, no trabalho, eu já tive que ter uma postura diferente. No início, eu tentava fazer tudo sozinha, algumas coisas em que eu era colocada com um grupo, eu tinha alguma dificuldade, mas eu geralmente chamava o meu gestor para a organização mesmo das tarefas, no que eu devia fazer e se eu tinha uma dúvida do que precisavam, o que realmente queriam com aquela tarefa, eu conseguia tirar essas dúvidas com o meu gestor ou com os grupos. Além disso, com o tempo, eu passei a ter muitas funções e eu percebi como eu precisava aprender a distribuir as tarefas. Então, eu acho que a minha experiência profissional nisso me ajudou muito mais a aprender a trabalhar em grupo do que na época da escola, de fato.

Carol: É muito doido isso, porque muitas vezes a gente é colocado numa situação de ter que trabalhar em grupo, mas a gente não é ensinado de como trabalhar em grupo. E eu não sei se isso é uma dificuldade específica do autismo, mas acho que tem um agravante. Mas será que não seria válido a gente estimular a trabalhar em grupo nas pessoas, de um modo geral. Porque tem muita gente que tem uns comportamentos que são muito antigrupos, que são muito prejudiciais para todo mundo. Tipo quando a pessoa acha que só a parte dela é certa e os outros só fazem merda ou quando a pessoa entra num grupo, fica de fazer uma coisa e não faz (risos). Eu não sei, fiquei com vergonha agora de falar isso, porque a Thaís acabou de dizer que ela era horrível em grupo (risos).

Michael: Não, mas tá normal. Eu, geralmente, sou a pessoa que tá certa e ponto!

Carol: (Risos)

Thaís: (Risos)

Michael: O resto tá todo mundo errado!

Thaís: Na comunidade do RPG se fala muito sobre uma coisa chamada contrato social, que eu acho que a gente pode pensar nisso para os trabalhos em grupo, que funciona basicamente com as pessoas que vão participar daquele grupo de RPG conversam sobre coisas que são problemáticas pra elas, fazem essa divisão até de tarefas, falam quais são os objetivos dela, quais são as expectativas delas com o jogo e coisas do tipo. E pra mim, essa parte do RPG foi algo que me ajudou também a desenvolver isso do trabalho em grupo. Então, como a Carol falou, eu nunca fui ensinada, de verdade, a trabalhar em grupo. Eu acabei mais por acaso, talvez, por eu ter interessado pelo RPG, eu acabei aprendendo e com essa parte do contrato social que eu aprendi, de fato, a conversar com as pessoas, para saber quais são as expectativas dela e quais são as dificuldades dela, para que as pessoas possam se ajudar e tentar levar aquele projeto adiante.

Michael: Uma coisa que às vezes eu penso e eu já pontuei também isso outras vezes, que no caso da pessoa neurotípica, normalmente ela não precisa ser ensinada disso, algo que eles conseguem ali ir se virar sozinhos, é natural, é meio que esperado que você vá conseguir lidar com isso sozinho, como você não tem essa capacidade de interação social automática assim, literalmente, você tem que ser ensinado como interagir. Alguém me passa o manual de instruções, por favor?

Carol: Eu acho que eu só fui me dar conta, realmente, do quanto que eu era ruim em trabalho em grupo, quando eu tive que interromper a faculdade, porque eu estava com muitos problemas psicológicos, e aí na clínica que eu fiquei fazendo acompanhamento, a gente teve que fazer uma peça de teatro. E a peça envolvia várias pessoas, eu acho que o grupo da minha peça tinha, sei lá, 9, 10 pessoas, por aí. E na primeira reunião da peça eu tive uma crise. Foi nessa ocasião, inclusive, que eu tive o meu diagnóstico. Então, ficou muito evidente pra equipe da clínica quanto que isso, realmente, era um problema e também teve uma vez que, nessa mesma clínica que eu tava, a gente tinha que fazer uns desenhos de uma decoração de Halloween. E nem era um trabalho em grupo, era individual, só que enquanto eu tava desenhando, um monte de gente começando a me perguntar se eu podia fazer a parte delas de desenhar e aí, tipo, eu eu não consegui ficar na sala mais, eu tive que sair. E eu acho que isso foi chamando a atenção das pessoas. Uma das coisas que eu estimulei nessa clínica foi justamente isso de aprender a conseguir ficar numa sala em que está acontecendo uma reunião. Isso realmente é uma coisa que não se precisa ensinar para um neurotípico, sabe? E a partir desse momento da minha vida, foi que eu pude ter estratégias, aprender um pouco melhor sobre mim e sobre como trabalhar em equipe pra levar pra faculdade depois que eu retornasse, sabe? Fez toda a diferença pra mim.

Thaís: Isso que vocês falaram da gente, às vezes, precisar aprender com informações objetivas, pra mim é bem verdade. Tanto que levou tantos anos pra aprender a trabalhar em grupo de fato, mesmo que desde pequena, supostamente, eu tenha sido estimulada a isso na escola. Afinal, a gente era obrigado a fazer de alguma forma aqueles trabalhos todos. E eu percebo, também, que uma coisa que facilita, pelo menos, pra mim, facilitou muito depois entrei no meio profissional e que tanto na época da escola, quanto na época da faculdade, é ter um grupo interessado em participar de verdade e não um grupo que quer só deixar o trabalho para uma única pessoa e se aproveitar dessa pessoa, ou então um grupo que vai só ficar bagunçando enquanto tem alguém fazendo ou o grupo inteiro bagunçando. Em resumo, dentro do meu emprego, pelo menos, as pessoas, de fato, têm interesse em concluir determinado objetivo, em entregar uma tarefa bem feita, então eu consigo ter mais tranquilidade de que se a gente dividir tarefas as pessoas vão se esforçar para cumprir a sua parte e pra mim isso faz bastante diferença. Eu sempre tive uma dificuldade muito grande de acreditar que as outras pessoas fazer suas partes, tanto por não confiar nas pessoas de forma geral, mas também por, geralmente, achar que as outras pessoas são incompetentes. E com o tempo, eu fui descobrindo que o que acontece é que as pessoas, às vezes, têm competências muito diferentes umas das outras. Então outro ponto que eu acho importante no trabalho em grupo e que eu não sei se pra todos os autistas é muito difícil, mas eu imagino que pra maior parte seja, é reconhecer quais são as competências de cada pessoa. Então, às vezes, vai ter a pessoa que é, realmente, muito boa em pesquisar, outra que escreve bem, outra pessoa que pode fazer uma revisão ou fazer uma busca de imagens, às vezes no meio profissional, você precisa também daquela pessoa que ela é simplesmente boa em falar com outras pessoas. Então, é a pessoa que a gente fala que consegue fazer networking. Então, ela tem uma rede de contatos e, às vezes, você tem um problema que não sabe como resolver e essa pessoa conhece alguém porque conversa muito por aí e consegue trazer esse conhecimento pra te ajudar a resolver um problema. Isso, às vezes, é muito importante. E você não precisa ter todas essas habilidades. Às vezes, você só precisa saber quem tem pra poder usar essas habilidades dos outros na hora necessária.

Michael: É legal ver que vocês conseguem ainda ter uma visão positiva e de uma visão de que trabalhar em grupo pode dar certo e que pode ser benéfico. Pra mim é uma porcaria de todo jeito (risos).

Carol: E não tá errado.

Michael: O que dá pra fazer sozinho a gente faz sozinho, o que precisa de ajuda a gente faz sozinho também, porque dá pra fazer melhor sozinho, né?

Carol: É, eu acho que cada um tem a sua forma de trabalhar. Eu acho que não é necessariamente um problema tu vou preferir fazer sozinho. Eu acho que tem algumas profissões que permitem que a gente trabalhe sozinho. E é isso, sabe? Eu acho que as pessoas têm que ficar felizes do jeito que elas são felizes. Eu sei que ter algumas habilidades de comunicação pode ser muito útil e trabalho em grupo pode estimular isso, mas nem sempre funciona. Causa mais desgaste do que outra coisa, acho que não vale tanto a pena.

Michael: Minha primeira publicação, um resumo num congresso que ia ter na minha área, tinha feito toda a parte prática do trabalho já, já tinha escrito o esqueleto do que ia ser o resumo. Meu orientador pegou e disse: “olha, fala com esse aluno de mestrado lá do Rio de Janeiro, que é colaborador aqui do laboratório, pra ele revisar o seu trabalho”. Eu fui entregar o trabalho oito horas antes do prazo final para esse colega revisar. Depois disso, o meu orientador já passou a dizer: “ó, você pode confiar nessa pessoa, ela não vai ferrar seu trabalho de forma nenhuma, ela tá aqui pra te ajudar. Vai, pelo amor de Deus, fala com ela, pelo menos, uns dois, três dias antes de qualquer prazo final que você tenha, por favor, me faça isso” (risos).

Carol: Eu me lembrei que eu tenho uma dificuldade imensa com orientações também. Isso é até um defeito meu, mas pra mim acaba sendo até desgastante mostrar meu trabalho pra quem tá me orientando, porque é um processo comunicativo que eu não tenho muito repertório, de fato, então, é uma coisa que sempre é muito grande que eu preciso fazer, de mandar, enviar e esperar as pessoas responderem e a pessoa responde nem sempre de uma forma muito objetiva, até acaba comprometendo a qualidade do trabalho.

Thaís: Isso que o Michael falou de, às vezes, ele demorar muito pra ir falar com a pessoa, mesmo que ele saiba que tem que falar com ela, isso acontece comigo também, quando eu sei que eu tenho que ir até alguém, mandar uma mensagem, um email, ligar, ainda bem que hoje em dia as pessoas não ligam muito, geralmente é mensagem de texto, que pra mim é mais fácil, mas mesmo uma mensagem de texto, eu costumo custar pra fazer. Parece que eu preciso passar um tempo me convencendo, relendo aquilo. Então, coisas que para as pessoas são muito simples de fazer, que é só mandar uma mensagem, às vezes, é uma frase, eu posso demorar uma hora pra conseguir escrever aquela mensagem e enviar. Inclusive, é o tipo de coisa que eu não escondo de ninguém, os meus gestores sabem muito bem que eu tenho essa dificuldade, eu sou capaz de fazer isso, mas é difícil. E eu acho bom deixar claro quais são as minhas capacidades e quais são essas dificuldades que eu tenho. O meu antigo gestor me falava muito pra gente focar naquilo em que a gente é bom. E as coisas em que a gente é ruim, a gente só aprende o mínimo para que elas não precisem ser um impedimento pro nosso desenvolvimento. Então, eu posso falar isso do trabalho em grupo, que o Michael falou que parece que a gente tava falando bem do trabalho grupo, na verdade, eu não gosto de trabalho em grupo. Quando eu posso fazer sozinha, eu prefiro fazer sozinha, eu fico mais confortável fazendo sozinha, mas eu consigo lidar de uma forma razoável, justamente pra não ter esse impedimento e não tornar o trabalho em grupo uma trava pro meu desenvolvimento e fazer com que isso funcione no meu dia a dia. Outro ponto que a gente falou, eu acho também importante ressaltar que isso vale pra escola, vale pra faculdade, vale pro emprego, é a gente envolver alguém como mediador quando a gente tem dificuldade. Então, isso que o Michael falou de o professor já indicar uma pessoa com quem ele pode falar, eu faço isso até hoje. Hoje em dia eu já conheço muitas pessoas do meu trabalho, mas mesmo assim, às vezes, eu ainda preciso pedir uma ajuda, pedir uma indicação. Recentemente, inclusive, eu estava buscando uma mentoria e supostamente eu deveria ir no LinkedIn, caçar pessoas, encontrar o currículo delas e mandar mensagem pra elas. E eu estava tendo bastante dificuldade em buscar pessoas no LinkedIn aleatoriamente. E o meu gestor me ajudou nisso. Isso foi bastante bom pra mim. É o tipo de que eu não me envergonho nem um pouco, porque eu sei que eu entrego bastante coisa com as minhas outras capacidades. E nessa aqui, eu peço ajuda. Então, pra gente finalizar, vamos falar as nossas dicas pra gente realizar um trabalho em grupo com o mínimo de estresse, pelo menos, pra gente sobreviver, mesmo que a gente não goste desse tipo de coisa.

Michael: Eu acho que a primeira dica você já até falou. Sempre, se possível, ter alguém de confiança ou, pelo menos, se você já tá meio acostumado pra ser uma intermediária entre você e o resto do grupo, é algo muito valioso, porque às vezes só de ter alguém capaz de dar a palavra dela: “ó, você pode confiar nessa pessoa pra te ajudar”, já é uma diferença gigantesca entre você tentar interagir com quem você nunca interagiu antes, completamente sozinho e esperar que você vai conseguir ter uma interação bem sucedida.

Carol: Outra coisa pra mim que facilitou muito é que se existia possibilidade de fazer com menos pessoas, melhor ainda, porque eu percebi que o meu limite de grupo é trabalhar com mais duas pessoas em nível aceitável. Infelizmente, no meu curso, geralmente, os grupos tinham cinco pessoas e isso era muito difícil, mas eu percebi que quando tinha essa flexibilidade de trabalhar ou em dupla, ou só eu e mais duas pessoas, isso facilitou demais a comunicação, porque era menos gente pra eu ter que lidar.

Michael: É gente demais, não dá pra esperar cinco, seis, sete, oito pessoas simplesmente vão telepaticamente se organizar sozinhas entre elas. Você precisa ter uma estrutura organizada, porque mesmo se for todo mundo neurotípico, não dá certo. É muita gente e vira bagunça. Inclusive é um problema que a gente tem aqui até no podcast, às vezes é um terror logístico tentar gravar.

Carol: (Risos) É, eu tenho pena do Tiago.

Michael: É pior ainda pro Tiago, que cuida de toda edição, mas todo o processo. Desde você tentar acertar a gravação, quando você tem mais de cinco pessoas, de você acertar os horários de todo mundo, de você finalmente começar a gravar, problema de pré-gravação que você tem, a gravação em si, depois vem a pró-produção, é um terror. Todos os passos vai ter alguém com problema, vai ter algum problema. Vai acontecer alguma coisa, vai ter imprevisto. E quando você tem menos pessoas, quando acontece um imprevisto, algum problema, não é que não acontece mais, é que fica bem mais fácil de você ou resolver aquele problema na hora ou de improvisar uma solução que não fique perfeita, mas é bem mais fácil você lidar quando você tem muita gente.

Thaís: Dentro disso também eu acho importante aceitar que você não tem controle sobre as outras pessoas. O melhor que você pode fazer é deixar de forma objetiva qual é a função de cada um. Mesmo assim pode ser que você faça errado também. E eu acho que a questão de também aprender a delegar as tarefas pra você não se sobrecarregar, é bem importante. Às vezes a gente tem várias ideias e quer executar todas elas, mas a gente precisa aprender nossa energia em algumas coisas, inclusive por conta de prazo ou pra fazer algumas coisas melhor ainda. Outro ponto que a gente não chegou a comentar é buscar um ambiente conhecido e controlado para fazer determinados trabalhos. E se você precisar, em algum momento, aceitar fazer o trabalho do jeito de uma pessoa, você pode ir até falar pra ela de forma, de preferência, objetiva, porque você discorda do ponto de vista dela, mas se ficou definido que vai ser do jeito dela, tenta só fazer, não tente alongar essa discussão e resolve esse problema logo. Porque às vezes parece importante pra gente, porque o nosso jeito parece certo, mas acredite, vai ser um trabalho na sua vida, no meio de muitos outros trabalhos. Então, o estresse que pode ser gerado dessa discussão de tentar fazer alguma coisa do seu jeito, provavelmente não vale a pena. Provavelmente, vai desgastar, vai te estressar, pode depois trazer mais problemas pra você se relacionar com as outras pessoas. Se ficou definido que vai ser de um jeito, tenta seguir desse jeito e relaxar dentro do possível. Porque, pelo menos, pra mim, se eu tivesse tido essa dica, quando era criança, eu acho que seria bem mais fácil em alguns momentos.

Michael: O meu objetivo era: o trabalho em grupo, enfim, já é um puta pé no saco pra mim. Eu não preciso fazer isso ser mais irritante do que já é. Então, eu sempre procurei o jeito mais rápido, mais eficiente, que me desse a menor dor de cabeça possível pra terminar aquela joça.

Thaís: Exato, quanto antes você fizer o trabalho, mais rápido ele vai terminar e você vai deixar sua parte pra trás e vai poder se dedicar a coisas que realmente te interessam, coisas que você gosta. Então, é melhor acabar com a dor rápido.

(Após o fim do episódio)

Thaís: É isso, pessoal. Acho que fechamos, ficamos com 55 minutos brutos aqui de gravação. Eu imagino que o Tiago vá reduzir pra uma meia hora e parece que é um tempo bom pra ninguém se cansar, ninguém se estressar. Nosso trabalho em grupo por hoje tá terminando.

Michael: (Risos) Vai ficar um episódio bom assim em questões de tamanho e também foi bem tranquilo de gravar. Então, todo mundo falando com tudo quietinho, um acabar de falar, o outro já entrou… Nossa, foi muito bom gravar hoje.

Thaís: Também pensei nisso, também achei excelente, não ficou aqueles barulhos bizarros no meio da gravação, digitações aleatórias…

Carol: Moto.

Michael: É o que a gente fala: quanto menos a gente melhor pra gravar.

Carol: Pois é.

Thaís: Exato. Maiores as chances de dar certo. Vocês foram um ótimo grupo.

Michael: (Risos) Mas beleza. Falou, pessoal.

Carol: Tchau.

Thaís: Valeu, gente. Até mais.

Carol: Até.

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