Essas pessoas estão sempre por perto em relações harmoniosas e conflituosas típicas de famílias. Neste episódio, Luca Nolasco e Tiago Abreu recebem Isabella Werneck e Nick Hernández, irmãs de autistas, para um papo sobre convivência, compreensão e aceitação do autismo, autonomia e muito mais. Arte: Vin Lima.
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Notícias, artigos e materiais citados e relacionados a este episódio:
- ArTEAmando
- Nick Hernández
- Matheus Mattos Correa
- EP Sonder – Bella Oz
- Live do ArTEAmando com Luca Nolasco – 30 de maio de 2020
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Transcrição do episódio
Luca: Sejam bem-vindos a mais um episódio do Introvertendo. Eu sou o Luca Nolasco, tenho 20 anos e estudo na UFG, Biomedicina. E temos aqui a Isabella Werneck.
Isabella: Olá Meu nome é Isabella, eu tenho 17 anos e eu tenho um irmão mais novo autista.
Luca: Além dela, também temos a Nicolle Mattos.
Nick: Olá, prazer imenso estar aqui, eu sou a Nicolle, mais conhecida como Nick, eu tenho limão autista, o Mateus que tem 23 anos. E além de ter o meu irmão que é meu irmão caçula com um autismo, eu também trabalho com direitos das pessoas com autismo, sou servidora pública do Ministério Público de Santa Catarina e formada em Direito, então o autismo está presente tanto na minha vida profissional quanto na minha vida pessoal.
Tiago: Eu sou o Tiago Abreu, um dos integrantes do Introvertendo, sou jornalista, diagnosticado com autismo em 2015, não tenho irmãos autistas, estou aqui mesmo pra palpitar e fazer algumas perguntas aqui pras nossas convidadas.
Luca: É, e por fim, eu, além de ter um irmão artista, eu sou também o irmão autista, somos três filhos e uma delas não é autista. O Introvertendo é um podcast feito por autistas, cuja produção é da Superplayer & Co.
Bloco geral de discussão
Luca: Bom, eu conheço vocês, mas eu acho que muitos ouvintes podem não conhecer. Nick, fala um pouco sobre a sua família, sobre a questão de convivência ou o que você achar confortável de falar.
Nick: Perfeito. Um prazer de estar aqui compartilhando a minha experiência com vocês, com as pessoas que vão ouvir depois este podcast. E bom, a questão do autismo foi muito presente na minha família, foi pela primeira vez que a gente teve o convívio mesmo com uma pessoa com autismo foi através do meu irmão. Então assim, no início foi um pouquinho difícil. Porque a gente não tava acostumado, a gente desconhecia o autismo e a gente foi aprendendo desde o início, desde a busca pelo diagnóstico, depois que a gente fechou o diagnóstico do meu irmão a gente enfrentou vários desafios, tanto na inclusão dele na escola quanto na sociedade, e através da experiência do meu irmão, das dificuldades que a gente enfrentou e das alegrias que a gente vivenciou também, através de toda essa inclusão, de todo esse processo, foi muito gratificante pra gente poder ver como a gente alcançou os objetivos que a gente tinha. Por exemplo, do Mateus ter amigos, uma pessoa com vida social, de ele ser feliz, que eu acredito que é o mais importante de tudo isso. Então, eu posso dizer que hoje em dia o meu irmão tem as limitações dele, como todos nós temos, mas ele é muito feliz e cada vez mais a gente incentiva muito o hiperfoco dele em leitura, ele ama geografia, ama história. Então, ele lê vorazmente, ele gosta muito de ler, de ir a livrarias e até recentemente ele criou um Instagram para compartilhar os conhecimentos dele e nesse Instagram que a gente chama de Vida de Autista ele compartilha geografia, história, todos esses conhecimentos que ele acumulou através da leitura, através dos estudos, das pesquisas que ele faz. E também prestou vestibular, acabou fazendo alguns meses de uma disciplina como aluno ouvinte. A gente tem trabalhado bastante essa parte da socialização, principalmente porque a gente percebe que faz muito bem pra ele, que é muito importante e é a nossa prioridade.
Luca: E quando foi mais ou menos que você decidiu ingressar na Defensoria Pública, principalmente voltar a esse tema?
Nick: Então, na verdade foi até uma coincidência. Eu entrei no Ministério Público, na verdade, que é uma instituição bem parecida com a defensoria e eu sempre gostei muito do Ministério Público, admirei muito. Até porque o meu pai trabalha já no Ministério Público, ele já tem uma carreira já de bastante tempo e eu admirava muito a carreira do Ministério Público da questão da defesa dos direitos sociais, das pessoas com deficiência, da infância e juventude, que é uma área que eu sempre gostei muito desde a época da faculdade de Direito. E daí eu fui prestar concurso, porque na época eu já gostava muito do Ministério Público, mas não podia trabalhar de nenhuma forma que não fosse por via concurso público, aí quando eu fui aprovada, as coisas foram se encaixando. Abriu uma vaga no lugar onde eu trabalho, que é o Centro de Apoio da Infância e Juventude e daí assim que abriu essa vaga, eu entrei e comecei a me apaixonar cada vez mais. A gente auxilia os promotores de justiça na defesa dos direitos e a inclusão escolar de pessoas com deficiência está muito presente no meu dia a dia, a gente trabalha muito com isso. Então essa paixão que eu já tinha desde a faculdade foi só crescendo e já se vão 9 anos em que eu atuo nessa área. Trabalho como analista nesse centro de apoio e agora a gente tá trabalhando em campanhas também. A gente promove campanhas, programas e agora especificamente numa campanha específica de inclusão de pessoas com autismo, que é uma campanha linda, vai ser muito bacana. A gente vai conscientizar as pessoas, ela tá contando com a colaboração de pessoas com autismo, inclusive tem o Rodrigo Tramonte, que é um ilustrador lá de Santa Catarina, tem outros autistas que estão nos auxiliando para que a gente faça um material que esteja totalmente em consonância com a realidade. Não é a gente escrevendo pelos autistas, mas os autistas sendo ouvidos, escrevendo também esses materiais de conscientização que a gente quer lançar no ano que vem. A gente ia lançar agora, mas por conta da pandemia a gente não pôde fazer as gravações e tal. Então, a gente teve que suspender, mas é muito gratificante trabalhar com isso, assim, é uma paixão muito grande que só cresce.
Luca: E você Isabella, como começou o arTEAmando e tudo isso? Eu sei que toda hora te perguntam sobre isso, mas pra quem não te conhece é sempre interessante saber.
Isabella: Imagina. Eu tenho um irmão que tá no espectro, ele tem 13 anos, quase 14 e ele é uma pessoa muito importante na minha vida, como qualquer irmão, mas eu sempre digo que eu na minha vida aprendi muito mais com meu irmão do que ele aprendeu comigo. Eu já tava muito envolvida com o autismo, a terapia do meu irmão, de ajudar ele com a escola e tudo e ano passado eu resolvi montar um projeto chamado arTEAmando. E a ideia surgiu, assim, quando eu descobri que existe uma conexão muito maravilhosa, especial, entre pessoas no espectro e a música. Tanto que você vê que muita gente no espectro assim que adora escutar música ou gosta de tocar instrumentos, cantar. Então, quando eu descobri isso, e também comecei a tocar música com meu irmão e ter esse contato, eu decidi montar um projeto exatamente com essa conexão. Fiz também porque eu sempre fui muito apaixonada pela música, eu inclusive lancei uma música ano passado também no nome Bella Oz, tá no Spotify e outras plataformas. Montei o projeto junto com a minha mãe que é uma pessoa muito maravilhosa e muito envolvida com a causa e várias pessoas da comunidade que a gente já conhecia. Então, ano passado a gente começou o projeto atuando na Santa Casa de Misericórdia aqui no Rio, no centro do Rio de Janeiro e a gente começou com oficinas de música e artes com crianças que já eram atendidas lá, todas do espectro, todas muito novas e foi uma experiência maravilhosa. A gente também conseguiu ter muito contato com os pais dessas crianças, sabe? Dando conselho, acolhendo elas e tudo e agora, infelizmente, por causa da pandemia a gente tá trabalhando muito online no Instagram, fazendo lives com profissionais. A gente também fez uma live muito bacana com o Luca mais cedo esse ano, que foi muito legal, e a gente tá sempre buscando por novas maneiras de promover a causa e eu estou muito feliz de poder participar desse podcast hoje porque eu já tenho ouvido ele desde o começo do ano e é um privilégio enorme.
Tiago: Ah, fico muito feliz. E uma coisa que ficou muito perceptível na fala de vocês é que a diferença de idade de vocês com os irmãos de vocês não é tão grande assim. Por exemplo, o meu irmão que não é autista tem 11 anos e eu tenho 24. Então, nós temos 13 anos de diferença. Então, a primeira que eu fico pensando assim, é quando é que vocês perceberam que o irmão de vocês era diferente de alguma forma, teve algum momento assim que vocês lembram que tinha alguma coisa diferente, assim, no desenvolvimento, na forma de agir, na interação, no dia a dia da família?
Isabella: Um dos primeiros sinais, assim, do autismo do meu irmão, foi o atraso na fala dele. E eu só tenho quatro anos de diferença com meu irmão, eu acho que a princípio eu nunca tava muita coisa. Porque era muito nova e pra mim meu irmão era meu irmão, sabe? Tipo, eu não percebia tanto. Eu acho que foi quando eu fiquei um pouquinho mais velha que eu comecei a perceber que meu irmão era diferente. E meu irmão, aliás, ele teve um diagnóstico assim meio tarde, tem gente que tem um diagnóstico bem mais tarde. Porque o meu irmão também teve diagnóstico de Asperger, mas ele foi diagnosticado com 7 anos, eu tinha 11 e eu acho que assim, quando a gente recebeu o diagnóstico foi quando eu tive essa realização maior de que: “Caramba, meu irmão é diferente”. Antes disso, eu acho que eu não entendia muito bem assim.
Nick: Tem uma diferença até parece até mais próxima agora que a gente tá mais velho, mas na verdade são mais ou menos uns 9 anos e meio que a gente tem de diferença e a gente tem uma irmã do meio. Então, o meu irmão sempre tive o instinto protetor dele, eu quem tava acompanhando minha mãe nas consultas ao pediatra e eu lembro muito bem da minha mãe ficar um pouco angustiada, porque como a gente, ela já tinha experiência de duas filhas mais velhas, ela sempre achava estranho assim. E a minha mãe é muito ansiosa, eu lembro de ela ir ao pediatra, e perguntar o que tava acontecendo. Aí o pediatra sempre respondia que não, que na verdade cada criança tem seu ritmo, que tinha que entender, só que aquela resposta nunca acabava satisfazendo ela.
Tiago: E é horrível. Esse discurso de toda criança tem o seu tempo é falacioso em certa medida. Porque ele transfere simplesmente pra família a responsabilidade pelo desenvolvimento da criança, como se não tivesse nada ocorrendo de verdade.
Nick: Exatamente, exatamente, por isso que angustiava minha mãe, porque a minha mãe queria uma resposta, minha mãe sabia que tinha alguma coisa que não tava ali, que tava tava saindo do comum. Porque ela já tinha essa experiência com as duas filhas. Então, assim, a gente foi atrás do diagnóstico, então, eu lembro muito bem da gente viajar pelo país pra tentar descobrir, assim, com os médicos, o que que ele poderia ter, qual era o diagnóstico, isso faz aproximadamente 20 anos. Era um pouco mais difícil de conseguir um pouco não, muito, né, porque a gente sabe que muitas questões ainda não eram tão claras pra própria medicina. Aqui no Brasil a gente sabe que a gente teve muitos avanços nesses últimos anos. E daí eu percebi que ficou mais claro ainda, mais nítido pra mim, depois do diagnóstico, que caiu minha ficha mesmo quando eu percebi a questão da inclusão escolar dele. Porque as professoras começaram a conversar com os meus pais. Como a gente começou a perceber que, por exemplo, as apresentações de escola, ele, que eu e a minha irmã a gente sempre adorou, a gente sempre participou de tudo, o meu irmão não queria, ele resistia, ele chorava, ele se incomodava, então assim, a gente sempre respeitou a vontade dele, nunca forçamos ele a nada, mas a gente percebeu que olha, ele é diferente de mim e da minha irmã. Então, acho que foi mais ou menos nesse momento da inclusão escolar dele e depois com os desafios, foi ficando mais cada vez mais claro, com as questões da exclusão, do preconceito, daí mesmo que as fichas foram caindo cada vez mais do autismo dele.
Luca: Então, eu vou partir um pouco pra minha experiência pessoal no qual eu sou o irmão autista. Eu tenho um irmão autista e tenho uma irmã não autista. Na minha casa sempre foi muito incomum porque o meu pai é autista também. Apesar de aos 50 anos não ter tido um diagnóstico formal, todos os sintomas são condizentes ao espectro autista e considerando que ele tem dois filhos autistas, não seria muito difícil imaginar que também se encaixaria no espectro. Então, minha mãe, por conviver com ele tanto tempo, nunca viu sintomas e características como anormais, digamos assim, porque até aí era basicamente as mesmas características que o marido dela apresentava, então era normal. E só quando eu tinha 16 anos fui ter um diagnóstico e meu irmão com 18, 19. O meu caso, estando no espectro autista leve, se comparado do meu irmão que também é leve, mas ele ainda tem questões de dificuldade social muito grandes comparadas comigo e acaba sendo sempre uma fonte de comparação entre a família que eu acho péssimo. Já não é legal uma comparação entre irmãos e comparar os dois irmãos autistas? Você é tão sociável, por que seu irmão não é? Por que seu irmão não é que nem você? Coisas assim são péssimas, horríveis de lidar. É sempre curioso ver a minha postura e a do meu irmão comparado com a minha irmã que não é autista, com todas as questões, desde reações a comida e a barulho, sabe? É muito curioso conviver assim (risos). Eu não sei descrever melhor do que isso, é curioso e depois de participar do Introvertendo eu fui percebendo quanto que diversas das minhas posturas e as dele não são exatamente posturas neurotípicas, mas na minha família são bastante naturalizadas.
Nick: Essa comparação é muito cruel entre irmãos. A gente sabe o quanto ela é danosa e eu imagino como deve ter sido difícil porque realmente as pessoas nem percebem. Porque elas fazem isso de uma forma tão natural, mas elas não percebem o quanto isso pode ser nocivo, quanto isso pode ser ruim pra esses irmãos. E às vezes só pros pais fazem isso, então, é muito complicado. Eu concordo plenamente, assim, eu acho bem difícil esse tipo de comparação, eu acho horrível também a escola fazer isso, assim, sabe? E um dos desafios da inclusão é justamente essa comparação que é feita, sabe? Meu irmão sofreu muito na escola por causa disso. Porque ele tem dificuldade, por exemplo, em matemática e a minha família tem dificuldade. Todo mundo correu pra área de humanas, porque realmente não é nosso forte. É bem complicado. E na escola ele sofria, ele tinha dificuldades. O próprio vestibular que ele fez, ele fez de somatória, ele não sabe somar. Então, a gente percebe como isso é ruim, assim, porque as pessoas ficam comparando, mas não, o importante é a pessoa. Ela seguir aquilo que ela tem facilidade, que nem o meu irmão é excelente em geografia e história e tá tudo bem se ele não é bom em matemática, não é uma coisa que é tão essencial ser um historiador sem ser bom em matemática, mas infelizmente a gente passa por isso.
Isabella: Eu conheço algumas pessoas que são irmãos de autistas que tem uma uma situação muito diferente da que eu tenho aqui em casa porque aqui desde o diagnóstico do meu irmão, os meus pais foram muito abertos comigo sobre as diferenças do meu irmão, sobre a situação do meu irmão e eu fui crescendo e aprendendo cada vez mais sobre autismo e eu meio que entrei no mundo do meu irmão. E eu aprendi que você ter um irmão autista não é só assim você ajudar ele, defender ele e tudo, mas também compreender a realidade dele, compreender como a mente dele funciona, os gostos dele, sabe? Uma das coisas que eu mais adoro é tipo falar sobre super-heróis com meu irmão, que é uma coisa que ele ama muito. E eu amo conversar sobre os interesses dele, videogame, super-heróis e personagens e eu acho que isso é muito importante, mas eu sei que em outras famílias os pais não são tão abertos sobre o diagnóstico do filho com outro irmão. Eu conheço gente que não entende que o irmão tá no espectro, o irmão é diferente e isso pode causar com que o relacionamento dele seja muito ruim.
Tiago: Com certeza, eu acho que a questão de você como pai ou mãe não aceitar o autismo do seu filho, também pode influenciar bastante nisso. Porque um pai e uma mãe que não entende ou que pelo menos não busca entender o autismo do filho como algo que faz parte daquela pessoa, provavelmente vai ter mais possibilidade de esconder dos outros familiares. Este episódio teria três convidados. Um deles seria o Vinícius, mas infelizmente ele não pôde estar aqui, mas eu queria fazer uma menção ao Vinícius primeiro, mandando um abraço pra ele, segundo porque esse tema das comparações me fez pensar também que há um problema de comparação dentro do próprio espectro do autismo, tanto a Isabella quanto a Nick aqui e o Luca também tem irmãos que são autistas ditos “leves” e muitas vezes as pessoas pensando que se é autista leve tem pouca dificuldade e não necessariamente é assim. Então eu quero trazer o exemplo do Renato, que é o irmão do Vinícius que está cursando doutorado em História, mas o Renato geralmente tem dificuldade, por exemplo, de quando ele sai ele esquece documentos, quem gerencia a vida dele ali no dia a dia é o Vinicius, que é o irmão dele, e-mails, etc. Eu tive o contato primeiro com o Vinicius antes de conhecer o Renato justamente por causa dessa disfunção executiva que o Renato tem, mas o Renato está no doutorado e as pessoas podem pensar assim: “Ah, ele é um estudante de doutorado, então provavelmente ele é um autista com menos dificuldades”. E não necessariamente é assim. E aí eu queria saber de vocês, vocês participam de alguma forma dessa gerência do dia a dia dos irmãos de vocês? Eles têm disfunção executiva, alguma coisa assim, parecido com o caso do Vinícius e Renato?
Nick: Meu irmão, agora a gente não convive diariamente, porque eu tô morando em São Paulo e ele mora em Florianópolis, mas a gente se vê assim com muita frequência. Praticamente duas vezes por mês eu vou para Florianópolis, a gente convive muito, fico na casa dos pais e é uma festa assim, é muito bom. Uma questão que eu percebo que o meu irmão tinha muito forte na época que a gente convivia e agora com tratamento já melhorou muito é a questão do TOC, que era uma coisa que nos incomodava bastante. Porque a gente não podia ficar num ambiente, a gente saia por dois minutos, quando via ele tinha guardado tudo, já tinha organizado tudo e eu não sabia onde estava e tal. E eu acho muito interessante trazer essa questão que até eu achei legal que a Isabella falou, da gente compreender ele. Compreender o mundo dele, entrar no mundo dele. Muitas vezes às vezes ele brigava com a gente, a gente até ficava gritando porque a gente tem que entender, meu pai sempre falava muito isso. Quando eu era adolescente às vezes me revoltava, ele: “Não, Nicolle, tem que entender que é o mundo dele, é uma coisa que ele não tem controle”. Mas a gente trabalhava muito isso, eu acredito que uma questão que a gente sempre tocou muito era justamente nessa questão do TOC, porque no começo eu me revoltava, depois eu tentava compreender, tentava ajudar ele também a melhorar, porque eu percebi que ele sofria com isso, sabe? Então, sempre dialogava com ele, pra tentar suavizar um pouco esse estresse, porque era muito desgastante. Então, acredito que essa questão do TOC me marcou muito, assim, na época que a gente convivia.
Isabella: Aqui em casa, hoje em dia, eu acho que eu não preciso ajudar o meu irmão tanto quanto antigamente. O meu irmão já tá com quase 14 anos e ele tá muito mais independente do que ele era antigamente, sabe? E eu ajudo ele principalmente assim durante a pandemia, muito assim, dando instruções para ele fazer as próprias coisas sozinho. Durante a pandemia ele começou se servir sozinho e é uma coisa assim que parece simples pra outras pessoas, mas pro meu irmão era uma coisa assim que ele não conseguia fazer sozinho, não tinha o hábito de fazer sozinho. Mas, hoje em dia, juro, meu irmão tá incrível. E ele consegue fazer quase tudo sozinho, inclusive, hoje, ele apesar assim de tá com um pouquinho de medo, ele foi pra escola pela primeira vez presencial. Você fica muito orgulhosa. E ele voltou assim pra casa super feliz, dá muito orgulho.
Nick: Só lembrando agora de uma situação que aconteceu hoje até, inclusive, uma coisa assim até meio boba, mas é engraçado, uma questão em que eu ajudei ele. Ele trocou de celular e desconectou o Facebook, o Instagram e tal, então hoje ele me pediu hoje à tarde ajuda. Nessas questões tecnológicas ele às vezes pede meu auxílio.
Luca: No meu caso, meu irmão só tem um pouco mais de ansiedade social do que eu, então, o que eu posso ajudar é abrir a porta pra ele ou atender o telefone porque tem pavor de ligações por celular, mas fora isso ele é bastante autônomo, até tirando os períodos de depressão mais intensa, mas fora eles é bastante autônomo. A gente agradece muito a participação de vocês, foi sensacional, é muito legal ouvir as histórias de quem está convivendo com autistas. Porque a gente tem a nossa perspectiva sempre aqui.
Isabella: Eu também gostaria de agradecer o Tiago e o Luca. Eu fico muito feliz de tá em contato com vocês, vocês são realmente incríveis e eu escutar o podcast de vocês é muito maravilhoso, porque eu consigo imaginar mais a vida do meu irmão quando ele for adulto, quando ele for mais velho e realmente eu fico muito feliz de ouvir os episódios de vocês, realmente agradeço muito pelo convite de participar desse episódio.
Luca: Ah, Isabella, eu só tenho a agradecer por esses elogios, porque bastante todos eles poderiam a você e seu trabalho também. Inclusive é o trabalho da Nick que eu fui descobrir agora, mas em detalhes e vou fazer questão de seguir.
Nick: Vou adorar, interajam ali, vou amar essa conexão, conheci vocês agora através da Isabella e quem podemos fazer muitas coisas juntos aí.